Combater a destruição de 29 freguesias em Lisboa

Modesto Navarro

Sobre a Divisão Administrativa da Cidade, recordamos, em primeiro lugar, o estudo encomendado a Augusto Mateus e João Seixas, que custou muito dinheiro ao Município de Lisboa. Apesar de tudo, ele dava prioridade à área metropolitana, na sua organização administrativa, apontando para a necessidade de criação de órgãos representativos e seus reflexos em Lisboa.
Era mera falácia e cortina de fumo, como se viu, para ocultar outros desígnios.

A proposta de PDM desta maioria é clara quanto ao objectivo de pôr a cidade ao serviço das grandes imobiliárias e dos privados

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O processo seguido por António Costa, pelo PS e pelo PSD, depois de conseguirem a capa do estudo, no meio da propaganda, foi lançarem uma proposta de 28 freguesias que, mais tarde, ficou reduzida a 24. Esta visa a divisão política e eleitoral entre esses partidos, freguesia a freguesia, rua a rua, procurando atingir-nos fortemente do ponto de vista político e eleitoral, o que é um objectivo principal do PS e PSD coligados.

Foram promovidas sessões arregimentadas, em algumas freguesias, de propaganda à concentração de grupos de freguesias numa só. Lançaram um documento com uma edição de 300 000 exemplares, às custas do Município e dos contribuintes, em que propagandeavam as excelências da proposta, sem qualquer menção à responsabilidade da Assembleia da República como órgão decisivo no processo.

Parecia que tudo estava feito e era inexorável.

Fizemos o nosso trabalho possível, de esclarecimento das populações e de intervenção na Câmara, na Assembleia Municipal e nas freguesias. Denunciámos os objectivos do PS e do PSD de reduzir drasticamente a proximidade aos cidadãos, de colocar as juntas de freguesia também ao serviço do projecto de reorganização dos serviços do Município.

O que pretendem com esta reorganização da CML é criar cinco unidades territoriais, desconcentrando serviços e trabalhadores, desarticulando sectores da Câmara que são há muito tempo objecto de cobiça por parte de especuladores e empresas. São casos diferentes, mas falemos da venda do saneamento à EPAL, da limpeza e higiene urbana, de acabar com o departamento de manutenção de viaturas e máquinas, de atingir áreas de organização do trabalho autárquico onde o Sindicato dos Trabalhadores do Município e os trabalhadores da Câmara Municipal resistem e combatem.

O que está nos objectivos do PS e do PSD, e também do CDS, nas privatizações, é criar condições para que, através da revisão da lei eleitoral, possam colocar áreas da cidade, por exemplo nas perspectivas do urbanismo e do licenciamento, fora do processo democrático actual, de as questões essenciais irem à discussão e decisão na Câmara e na Assembleia Municipal.

O objectivo de criar executivos monocolores levaria a que um vereador responsável directo por uma unidade territorial apenas tivesse que relatar e acertar-se com o presidente da Câmara, se fosse caso disso, até pelo telefone; o presidencialismo na Câmara seria poder absoluto e a Assembleia Municipal ficaria longe de tudo o que fosse decisivo.

Neste processo de divisão administrativa e de negocismo político e eleitoral do PS e do PSD, há presidentes e eleitos nas freguesias, dessas forças políticas, que estão descontentes. Mas há aqueles que vêem já o negócio das influências dos poderes maiores com que lhes acenam os directórios políticos.

Na realidade, o objectivo é criar essas ilusões em homens e mulheres ansiosos de se afirmarem, de se deixarem envolver em mandatos e trabalhos propícios aos jogos e tráficos locais de influência.

No entanto, convirá reter o que disse o secretário de Estado da Administração Local recentemente. Perguntaram-lhe os jornalistas o que é que ele pensava quanto às actuais juntas, que têm hoje mais trabalhadores, que assumem responsabilidades maiores perante as populações. E ele respondeu: «Pois é, quiseram ser mini-câmaras, mas agora têm de voltar a ser o que eram».

