Bases sólidas e credíveis para uma política alternativa
Foram mais de centena e meia as propostas do PCP de alteração ao OE para 2014, abrangendo as mais diversas áreas, Trabalho, Segurança Social, Administração Pública, Habitação, Saúde, Educação, Cultura, bem como matéria fiscal.
Embora sem nenhuma espécie de ilusão quanto à possibilidade de este terceiro OE do Governo PSD/CDS-PP ser reformável ou susceptível de inflexão nas suas linhas mestras, a bancada do PCP não desistiu de tudo fazer para minorar os terríveis efeitos das medidas naquele contidas e que, inevitavelmente – se nada for feito –, se abaterão de modo implacável sobre a vida de milhões de portugueses, em particular dos trabalhadores e reformados.
Mas a batalha dos deputados comunistas não se esgotou neste plano. O conjunto coerente e articulado de propostas que apresentou no debate teve ainda o mérito de pôr em evidência o quanto é falsa a tese do Governo de que não há alternativa à política por este lavada a cabo. Há alternativa, sim senhor, há soluções credíveis para os problemas, há uma outra visão para o futuro do País. O que os deputados comunistas comprovaram, uma vez mais, com as suas propostas (e foi muito significativo que o PS tenha acompanhado a maioria PSD/CDS-PP na rejeição de muitas delas), é que um outro rumo é não só possível como absolutamente necessário para tirar Portugal do atoleiro em que a política de direita, extremada com a receita da troika, o mergulhou.
É essa mudança e sentido transformador que respira nas propostas e palavras dos deputados comunistas, como adiante se verá.
As propostas do PCP garantem uma mais justa distribuição da riqueza
Administração Pública
Cortes ilegítimos
Aos cortes nos salários da administração pública opôs-se com determinação a bancada comunista, propondo a sua anulação. E lembrou que o Governo que procede a este roubo a quem trabalha é o mesmo que dá benefícios de milhões para a banca e para os grupos económicos. Jorge Machado considerou por isso que além de inaceitável este corte é «inconstitucional, imoral e ilegítimo», realçando que ao corte directo nos salários soma-se o corte por via dos descontos para a ADSE, o corte do subsídio de refeição, o corte no trabalho extraordinário, o aumento do IRS, sem falar do roubo do subsídio de Natal (pago em duodécimos mas logo retirado por via do aumento dos impostos) e do congelamento dos salários que leva à sua redução por via da inflação. Tudo somado, o valor extorquido aos trabalhadores da administração pública corresponde já a uma perda entre 25 a 30 por cento dos seus salários.
Mais exploração
O aumento do horário de trabalho na administração pública é visto pelo PCP como mais uma peça destinada a agravar a exploração, impor o retrocesso, agravar as injustiças e despedir milhares de trabalhadores. É nisso que se traduz a imposição de mais cinco horas de trabalho gratuito, sem que com isso o Governo resolva qualquer problema da administração pública. O que faz apenas é «agravar a exploração, dificultar a conciliação da vida profissional com a vida pessoal e familiar», acusou Jorge Machado, expondo assim razões para a proposta da sua bancada de recuperar para as 35 horas a jornada semanal dos trabalhadores do Estado. Também, desta forma, adiantou, será possível obter um efeito positivo na distribuição da riqueza e ao nível da própria produtividade na administração pública.
Não aos despedimentos
O deputado comunista David Costa denunciou o facto de este OE promover milhares de despedimentos em serviços públicos, autarquias e empresas públicas, impedir a contratação e a renovação de vínculos, retirar direitos à força e liquidar a negociação sindical.
O caminho tem de ser outro, defendeu, passando necessariamente pela definição e concretização pelo Estado de uma política de crescimento e desenvolvimento económico. Na opinião do deputado comunista cabe ainda a este ser «motor na negociação colectiva com os sindicatos, garantir postos de trabalho com segurança e dignidade, e assegurar o bom funcionamento dos serviços públicos».
Daí a exigência do PCP de cumprimento da Constituição e de respeito pelos direitos dos trabalhadores que ela consagra.
Mau exemplo
Sobre a situação dos milhares de trabalhadores que na administração pública desempenhando funções permanentes têm vínculos contratuais precários – falsos recibos verdes, contratos a termo, entre outros –, falou David Costa, para classificar a situação de «inaceitável».
Com a agravante, realçou, de ser o próprio Estado a dar o pior exemplo. Razões, pois, para a proposta do PCP no sentido da reposição da legalidade através da conversão destes vínculos contratuais em obediência ao princípio de que a um posto de trabalho permanente para o cumprimento de necessidades permanentes corresponde um vínculo efectivo, contrariamente à prática dos governos PS, PSD e CDS-PP.
