A libertação
No recente Plano Estratégico dos Transportes, onde o Governo revela ao que se reduz a sua estratégia para o País – entregue-se tudo o que possa dar lucro aos capitalistas, roube-se tudo o possível aos trabalhadores e ao povo – brilha um ódio de classe visceral.
Face à pilhagem sistemática dos recursos públicos que ocorre também no sector, o Governo adopta uma postura virginal e repete o que diferentes governos antes dele repetiram – isso não é nada connosco, nós não o teríamos feito, mas contratos são contratos, há que respeitá-los. As PPP nas auto-estradas (que são um esbulho de milhares de milhões) e os contratos de concessão da Fertagus, da MTS, da ViaPorto (que são um negócio onde o Estado paga tudo e os capitalistas embolsam os lucros) são para cumprir ou propor uma renegociação sem tocar nas margens de lucro dos capitalistas.
Em vez da natural anulação de contratos que são crimes contra o povo, em vez da criminalização dos agentes que ao serviço dos capitalistas desenharam estes assaltos, em vez da recuperação das riquezas assim roubadas, assistimos ao passar de uma esponja sobre tudo isto, e à apresentação do pérfido conceito de que, como o Estado é uma pessoa de bem, vamos cumprir os contratos, vamos pagar, e têm que ser os utentes, os trabalhadores, o povo e o património público a assumir os custos. E passada a esponja, preparam-se para assinar novas concessões, para entregar mais empresas, para prosseguir o mesmo caminho.
Mas se os contratos com os capitalistas são sagrados, já os contratos com os trabalhadores são um pecado mortal, do qual o País se tem que «libertar» (sim, a expressão é mesmo «libertação dos actuais acordos de empresa»). Que é rigorosamente o mesmo princípio com que nos querem «libertar» do subsídio de férias e Natal, do usufruto de feriados, de aumentos salariais e progressões na carreira.
O uso da palavra libertação neste contexto é evidentemente uma provocação nojenta. Mas já o Aleixo os avisou para terem cuidado com estas frases. Porque a luta contra estas políticas pode (e pelo PCP irá) deixar de ser a inevitável expressão do descontentamento de que falava MRS, e amadurecer para a necessária luta pela libertação do povo português desta corja, por um Abril Novo.