À D. João VI
Uma imensa catástrofe abateu-se sobre o País com os incêndios. As chamas galgam serras e cumeadas no Algarve e Madeira, causando estragos aterradores em casas, carros, alfaias, animais, árvores e plantas,lançando na miséria literal (ao ponto de não haver cama ou tecto) multidões de famílias e pessoas.
Estes incêndios dantescos duram há quase uma semana e, até agora, nem uma palavra se ouviu do primeiro-ministro de Portugal, Passos Coelho, enquanto o ministro Miguel Macedo foi o único a ir passear à Madeira, dando o assunto por arrumado.
Nestes lancinantes dias e noites de tragédia, quem se tem visto e ouvido são dirigentes dos bombeiros ou das câmaras municipais, todos esforçados e cruzando queixas e denúncias que confluem num ponto nevrálgico: a falta gritante de apoio e direcção governamentais na área da protecção civil.
Quanto ao Governo, já quase se manifesta apenas à sorrelfa e sempre a desferir golpes na vida das portugueses. Após instalar as «bases» da ofensiva (impostos indiscriminados sobre os trabalhadores e pensionistas, cortes brutais na Saúde, na Educação e na Segurança Social), as depredações sobre o povo vão jorrando diariamente, silenciosas e devastadoras: faltam ambulâncias para transporte de doentes, são cortados RSI de 25 euros por os benificiários «terem casa» (enquanto os reformados do Banco de Portugal mantêm os milionários subsídios cortados à Função Pública), 30 mil professores vêem de repente o desemprego no horizonte com as «reformas» do ministro Crato, jovens enfermeiros, mais uma miríade de outros licenciados, emigram por falta de emprego, o desemprego jovem caminha para os 40% e todos os dias mais portas se fecham, o máximo de IVA aplicado à restauração já fez 30 mil desempregados e continua a encerrar estabelecimentos todos os dias, as famílias acorrem, aos milhares, para a esmola da comida ou dos pagamentos da água e luz, enquanto outras tantas vão diariamente entregando as casas aos bancos por falta de pagamento e etc. etc.
A presença do Governo de Passos Coelho quase apenas se vê e sente no semear da tragédia social que devasta o País, enquanto nos desastres naturais, a sua fuga é total.
O País já parece regressar a 1807 e o Governo a comportar-se como a corte de D. João VI, a fugir miseravelmente para o Brasil com medo da invasão napoleónica, deixando no cais, por falta de espaço nas naus, tesouros como todos os livros da biblioteca nacional da altura e, no País, um povo inteiro atarantado e à deriva, sob o domínio brutal do «amigo» inglês Beresford, por mais de uma década.
Só que, na actualidade, Passos Coelho apenas fugiu para os brasis da sua quimera neoliberal e os tesouros nacionais não são abandonados no cais, mas entregues ao desbarato aos grandes especuladores, através de gigantescas e opacas negociatas dos actuais mandantes.
Mas é útil que todos se lembrem do que resultou de tão miserável, quão trágica actuação do poder na altura de D. João VI.
Foi a Revolução Liberal, que libertaria o País do absolutismo monárquico.