A campanha pela libertação de Álvaro Cunhal

A prisão e a liberdade nas páginas do Avante!

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A referência regular nas páginas do Avante! a Álvaro Cunhal, durante praticamente toda a década de 50, inicia-se ainda em 1949, na sequência da sua prisão no Luso. Em Abril desse ano, no topo da primeira página, o jornal do PCP apela: «Unidos e firmes na luta contra o terror policial – Salvemos Alv. Cunhal e Militão Ribeiro.» Tratava-se da primeira de um sem-número de notícias que o Avante! publicará relativas à prisão de Álvaro Cunhal, às violências e ilegalidades contra si cometidas e à exigência da sua libertação, que extravasou as fronteiras do Portugal aprisionado.

Nessa notícia garante-se que as vidas dos dois dirigentes «estão em perigo, por se negarem a prestar a mínima declaração à polícia». O artigo começa com a certeza de que esta prisão, muito embora constituindo um «duro golpe», «não fará de modo algum calar a voz da maior e melhor organizada força anti-fascista de Portugal, não fará calar a voz do Partido Comunista Português».

No mês seguinte, igualmente na primeira página, repete-se o apelo para salvar a vida de Cunhal e Militão: o segundo estava nesse momento a ser «barbaramente espancado», não lhe sendo permitidas visitas ou assistência, ao passo que Álvaro Cunhal, «gravemente doente», se encontrava «rigorosamente incomunicável na enfermaria da penitenciária». A situação mantém-se em Junho, com Cunhal incomunicável há dois meses, «numa cela sem ar e sem luz», sofrendo de uma doença no coração.

Em Setembro, o Avante! denuncia o tratamento desumano infligido aos presos, o que levara já Militão a «perder a razão». Álvaro Cunhal não só sofria torturas semelhantes como era obrigado, «noite e dia», a ouvir o seu camarada gritar «palavras sem nexo». Em Janeiro de 1950, o crime consuma-se: «Mataram Militão Ribeiro», titula o Avante!. Nesse mesmo artigo apela-se: «Lutai pela vida de Álvaro Cunhal, que se encontra doente na Penitenciária de Lisboa.»

A denúncia da prisão e do isolamento a que o dirigente comunista estava sujeito prossegue pelos meses e anos fora, ao mesmo tempo que se inicia uma campanha pela sua libertação, que terá expressão no País e um pouco por todo o mundo.

 

Amnistia!

Em meados de 1951 – depois da publicação de importantes excertos da sua defesa no tribunal plenário (ver texto nestas páginas) – o Avante! dá honras de primeira página a uma mensagem dos «camaradas da Organização Comunista Prisional do Tarrafal» ao «dirigente querido do nosso Partido», Álvaro Cunhal. Os militantes presos destacam-lhe a «constância revolucionária», o «trabalho dirigente inquebrantável realizado nas condições da mais feroz clandestinidade», a «conduta firme e heróica perante os esbirros do fascismo». Nessa mesma edição, nas páginas interiores, valoriza-se a «extensão que está a tomar a luta pela amnistia».

Em Janeiro de 1952, introduz-se no Avante! um elemento gráfico que se manterá quase sem interrupções até meados da década: a exigência, nas páginas centrais e em grandes letras negras, da libertação de Álvaro Cunhal. Em Março desse ano, o PCP apela, através das páginas do seu jornal, para a criação de comissões pela libertação do seu dirigente, e em Outubro, num artigo em que lembra estar para breve o seu 39.º aniversário, realça-se: «Pela sua luta, o nosso povo conseguiu, até hoje, salvar-lhe a vida. Fortalecendo e alargando a sua unidade de acção e intensificando a luta pela amnistia, tendo por bandeira a luta pela libertação de Álvaro Cunhal. Álvaro Cunhal, como todos os democratas e patriotas presos nas masmorras salazaristas, será libertado».

Em Dezembro, valoriza-se as «centenas de cartas enviadas para a Penitenciária de Lisboa» em solidariedade com Álvaro Cunhal, enquanto que em Janeiro de 1953 são destacadas as «novas provas de confiança, de amor, carinho e desejo de libertação imediata» demonstradas pelos trabalhadores e o povo: mais cartas remetidas para a prisão e também para o ministro do Interior e para o Presidente da República e o aparecimento em diversos pontos do País de inscrições nas paredes exigindo a sua libertação. É por esta altura que se intensifica a exigência do fim do isolamento a que Álvaro Cunhal estava sujeito há vários anos.

Em meados de 1954, a expressão internacional da campanha pela libertação de Álvaro Cunhal começa a ter tradução no Avante!, que noticia a publicação de um artigo do escritor brasileiro Jorge Amado no jornal inglês World News. Nos meses seguintes, há notícias semelhantes relativos a outros jornais estrangeiros.

De volta à liberdade

No primeiro Avante! de 1956, a campanha pela libertação de Álvaro Cunhal entra numa nova fase: a exigência da sua libertação quando terminasse a pena a que fora condenado, o que sucedia precisamente em Janeiro desse ano. A partir de então iniciavam-se as sinistras «medidas de segurança», ou seja, o prolongamento indefinido do encarceramento.

Em Fevereiro-Março, noticia-se o surgimento de inscrições e manifestos em diversas localidades e destaca-se a necessidade de «passar à luta organizada», devendo ser constituídas comissões legais para exigir a concessão de amnistia ao dirigente do Partido. Nos meses e anos seguintes, a presença da campanha pela libertação de Álvaro Cunhal diminui nas páginas do Avante! – e nas ruas do País. Era a consequência do desvio de direita (ver texto sobre «o culto da personalidade»). Apesar disso, o assunto está na primeira página em Abril de 1959: «Álvaro Cunhal está preso há 10 anos – lutemos pela sua libertação.»

No primeiro número da nova década, Cunhal está de volta à primeira página do Avante!, mas o tom agora é de triunfo. O mais destacado dirigente do PCP evadira-se de Peniche e estava agora em liberdade, retomando o seu lugar na luta contra o fascismo. 



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Álvaro Cunhal passou toda a década de 50 na prisão, grande parte dela no mais rigoroso isolamento – primeiro na Penitenciária de Lisboa e depois na Fortaleza de Peniche, de onde se evadiria no início de Janeiro de 1960, juntamente com outros nove destacados dirigentes militantes do Partido.
Foram anos difíceis, tanto para Álvaro Cunhal como para o próprio Partido, que enfrentava uma crescente e implacável repressão. 

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