Aproveitar os recursos do País
Num comício em Montelavar, no concelho de Sintra, Jerónimo de Sousa reafirmou a particular urgência que assume na actual situação do País a aposta na produção nacional.
Portugal tem valiosos recursos minerais que estão desaproveitados
O salão da Sociedade Filarmónica Boa União Montelavarense (que cumpria por esses dias 120 anos) encheu-se para receber o Secretário-geral do PCP. Entre os presentes, muitos não eram militantes do PCP, mas gente ligada à indústria das rochas ornamentais, que enfrenta actualmente uma situação muito grave, com o encerramento nos últimos anos de 130 empresas. Como tal, era gente a quem interessava ouvir as propostas do Partido para pôr, como se afirma no próprio lema da campanha em que se inseriu o comício, Portugal a Produzir.
Naquela região – onde se integra Montelavar, mas também Pêro Pinheiro, Terrugem e Almargem do Bispo – há significativas reservas de calcários e mármores e uma secular tradição da sua extracção e transformação. Dali saíram as rochas utilizadas na construção de monumentos tão célebres como o Convento de Mafra (de que fala José Saramago n' O Memorial do Convento) ou o contemporâneo Centro Cultural de Belém.
No entender do PCP, a actual crise que o sector do mármore enfrenta decorre da depressão na construção civil, resultado de um período de quase dez anos de desenfreado excesso de construção. Isto levou à existência de quase 600 mil casas vagas, com o valor de 90 a 100 mil milhões de euros. Na opinião dos comunistas, a saída para o sector da construção civil é a reabilitação dos centros históricos das principais cidades, por um lado, e a construção de edifícios industriais, «no quadro de um urgente e necessário relançamento da indústria transformadora nacional».
O Secretário-geral do PCP saudou ainda a a iniciativa de um grupo de pequenos e médios empresários do sector do mármore das quatro freguesias, que constituíram uma Comissão para a Defesa da Indústria das Rochas Ornamentais. Para Jerónimo de Sousa, muitas das propostas que fazem são de «grande interesse e relevância»: a criação da Escola Pública Profissional de Marmoristas; o reforço de apoios financeiros a projectos de modernização tecnológica; o investimento na recuperação e reabilitação das principais cidades e centros históricos; a construção do Terminal Rodo/Ferroviário da Pedra Furada; a modernização da Linha do Oeste.
Riqueza desperdiçada
Da tribuna do comício de Montelavar, Jerónimo de Sousa lembrou que o País tem «múltiplos e diversificados recursos naturais», entre os quais se destacam os geológicos. Entre estes, destacou os minerais básicos, os nobres, os metais estratégicos ou mesmo outros, mais raros, como o lítio, que cada vez mais incorpora novos produtos. Estes recursos, «se postos ao serviço da produção nacional, no interesse do povo e do País, permitiriam abastecer com segurança um diversificado conjunto de indústrias transformadoras».
Mas não é o que tem acontecido: estas riquezas ou estão por explorar ou estão nas mãos do capital estrangeiro, quase sempre com reduzida ou nula transformação em território nacional. Sendo fundamental ter recursos, Jerónimo de Sousa considera não ser «condição suficiente» de desenvolvimento, por não serem adoptadas «políticas patrióticas que os valorizem no interesse nacional».
Jerónimo de Sousa deu ainda o exemplo do cobre. Portugal, possuindo a maior mina da Europa, com minérios de elevadíssimo teor a nível mundial, não tem uma metalurgia do cobre, apesar de esta ter estado em «avançada fase de projecto nas décadas de 70 e 80». Com raríssimas excepções, lembrou o dirigente do PCP, todos os países com cobre possuem metalurgias, havendo mesmo aqueles que não possuem o minério e têm metalurgias.
O PCP defende a adopção de uma política de Estado em defesa e promoção da produção nacional. Uma das propostas passa pela concretização de um programa nacional de desenvolvimento industrial, com mais investimento público, com o reforço e ampliação do sector empresarial do Estado, com o apoio às pequenas e médias empresas e com o planeamento económico.
Crise não é só nos mármores
Nas intervenções dos dois elementos da Organização Concelhia de Sintra do Partido ficou clara a situação vivida no sector dos mármores. Domingos Pardal, ele próprio ligado ao sector, falou dos 1600 desempregados provocados pelo encerramento de mais de 150 empresas dando um exemplo pungente: «na estrada nacional entre Morelena e Montelavar, onde se encontrava a maior parte das grandes e médias empresas, num total de 20 só três sobrevivem.» As 17 que fecharam chegaram a empregar mais de mil operários.
Domingos Pardal exortou o Estado a assumir as suas responsabilidades, pois a indústria da pedra «tem futuro». Os seus operários, acrescentou, souberam lutam através dos tempos quer pela dignificação da classe quer na luta mais geral do povo, pela implementação da República ou contra a ditadura fascista.
Já Pedro Ventura, dos organismos executivos da Comissão Concelhia, chamou a atenção para a liquidação de empresas no concelho – não só do sector dos mármores, mas em vários outros, como o gráfico, o farmacêutico ou o alimentar. Segundo este dirigente comunista, as prioridades do PCP no concelho, ao nível da autarquia, prendem-se com a criação de emprego: actualmente há 20 mil desempregados inscritos nos centros de emprego de Sintra enquanto que 38 por cento dos jovens trabalhadores encontram-se com vínculos precários. Ao mesmo tempo, e como consequência, registam-se quebras de produção em vários sectores.