Subfinanciamento crónico
A revogação da lei dos compromissos é outra das propostas do PCP, justificada pela necessidade de defender as funções do Estado e a qualidade dos serviços prestados aos cidadãos.
Ao criar esta lei o que o Governo quis foi criar «entraves à execução da despesa orçamental e à assumpção de compromissos financeiros pelas entidades publicas, atacando desta forma as funções do Estado», denunciou Paulo Sá, que considerou residir no subfinanciamento crónico a verdadeira causa dos pagamentos em atraso e não a ineficiência das entidades pública, como diz o Governo.
Trabalho
Cumprir acordo
432 euros líquidos (485 brutos), é este o salário mínimo nacional, valor que o PCP não hesita em classificar como uma «vergonha» face à realidade dos restantes países europeus. Por isso a sua proposta de aumento o mais rápido possível para os 500 euros. E não colhe o argumento de que é preciso esperar por um qualquer acordo da concertação social, como insistem os partidos da maioria como pretexto para nada fazer. «Esse acordo já existe, tem é de ser cumprido», reiterou Jorge Machado.
Precarização
O ataque aos trabalhadores da Saúde está igualmente presente no OE por via da acentuação de uma linha de precarização em detrimento da contratação com vínculo estável, da redução do pagamento das horas extraordinárias e suplementares, do avolumar das carências de pessoal.
A todos estes problemas a bancada comunista deu resposta propondo, entre outras medidas detalhadas por Carla Cruz, a abertura de concursos públicos sempre que haja carências de profissionais em todas as carreiras da saúde, um mecanismo com incentivos para a fixação de médicos sobretudo nas regiões menos atractivas, a eliminação da redução do valor pago às horas extraordinárias e suplementares.
Poder local
Violar autonomia
No que é uma violação da autonomia do poder local democrático, o Governo volta a propor a redução de trabalhadores, depois de 5749 trabalhadores terem já saído entre Dezembro de 2011 e Junho de 2013. Para a deputada Paula Santos esta proposta do Executivo visa três objectivos: atacar o emprego público, limitar a capacidade de intervenção das autarquias e o serviço público que prestam, pressionar as autarquias para que entreguem serviços aos privados.
No respeito pela autonomia das autarquias na definição do seu quadro de pessoal e da sua estrutura organizacional, o que o PCP propôs foi a eliminação das normas que restringem a contratação de trabalhadores e que conduzem ao despedimento.
Reforçar meios
Alvo de crítica no OE é também a redução da participação das autarquias nos impostos do Estado, com o Governo a consignar mais uma vez receitas que são das autarquias, nomeadamente o IMI ou as receitas que são obtidas pela prestação de serviços públicos de abastecimento de água, saneamento e resíduos.
Para Paula Santos tais medidas violam grosseiramente os princípios constitucionais de autonomia financeira e de justa repartição dos recursos públicos entre o Estado e o poder local, além de quebrar a promessa feita pelo Governo de que as freguesias iriam receber mais meios.
As propostas do PCP em matéria de poder local visaram assim garantir o respeito pelos princípios constitucionais e o reforço dos meios das autarquias.
Segurança Social
Cortes desumanos
Corte atrás de corte os reformados não escapam às medidas do Governo, lembrou no debate Jorge Machado, que não escondeu a sua indignação por homens e mulheres com uma vida inteira de trabalho e de descontos serem sujeitos a uma medida que apelidou de «imoral, inaceitável e inconstitucional». E que em sua opinião significa o romper de um compromisso que o Estado assumiu com milhares de pessoas.
Por isso a proposta do PCP de eliminação imediata de todas as normas de cortes nas reformas dos trabalhadores.
Pensões de miséria
O congelamento nominal do valor das pensões significa, para Jorge Machado, atirar para a pobreza milhares de reformados. Vangloriaram-se, Governo e maioria parlamentar, de ter havido actualização das pensões. O que não dizem é que essa actualização abrange apenas algumas das pensões mínimas e os valores actualizados são de muito pouca monta – 20 a 30 cêntimos por dia –, o que não chega para fazer face ao aumento do custo de vida.
O deputado comunista afirmou não haver qualquer dúvida de que hoje os reformados vivem muito pior à custa das medidas do Governo PSD/CDS-PP, com o aumento do custo de vida a superar em muito o que foram esses aumentos de miséria.
Consciente de que é preciso uma verdadeira valorização das reformas o PCP propôs um aumento de 4,7% de todas as pensões, defendendo que em nenhum caso o aumento fosse inferior a 25 euros.
Ataque aos pobres
Criação do PS, adoptada com zelo pelo PSD e o CDS-PP, a chamada «condição de recursos» é para o PCP «um instrumento brutal» destinado a impedir o acesso de milhares de pessoas a importantes prestações sociais.
