Insaciável voragem
A União Europeia é um instrumento que promove a intensificação da exploração e a regressão social
A agudização da crise sistémica do capitalismo, com as suas consequências e dinâmica – marcada por contradições, conflito parcial de interesses e desconfiança, mas igualmente pela procura de compromisso entre as principais potências capitalistas –, assim como a dramatização que intenta criar as condições para a imposição e aceitação das medidas em gestação contra os trabalhadores e a favor do grande capital, marcaram as recentes reuniões dos Conselho Europeu e da Zona Euro da União Europeia.
Face às consequências das medidas impostas aos trabalhadores e ao povo grego, o capital financeiro passa a uma nova fase, a «reestruturação da dívida» grega (implicando montantes, prazos e juros). «Reestruturar» traduz a assunção de que, nas actuais condições, essa dívida é impagável e que é necessário assumir «perdas». «Perdas» que serão, em grande medida, suportadas por financiamento público, através da entrega de acrescidos meios financeiros públicos ao capital financeiro. Logo, «perdas» que terão impactos maiores ou menores em cada país, tendo em conta a exposição do seu sector financeiro relativamente à dívida grega e a sua situação económica. Ao mesmo tempo, a União Europeia exige a continuação da aplicação dos mecanismos de extorsão e das medidas de regressão social aos trabalhadores gregos, assim como a concretização do anunciado assalto a sectores estratégicos da economia deste País.
No mesmo sentido, a União Europeia afina os mecanismos que pretensamente «protegerão» a Itália e a Espanha (a terceira e a quarta maiores economias da Zona Euro), ou melhor, os seus credores – uma vez mais, através da mobilização de colossais meios financeiros do erário público –, exigindo, como é da sua natureza, a aplicação das ditas «medidas de controlo do défice e do endividamento público» e «reformas estruturais», que mais não pretendem que efectivar o ataque às condições de vida, aos direitos e a conquistas históricas dos trabalhadores.
Em síntese, a actual «roda-viva» na União Europeia visou criar as condições para a continuação do refinanciamento do capital financeiro – nomeadamente da Alemanha e da França –, num quadro de reconfiguração do sector financeiro na Zona Euro e na União Europeia (com a continuação de falências, de aquisições e de fusões) e de concentração do capital, onde, para além do autêntico passar da «batata quente» e da maior ou menor partilha dos custos e riscos, sobressai que o grande capital alemão continua a ver e a procurar gerir esta crise como uma oportunidade para reforçar o seu domínio económico e político na União Europeia.
Deste modo aponta-se como objectivo a realização de mais uma alteração aos tratados falsamente dita «limitada» e, fundamentalmente, dirigida aos países que integram a Zona Euro, para a tornar mais «aceitável» e «exequível» – com o objectivo anunciado de, por exemplo, permitir, numa situação de incumprimento das acrescidas e reforçadas imposições da «Zona Euro»/União Europeia, a total alienação dos direitos soberanos de um povo quanto à sua política orçamental e fiscal ou a anulação dos seus direitos no processo de tomada de decisão em instituições da União Europeia.
Obviamente que há a noção de que «eventuais alterações ao Tratado de Lisboa nesta fase são um risco demasiado pesado para enfrentar», quando os trabalhadores e os povos dos diferentes países ganham consciência de que a União Europeia é um instrumento que promove a intensificação da exploração e a regressão social, assim como a dependência económica de uns e o domínio económico de outros. Sinal disso mesmo é a petição com mais de 100 mil assinaturas entregue no parlamento britânico (e rejeitada por este) a favor da realização de um referendo sobre a manutenção do estatuto de membro, o abandono ou a renegociação dos termos de permanência da Grã-Bretanha na UE. No entanto, a voragem do grande capital não parará por si…