À D. João VI

Henrique Custódio

Uma imensa ca­tás­trofe abateu-se sobre o País com os in­cên­dios. As chamas galgam serras e cu­me­adas no Al­garve e Ma­deira, cau­sando es­tragos ater­ra­dores em casas, carros, al­faias, ani­mais, ár­vores e plantas,lan­çando na mi­séria li­teral (ao ponto de não haver cama ou tecto) mul­ti­dões de fa­mí­lias e pes­soas.

Estes in­cên­dios dan­tescos duram há quase uma se­mana e, até agora, nem uma pa­lavra se ouviu do pri­meiro-mi­nistro de Por­tugal, Passos Co­elho, en­quanto o mi­nistro Mi­guel Ma­cedo foi o único a ir pas­sear à Ma­deira, dando o as­sunto por ar­ru­mado.

Nestes lan­ci­nantes dias e noites de tra­gédia, quem se tem visto e ou­vido são di­ri­gentes dos bom­beiros ou das câ­maras mu­ni­ci­pais, todos es­for­çados e cru­zando queixas e de­nún­cias que con­fluem num ponto ne­vrál­gico: a falta gri­tante de apoio e di­recção go­ver­na­men­tais na área da pro­tecção civil.

Quanto ao Go­verno, já quase se ma­ni­festa apenas à sor­relfa e sempre a des­ferir golpes na vida das por­tu­gueses. Após ins­talar as «bases» da ofen­siva (im­postos in­dis­cri­mi­nados sobre os tra­ba­lha­dores e pen­si­o­nistas, cortes bru­tais na Saúde, na Edu­cação e na Se­gu­rança So­cial), as de­pre­da­ções sobre o povo vão jor­rando di­a­ri­a­mente, si­len­ci­osas e de­vas­ta­doras: faltam am­bu­lân­cias para trans­porte de do­entes, são cor­tados RSI de 25 euros por os be­ni­fi­ciá­rios «terem casa» (en­quanto os re­for­mados do Banco de Por­tugal mantêm os mi­li­o­ná­rios sub­sí­dios cor­tados à Função Pú­blica), 30 mil pro­fes­sores vêem de re­pente o de­sem­prego no ho­ri­zonte com as «re­formas» do mi­nistro Crato, jo­vens en­fer­meiros, mais uma mi­ríade de ou­tros li­cen­ci­ados, emi­gram por falta de em­prego, o de­sem­prego jovem ca­minha para os 40% e todos os dias mais portas se fe­cham, o má­ximo de IVA apli­cado à res­tau­ração já fez 30 mil de­sem­pre­gados e con­tinua a en­cerrar es­ta­be­le­ci­mentos todos os dias, as fa­mí­lias acorrem, aos mi­lhares, para a es­mola da co­mida ou dos pa­ga­mentos da água e luz, en­quanto ou­tras tantas vão di­a­ri­a­mente en­tre­gando as casas aos bancos por falta de pa­ga­mento e etc. etc.

A pre­sença do Go­verno de Passos Co­elho quase apenas se vê e sente no se­mear da tra­gédia so­cial que de­vasta o País, en­quanto nos de­sas­tres na­tu­rais, a sua fuga é total.

O País já pa­rece re­gressar a 1807 e o Go­verno a com­portar-se como a corte de D. João VI, a fugir mi­se­ra­vel­mente para o Brasil com medo da in­vasão na­po­leó­nica, dei­xando no cais, por falta de es­paço nas naus, te­souros como todos os li­vros da bi­bli­o­teca na­ci­onal da al­tura e, no País, um povo in­teiro ata­ran­tado e à de­riva, sob o do­mínio brutal do «amigo» in­glês Be­res­ford, por mais de uma dé­cada.

Só que, na ac­tu­a­li­dade, Passos Co­elho apenas fugiu para os brasis da sua qui­mera ne­o­li­beral e os te­souros na­ci­o­nais não são aban­do­nados no cais, mas en­tre­gues ao des­ba­rato aos grandes es­pe­cu­la­dores, através de gi­gan­tescas e opacas ne­go­ci­atas dos ac­tuais man­dantes.

Mas é útil que todos se lem­brem do que re­sultou de tão mi­se­rável, quão trá­gica ac­tu­ação do poder na al­tura de D. João VI.

Foi a Re­vo­lução Li­beral, que li­ber­taria o País do ab­so­lu­tismo mo­nár­quico.  



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