O programa do Governo mata a nossa economia
(…) Sem renegociação da dívida não haverá desenvolvimento, não haverá crescimento económico, não haverá criação de emprego.
É preciso diminuir os encargos imediatos da dívida para investir no aumento da produção nacional e adiante ter melhores condições para pagar o que devemos.
Renegociar a dívida não é dizer que não a queremos pagar; é dizer que nestas condições – em boa parte ilegitimamente resultantes da especulação financeira – chegaremos a um ponto em que não será possível pagar.
A saída para a crise e o atraso do País não está na recessão, mas sim no aumento da produção nacional, apoiando a actividade produtiva e rejeitando a política de restrição do investimento público e de cedências aos grupos económicos, contra os interesses da nossa economia, das pequenas empresas e dos trabalhadores e da população em geral.
É verdade que é preciso também reduzir o custo de factores de produção.
Mas é preciso fazer incidir essa redução nos custos dos factores de produção ligados às grandes empresas e grupos económicos – energia, telecomunicações, crédito, seguros – com lucros fabulosos à custa da economia nacional. E não através da redução da Taxa Social Única que não tem qualquer efeito real na competitividade, beneficiando em particular grandes empresas e grupos económicos e prejudicando gravemente a Segurança Social.
(…) Este programa, que é da troika, do PS, do PSD e do CDS e agora deste Governo, tem como um dos alvos principais os direitos dos trabalhadores.
O que ninguém explica é o que tem a ver com a redução da dívida pública a diminuição efectiva dos salários, a destruição dos direitos ou a instituição da precariedade como regra do mercado de trabalho.
As alterações propostas para a legislação laboral não pagam um cêntimo de dívida; são apenas uma nova e brutal ofensiva visando o aumento da exploração. O Governo e os partidos da troika querem despedimentos mais fáceis e baratos; pretendem pôr todos os trabalhadores em situação de precariedade para os tratarem como material descartável e comprimirem as suas remunerações; querem condicionar a acção e organização sindical, designadamente através do ataque à contratação colectiva; querem a desregulação total dos horários de trabalho e o não pagamento de horas extraordinárias.
Não é com mais precariedade e com salários mais baixos que se desenvolve o País.
É com emprego com direitos, com a valorização dos salários, com a estabilidade dos vínculos que se garante que se constrói um desenvolvimento económico que rejeite o estafado modelo de baixos salários.
E este Governo, que tanto fala de apoiar as famílias, há-de explicar aos portugueses como é que ajuda as famílias e a natalidade deixar de pagar horas extraordinárias; como se beneficiam as famílias se um trabalhador for facilmente despedido perdendo a fonte do seu sustento; como se convence um jovem casal a ter filhos, se ambos recebem o salário mínimo ou menos ou se estão sujeitos ao trabalho temporário ou a um falso recibo verde, podendo ser despedidos a qualquer momento, se vão sofrer um novo rombo no crédito e no pagamento dos impostos com a habitação.
Excerto da intervenção de Jerónimo de Sousa / Debate do Programa do Governo_AR_30Junho
A palavra de ordem é vender
O que este programa quer é de facto aumentar a exploração sobre os trabalhadores, sujeitá-los à arbitrariedade.
Ainda no plano económico há uma questão decisiva: a de saber quem controla e ao serviço de quem estão as alavancas fundamentais da nossa economia.
Os portugueses já conhecem o resultado das privatizações e da liberalização de sectores económicos.
Sabem o que custa à generalidade da população e às nossas empresas a electricidade, o gás, os combustíveis.
É por isso que é indispensável a manutenção e recuperação de alavancas fundamentais da economia e do serviço às populações e a rejeição de uma política de privatizações que entrega a riqueza nacional e controle da nossa economia a grupos económicos nacionais e cada vez mais estrangeiros.
(…) Privatizar o sector segurador da Caixa que em conjunto com a área da Saúde contribui em 36% para os resultados do grupo ou alienar, como é proposto, as participações da Caixa em empresas estratégicas como a PT, a EDP, a GALP ou a REN, que renderam em 2010 quase 200 milhões de euros, é um desastre económico e financeiro.
E o que dizer da privatização dos Correios, empresa estratégica e já na mira de uma grande multinacional deste sector, que o Governo anterior e o actual tratam de facilitar com uma razia de encerramentos de postos e estações de correios, degradando o serviço público e garantindo o lucro ao eventual futuro dono privado?
Com este programa do Governo, da troika, do PSD, do CDS e do PS, a lista de privatizações chega a quase tudo.
A palavra de ordem é vender, entregar ao desbarato empresas, muitas lucrativas, que em muitos casos constituem verdadeiros monopólios naturais, ou que prestam serviços públicos essenciais, a grupos económicos privados, provavelmente grandes grupos económicos europeus, alemães, franceses e outros, os mesmos que mandaram cá a troika para impor este programa que lhes garante valiosos activos a baixo preço.
Pela via de privatizações ou pela via de diminuição de direitos o programa de desastre que nos apresentam quer negar direitos sociais e garantir uma maior fatia de sectores sociais para o negócio privado.
É a entrega de hospitais e centros de saúde em ainda maior número ao sector privado, mesmo depois dos resultados desastrosos da gestão do hospital Amadora-Sintra pelo Grupo Mello, agora em repetição por exemplo no Hospital de Braga; é o aumento do pagamento dos custos da Saúde pelas populações o que significará que muitos não terão, como já hoje não têm, tratamentos.
É o prosseguimento da destruição da escola pública e a sua cada vez maior estratificação social e elitização não só no Ensino Superior mas a níveis cada vez mais baixos da escolaridade. E tudo embrulhado na retórica neoliberal da «liberdade de escolha», que, à medida que se destroem os serviços públicos, é apenas liberdade dos serviços privados por aqueles que os puderem pagar.
É a perspectiva de entregar uma parcela fundamental da Segurança Social e dos descontos dos trabalhadores ao sector financeiro, transformando-os em matéria de negócio e lucro, em vez de serem direitos adquiridos.
Mas querem mais do que isso. Querem transformar direitos próprios de cada português – à Saúde, à Educação, ao apoio social – numa política de caridade pública e privada de estigmatização da pobreza e dos mais desfavorecidos e uma certa recuperação do instituto da «sopa do Sidónio».
Excerto da intervenção de Jerónimo de Sousa / Debate do Programa do Govern, AR, 30Junho