Como afirmou Jorge Machado, sob a capa de alegadas «fraudes» e de «recursos» que muitas vezes não existem o que aqueles partidos fazem é cortar o rendimento solidário para idosos, cortar no subsídio social de desemprego, no rendimento social de inserção, no abono de família, entre outras prestações sociais. As consequências, essas, são dramáticas e bem conhecidas: no abono de família, por exemplo, significa negá-lo a mais de 800 mil crianças, enquanto um milhão e 200 crianças viram o seu abono reduzido à custa da condição de recursos.
Uma situação inaceitável para a qual o PCP só vê uma solução: a revogação da «condição de recursos» – e foi isso que propôs.
Apoio aos desempregados
Foi fraca a argumentação aduzida pelo Governo e pelos partidos que o suportam na defesa das suas propostas no OE. Em particular no que toca às propostas de violência social contra os pensionistas e reformados. Facto que não escapou a Rita Rato que assinalou como longe vai o tempo em que os partidos da maioria diziam ser defensores dos idosos. «Agora não há propaganda que esconda que a sua política e efeitos são de agudização da pobreza e da exclusão social entre os idosos», referiu, sublinhando que mais de um milhão e 400 mil idosos, pensionistas da Segurança Social sobrevivem com uma pensão abaixo do limiar da pobreza. O que para a deputada comunista significa que este Governo não está nada preocupado em resolver o problema da pobreza, está apostado sim em agravá-la e à exclusão.
«Um governo que chama ao desemprego oportunidade, requalificação ao despedimento, que já despediu mais de 22 mil professores contratados, não é um governo que quer resolver o desemprego, é um governo que aposta no desemprego, no seu agravamento», acusou Rita Rato, justificando assim a proposta da sua bancada visando alargar as condições de acesso ao subsídio de desemprego, face a essa terrível realidade que é a de apenas um terço dos trabalhadores desempregados ter acesso a essa prestação social.
Educação
Pela Escola Pública
Contestando a proposta do Governo sobre o «cheque ensino», cuja eliminação propôs, Rita Rato lembrou que ao Estado incumbe em primeiro lugar a construção de uma rede pública de estabelecimentos de ensino conforme as necessidades da população. E foi essa a posição assumida pelo PCP neste OE, defendendo a concretização e valorização da escola pública e não o seu desmantelamento como faz o Governo através do financiamento ao ensino particular e cooperativo, quando a escola pública tem condições para dar essa resposta.
Assegurar qualidade
Garantir a contratação do número necessário de trabalhadores da educação que assegure a qualidade em todos os graus do ensino, tal é, em síntese, o sentido das propostas do PCP no domínio da Educação. Todas elas, como salientou a deputada comunista Paula Baptista, visam combater o contínuo recurso do Governo à contratação precária dos profissionais de educação para satisfazer necessidades permanentes, o que tem vindo a degradar instituições e a colocar em causa a qualidade de ensino.
Estudar é para quem pode
Há muitos anos que estudar no Ensino Superior deixou de ser para quem quer mas para quem pode. Quem pode, como referiu Rita Rato, «pagar 1066 euros de propinas, mais despesas de transporte, de alimentação, alojamento, materiais escolares».
Foi para esta lamentável realidade que a deputada do PCP voltou a chamar a atenção da câmara, pondo em relevo as dificuldades crescentes das famílias e a insuficiência da acção social. Lembrou, nomeadamente, a redução entre 2010 e o ano passado de 73 mil para 50 mil do número de estudantes bolseiros, com uma bolsa cujo valor médio era de 2,9 euros diários, o que, observou, «não dá sequer para almoçar e jantar na cantina».
As opções do Governo levaram ainda Rita Rato a fazer comparações e a concluir que os «1000 milhões de euros gastos para cancelar um contrato SWAP davam para pagar três anos de propinas a todos os estudantes do Superior público».
É do direito à educação que falamos, pois, quando falamos das propostas do PCP que pugnavam pelo fim das propinas, pelo reforço das verbas para as instituições do Superior e dos mecanismos de acção social directa e indirecta e pela reposição do passe 4_18 e sub23.
Cultura
Aprofundar democracia
O serviço público de arte e cultura é para o PCP um serviço de igual importância e tão fundamental como os restantes serviços públicos para o funcionamento da democracia.
Só com investimento sustentado na cultura é possível, na sua perspectiva, desenvolver uma política de cultura capaz de responder às necessidades de aprofundamento da democracia.
Foram estas no essencial as razões invocadas por Miguel Tiago para a sua bancada voltar de novo a propor a afectação gradual de um por cento do PIB ao orçamento para a Cultura, no sentido de assegurar um financiamento mínimo que desenvolva o serviço público neste capítulo.
Proposta que vai ao arrepio do que tem sido feito por este Governo e que mais não é do que a «privatização da Cultura por via da aplicação de uma censura orçamental e financeira».
