Ataque à liberdade de expressão
Perseguir e punir quem contesta o Governo e as suas políticas, tal é, em síntese, o principal objectivo da proposta de lei que define o regime aplicável ao grafite.
Em apreciação na comissão de Direitos, Liberdades e Garantias, depois de aprovado na generalidade no dia 5 deste mês com os votos favoráveis da maioria PSD/CDS-PP, a abstenção do PS e os votos contra do PCP, PEV e BE, este diploma tem merecido o mais vivo repúdio da bancada comunista por nele estar subjacente o claro intuito de «introduzir agravadas limitações à liberdade de expressão e propaganda».
Disse-o no debate em plenário o deputado comunista João Oliveira, muito crítico quanto a uma iniciativa legislativa que em sua opinião veicula uma «mensagem de intolerância, censura, autoritarismo e repressão».
O que, bem vistas as coisas, encaixa no pensamento e acção dos seus autores, um Governo, acusou que tem como seu «único programa a subversão da Constituição, o ataque à democracia, retrocesso social e cultural para um povo inteiro».
«Esta proposta persegue o grafite mas visa sobretudo perseguir a contestação política e social que o Governo vai enfrentando nas ruas», observou, na ocasião, João Oliveira,
É que ao misturar grafites com autocolantes, placards, posters e cartazes o Governo o que pretende é «criar um quadro de perseguição a todas as formas de exercício da liberdade de propaganda». E não se atrevendo para já a criminalizar a contestação política, «fica-se – e não é pouco – pela perseguição policial e pela aplicação das coimas», denunciou o deputado do PCP.
Por outro lado, do seu ponto de vista, a proposta do Governo cria propositadamente «um quadro incerto quanto ao seu âmbito de aplicação», introduzindo até um «conceito jurídico tão sólido e claro como é o da conspurcação», ironizou.
Mas sobretudo o que permite é que presidentes de Câmara que já hoje se comportam como autênticos tiranetes, limitando e impedindo a liberdade de propaganda, «reforcem o seu comportamento antidemocrático, ainda por cima com o incentivo de ficarem com uma parte das coimas aplicadas», advertiu o parlamentar comunista.
Concepções perigosas
O texto legislativo sobre grafites é igualmente revelador das «concepções mesquinhas e atrasadas» do Governo quanto à expressão livre da arte e da cultura. João Oliveira foi mais longe e acusou o Executivo de «aceitar e autorizar apenas o que não conteste os seus propósitos políticos e ideológicos».
E afirmou que aquele não é capaz de compreender o grafite como «forma de expressão artística integrada num movimento mais vasto e bem distinto de fenómenos de poluição visual – que obviamente não merecem o apoio do PCP».
Para o parlamentar comunista é ainda uma evidência que o Governo «opta por perseguir a expressão artística em vez de criar condições para o seu livre exercício». Nessa medida, concluiu, aquele é «incapaz de compreender e conviver com expressões artísticas e culturais que não se enquadrem na sua política de gosto ou assumam a crítica social como elemento matricial».
O que para o Governo é «vandalismo», noutros países, como a Irlanda, é «objecto de valorização e classificação patrimonial», registou.