Ou seja, o objectivo é retirar ao poder local democrático, para já a nível de freguesias, essa proximidade, essa importância e esse trabalho necessário ao desenvolvimento e ao bem-estar das populações locais. Que ninguém tenha ilusões.

 

Negócios e ódio à democracia

 

O ódio de classe à democracia está aí evidenciado por António Costa, pelo PS e pelo PSD, engodando gente das freguesias para um engano que seria evidente, a curto e médio prazos, quando se vissem, nas juntas de freguesia maiores e com mais problemas, a servirem de mero apoio político a outros objectivos, de privatização de áreas e serviços hoje municipais, de cobertura a intervenções urbanísticas lesivas para cada meio e para a cidade e de criação de condições para mais despedimentos de trabalhadores da Câmara e das freguesias.

A proposta de PDM desta maioria é clara quanto ao objectivo de pôr a cidade ao serviço das grandes imobiliárias e dos privados. Os hospitais, os espaços do Estado que estão na perspectiva e na cobiça dos altos investidores, com a cobertura da empresa ESTAMO, criada pelo governo de Sócrates, figuram já na proposta de PDM como áreas para o imobiliário e para os negócios. António Costa firmou com a ESTAMO um protocolo que compromete o Município, à revelia de qualquer participação e informação à Câmara Municipal e à Assembleia Municipal.

Quanto a nós, teremos de continuar o trabalho de esclarecimento das populações, de quem vive e trabalha na cidade. Confrontados com o projecto de Lei n.º 120/XII, da iniciativa do PS e do PSD, agora em discussão na Assembleia de Republica, de destruição de 29 juntas e 29 assembleias de freguesia em Lisboa, os lisboetas terão de ser estimulados a intervir e a esclarecer. Cabe-nos a nós um papel fundamental, no exercício pleno da luta política que não abandonamos e que teremos de aprofundar. As marcas negativas que este projecto de divisão administrativa de Lisboa deixaria na realidade concreta de cada bairro e de cada freguesia, exigem que levemos a cabo um pertinaz e sério esclarecimento e mobilização popular, que obviamente continuaríamos a fazer se esta proposta fosse em frente.

Teremos de trabalhar para que haja esclarecimento cabal e também justos prejuízos políticos e eleitorais para o PS e PSD em Lisboa. Se fizermos o nosso trabalho, estaremos ao lado das populações, dos trabalhadores do município e da cidade, de todos aqueles que reconhecem que esta realidade actual de 53 freguesias não é a causadora de crises financeiras e de outros problemas, bem pelo contrário. Como se sabe, as freguesias em todo o País representam menos de um por cento do Orçamento do Estado.

A ANAFRE e a Associação Nacional de Municípios Portugueses já tomaram posição clara contra proposta de Lei n.º 44/XII, destinada a destruir entre 1000 a 1400 freguesias em todo o País. É preciso que os nossos eleitos, os nossos camaradas, todos nós, em Lisboa, estejamos no terreno, a alertar para as consequências da destruição de cada freguesia através do projecto de Lei n.º 120/XII, do PS e do PSD. Temos de tornar muito claro e evidente o que eles preparam, para se apossarem ainda mais dos poderes e calarem as populações da cidade.

Temos de denunciar o isolamento das pessoas, e sobretudo dos mais idosos, a retirada de direitos populares e de obra feita pelas freguesias, sempre com mais rentabilidade e eficácia. Os combates políticos continuaram sempre, mesmo quando os projectos e as propostas de lei foram aprovados e, da nossa parte, essa perspectiva tem de ficar clara. Perante os efeitos violentos sobre a participação e a vida democrática em cada freguesia, lá estaríamos e estaremos, para mostrar que o caminho da democracia e da intervenção activa das populações, dos eleitos e dos trabalhadores é o melhor, e é o único que temos à nossa frente, para defender, para assumir e para impulsionar.

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Fim/AF



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