Se isto é um sindicalista...

Anabela Fino

O facto de a UGT não ter participado na mega-manifestação de dia 29 convocada pela CGTP-IN não constituiu propriamente uma surpresa. O que pode surpreender (ou talvez não) é a «explicação» dada pelo respectivo secretário-geral, João Proença, quando questionado nesse mesmo dia sobre o assunto. De acordo com as notícias vindas a público e não desmentidas, Proença terá dito que a manifestação foi marcada no 1.º de Maio, pelo que não surgiu em resposta à crise.

A tese é curiosa e vale a pena esmiuçá-la. Em primeiro lugar, remete para a ideia de que a 1 de Maio não havia crise nenhuma e que os trabalhadores, para além da celebração da emblemática data, não teriam motivos para protestar. Ora, se a 1 de Maio não havia crise, isso significa, segundo a UGT, que as medidas anti-socais até aí anunciadas pelo Governo eram perfeitamente aceitáveis, até justas e eventualmente indispensáveis. Em segundo lugar, instila o veneno de que a CGTP-IN se entretem a marcar jornadas de luta não porque haja razões para lutar mas porque é do contra. Esta ideia, de resto, foi devidamente reforçada por Proença ao dizer que «marcar-se uma luta e a seguir outra luta, porque o objectivo é permanecer permanentemente em luta contra tudo e contra todos, nomeadamente contra o resultado de eleições democráticas em Portugal, nunca foi objectivo da UGT». Em terceiro lugar, e dado que a UGT não mudou de opinião entre 1 e 29 de Maio, apesar do brutal pacote de medidas contra os trabalhadores acrescentadas ao PEC nesse período, fica implícito que para a organização continua a não haver razões para lutar. Quando o fará a UGT, então? Proença não deixa margem para dúvidas: «se os sacrifícios exigidos forem demasiados, subirá a contestação social». Ou seja, para a UGT os sacrifícios impostos ainda não são demasiados, quanto muito serão assim uma espécie de óleo de fígado de bacalhau, amargo mas benéfico. A canga ainda aguenta mais carga, considera Proença.

Se isto é um sindicalista, vai ser preciso mudar o nome aos que fazem fretes aos governos a mando do capital, tenham eles a chancela do PS ou do PSD.


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