Defender a paz
Não há propaganda que apague o facto de que a «zona de exclusão aérea», a «protecção das populações civis», a «liberdade» e a «democracia» fazem parte de uma farsa a que o Conselho de Segurança da ONU deu cobertura, com vista ao desenvolvimento das acções de guerra promovidas e coordenadas pela NATO, transformando a Líbia num campo de experiências do seu novo conceito estratégico aprovado na cimeira de Lisboa. O objectivo da NATO é o domínio geoestratégico do país e da região, dos recursos naturais da Líbia, e aumentar os lucros do complexo industrial-militar. As regiões do Norte de África e do Médio Oriente vivem complexos processos de luta anti-imperialista. No Egipto, Tunísia, Bahrein, Jordânia, Iémen, Marrocos, Palestina, Argélia, os povos demonstram maturidade política, levantando-se contra décadas de exploração, de ditadura e de submissão aos interesses do imperialismo, exigindo mudanças democráticas e transformações económicas e sociais. O imperialismo mantém-se na ofensiva. Protege os aliados e ataca os inimigos, retoma a iniciativa, conspira e promove abertamente a ingerência e o militarismo. A Síria é inimiga, vítima da sua atitude anti-imperialista, condenando a política de Israel, dos EUA e da UE na região, e onde não é possível esconder a ingerência externa, financiam e armam o que chamam «protestos pacíficos». O regime do Bahrein é aliado, por isso procuram esconder a repressão do levantamento popular com a entrada de forças militares sauditas e dos Emirados Árabes Unidos, em nome do Conselho de Cooperação do Golfo, para impedir as legítimas aspirações democráticas e as suas reivindicações económicas e sociais, numa acção de agressão do povo que viola o direito internacional e visa proteger os interesses dos EUA, que têm instalada neste país a sua V Esquadra (maior base dos EUA no Golfo Pérsico). No Iémen defendem um regime que reprime violentamente o seu povo e a sua luta por transformações democráticas e por melhores condições de vida, para proteger mais um aliado na chamada luta contra o terrorismo.
A hipocrisia do costume
É necessário sublinhar a hipocrisia e o cinismo dos EUA, da NATO e da UE, que até há bem pouco tempo mantinham estreitas relações com a Líbia e com Muammar Khadafi para a extracção de petróleo pelas suas multinacionais, na chamada luta contra o terrorismo e na utilização desse país como zona tampão para reprimir e perseguir os imigrantes que tentam chegar à Europa. Hipocrisia e cinismo gritantes e tanto mais evidentes quanto apoiam abertamente a oposição líbia e o «movimento pró-democracia», incluindo financeiramente ou através do fornecimento de armas, do envio de tropas, do envio dos famosos drones (aviões não tripulados responsáveis pela morte de muitos milhares de pessoas no Afeganistão e Paquistão) ou do iminente envio de uma «missão humanitária» da UE para o teatro de guerra. Hipocrisia e cinismo quando são conhecidas e reconhecidas as ligações de algumas das suas organizações aos talibãs, à Al Qaeda e a grupos armados e treinados com o patrocínio da CIA no Afeganistão nos anos 90 para lutar contra os soviéticos. Salta à evidência o que há muito vínhamos dizendo, isto é, que a chamada luta contra o terrorismo e a Al Qaeda é parte de uma manipulação do imperialismo para dominar países e povos, intensificando a exploração dos trabalhadores, reprimindo as suas aspirações, atacando direitos, liberdades e garantias.
A realidade no terreno demonstra que a intervenção directa da NATO e a ingerência nos assuntos internos deste país soberano em nada contribuíram para a resolução do conflito interno, antes o aprofundaram, com elevados custos para as populações, para a infra-estrutura do país e para o seu futuro enquanto Estado soberano e independente.
É obrigação do governo português (PS), enquanto membro (não permanente) do Conselho de Segurança da ONU, de actuar na defesa dos princípios consagrados na nossa Constituição, defendendo a paz, a não ingerência nos assuntos internos de outros estados e a abolição do imperialismo. Não o faz. É sua obrigação promover e defender uma solução pacífica e política do conflito na Líbia, sem qualquer ingerência externa, como a melhor forma de defender os interesses e legítimas aspirações do povo líbio e de todos aqueles que na região prosseguem a luta em defesa dos seus direitos económicos e sociais, da democracia e da soberania e da paz. Não o faz. Nem tal nos surpreende. Mas não baixaremos os braços e continuaremos a lutar para que isto mude.