Privatizações
Não à depredação
Bruno Dias considerou um «verdadeiros insulto» que a resposta do Governo à luta por melhores serviços públicos e ao protesto contra o encerramento de estações de correio seja um anúncio nas rádios e TV a dizer aos portugueses: «comprem acções dos CTT».
Falando a propósito da privatização de empresas e sectores estratégicos, como transportes e comunicações, banca, produção e distribuição de energia, água e saneamento de resíduos, o deputado comunista considerou que tal política significa «fazer depender o desenvolvimento do País e a definição de qualquer estratégia nacional da agenda do lucro máximo dos interesses dos oligopólios». E significa ainda, acrescentou, «abdicar de um volume importante de receitas que assim deixam de financiar as funções sociais do Estado e de ser estímulo à economia».
Por isso a proposta do PCP para que fosse eliminado o artigo que autoriza o Governo a preparar operações de privatização e também a anulação do processo de privatização dos CTT.
Habitação
Lei dos despejos
Assumindo desde a primeira hora a sua oposição frontal à lei do arrendamento urbano (que teve em vista o aumento brutal do valor das rendas e o despejo de milhares de famílias), o PCP propôs que esta fosse revogada por entender que é «injusta, aprofunda as desigualdade e conduz à exclusão social».
Aumento das rendas que é «mais um elemento que contribui para o empobrecimento das famílias», segundo Paula Santos, que registou ainda o forte impacte que a lei teve nos comerciantes e até nas residências de estudantes.
Revogar o diploma é assim, para o PCP, dar um contributo para garantir o direito à habitação.
Matéria fiscal
Saque ao trabalho
O saque fiscal em IRS contra os rendimentos dos trabalhadores e famílias é de 3000 milhões de euros. Em 2014 o assalto será reeditado, através da manutenção dos novos escalões de IRS, das limitações às despesas com saúde e educação, da manutenção da sobretaxa extraordinária de 3,5%, denunciou Paulo Sá. Deste modo o Governo ataca novamente de forma agravada os rendimentos de quem vive do seu trabalho.
Para o PCP há alternativa e disso é prova as suas propostas em matéria fiscal. Resumindo-as, Paulo Sá sublinhou que «rompem com o escandaloso favorecimento da banca e dos grupos económicos, aumentando a carga tributária sobre o grande capital, condicionando o pagamento de juros da dívida às reais possibilidades do País, eliminando inaceitáveis rendas garantidas pelo Estado à banca e aos grupos económicos e estabelecendo uma mais justa tributação dos rendimentos mais elevados». E em paralelo, «desagravam a carga fiscal tributária sobre os trabalhadores, os reformados e pensionistas, as famílias e as micro e pequenas empresas».
IVA da restauração
Pela baixa do IVA da restauração bateu-se ainda a bancada do PCP no debate do OE. João Ramos acusou o Governo e a maioria de teimarem em não resolver o problema e manterem o valor em 23% «contra a evidência, contra os indicadores, contra as recomendações, inclusive do grupo interministerial».
A redução da receita do IRS, do IRC, da TSU e o aumento da despesa com o subsídio de desemprego não são compensados com o aumento da taxa de IVA, frisou o deputado comunista, para quem a «manutenção da taxa naquele valor destrói empresas, promove o desemprego e resulta num saldo fiscal negativo».
Fuga ao fisco
A merecer a crítica de Miguel Tiago esteve também em matéria fiscal o que considera ser um caso de «benefícios injustificados» aos grupos económicos e uma «verdadeira fuga ao fisco», com autorização do Governo.
Benesses que a bancada comunista contesta e que a levaram a propor o aumento das taxas sobre os fundos de capital de risco, o aumento para 28% da taxa sobre os rendimentos de fundos de investimento mobiliário e imobiliário, o aumento das taxas sobre as mais-valias de não residentes, o fim do off-shore da Madeira e a eliminação da proposta de isenção de 50% do IMI para os fundos imobiliários.
Defender agricultores
Eliminação do regime de fiscalidade aplicado aos pequenos agricultores, reforço financeiro para a sanidade animal, reforço de transferências para que o IVDP pague as dívidas à Casa do Douro, reforço de verbas para garantir o funcionamento dos laboratórios do Estado e reforço de verbas para apoio ao gasóleo agrícola – eis as propostas do PCP no domínio da agricultura.
O seu sentido, como explicou o deputado João Ramos, é o de minorar as dificuldades dos pequenos e médios agricultores, que já são muitas, e às quais este Orçamento não só não dá resposta como agrava.
Exemplo disso é a retirada por este Governo de 300 milhões de euros ao PRODER, programa que neste momento está esgotado, encontrando-se 25 milhões de euros validados e por pagar e 113 milhões de euros a aguardar validação.