Notas de campanha
1. Numa sociedade percorrida por antagonismos de classe, a farsa e a mentira são elementos indissociáveis do funcionamento da democracia formal, tanto mais evidentes quanto mais profundos forem esses antagonismos. Não poderia ser de outra forma. Os partidos que actuam ao serviço dos interesses minoritários da classe dominante precisam de um apoio eleitoral que vá muito além dessa estreita (estreitíssima, em termos numéricos) base social de apoio. Por esta razão, expressam preocupações, afirmam intenções e fazem promessas que mais não visam do que ocultar a real natureza e consequências da política que praticam.
A conquista e o exercício do poder político a favor dos interesses de uma ínfima minoria (e contra os interesses da larga maioria) exigem a adesão de amplas camadas da população (naturalmente, de muitos dos que se incluem na larga maioria prejudicada). Eis pois a necessidade imperiosa da farsa e da mentira. O exercício prolongado do poder ao serviço desses mesmos interesses – ao longo de anos ou mesmo décadas – exige que ambas sejam uma prática reiterada. Exige que se lancem nuvens de fumo sobre o passado; que se apague o rasto das consequências desse exercício do poder; que se dificulte a atribuição de responsabilidades. Mas exige também a alternância capaz de alimentar a ilusão de alternativa. Como exige esforços de monta para apoucar, diminuir ou pura e simplesmente ocultar as reais alternativas – as que põem em causa o poder e a influência da classe dominante.
Por tudo isto, nas condições concretas em que hoje travamos a nossa luta, ela não deixa de ser uma luta árdua e tenaz pela verdade, contra a farsa e a mentira. Em campanhas eleitorais como a que vivemos, ambas têm expressão quotidiana, por vezes grotesca: do cravo vermelho erguido por Paulo Portas às repetidas afirmações de José Sócrates em defesa do Serviço Nacional de Saúde e da Escola Pública.
2. Com a campanha eleitoral a chegar ao fim, os que fizeram dela aquilo que quiseram que ela fosse e os que projectaram dela a imagem que quiseram projectar lamentam-se pela sua falta de conteúdo, pela falta de debate político «sobre os problemas do País». Costumeiros «senadores» da praça e comentadores encartados entram em cena para lamentar que os ataques pessoais, as tricas e o espectáculo do acessório tenham tomado o lugar do debate sério sobre a situação do País e sobre as soluções para lhe fazer frente. Como sempre, metem tudo no mesmo saco. Como sempre, deturpam e ocultam a acção de uns, para a confundir com a acção e o comportamento de outros. E vaticinam (ou aconselham...) uma elevada abstenção e a subida acentuada do voto em branco, «de protesto». Se muitos não se mostram já dispostos a persistir no voto contra os seus interesses então, pelo menos, que se abstenham de qualquer atitude consequente com a defesa dos mesmos...
3. Pela campanha da CDU passaram factos e argumentos; passou Portugal, a sua situação e a sua evolução nas últimas três décadas e meia; passou a União Europeia – a sua natureza, objectivos, evolução e o conteúdo das suas políticas; passou informação, muita informação, sobre o conteúdo do memorando do FMI e da UE, assinado por PS, PSD e CDS; passaram propostas para o País; passou o prestar de contas sobre o trabalho feito nos últimos anos; passaram compromissos firmados para o futuro; passaram a análise rigorosa da realidade, o debate e a discussão séria.
Pela campanha da CDU passaram os mais de 12 mil milhões de euros de dividendos distribuídos aos accionistas das empresas do PSI-20 em 2010; passaram os 30 mil milhões de euros de juros que o País vai pagar por um empréstimo de 78 mil milhões (cerca de 40%, indo mais de dois terços para a UE, que nos dizem estar a ser «solidária» connosco); passou o aumento dos resultados operacionais do FMI no primeiro trimestre de 2011 em 404 por cento, coincidente com a «ajuda» à Grécia e à Irlanda; passaram as consequências, quer na Grécia quer na Irlanda, das mesmas medidas que aqui querem implementar.
Pela campanha da CDU passou a necessidade de renegociação imediata da dívida pública, nos seus juros, prazos e montantes; passou a defesa da produção nacional e da valorização do trabalho; passaram propostas para estimular o crescimento económico e promover o desenvolvimento, com uma distribuição mais justa da riqueza criada; passaram medidas de curto, de médio e de longo prazo; passaram respostas de emergência à situação do País e uma visão soberana, ampla, de futuro.
Pela campanha da CDU passaram razões de sobra para lutarmos, com confiança, por esse futuro.