A crise do capitalismo, o PEC e a luta

Albano Nunes

Estão a con­ge­minar para o «pós-crise» ce­ná­rios de brutal recuo ci­vi­li­za­ci­onal

Ao contrário do que ainda há poucos meses afirmavam os arautos do sistema, a crise capitalista desencadeada nos EUA em finais de 2008 está para dar e durar. De um dia para o outro a tónica do seu discurso passou de esperançosos «sinais de recuperação», para a de mais e «inevitáveis sacrifícios», antecipando mesmo que o que se seguirá não será a solução mas o agravamento dos problemas, desde o desemprego à segurança internacional. O grande capital financeiro, a fracção do capital que cada vez mais fundido com o poder do Estado comanda ferreamente a dinâmica do sistema, não só não está disposto a abrir mão dos seus fabulosos lucros (é essa a sua natureza) como está a utilizar a crise que ele próprio provocou, para intensificar a exploração, liquidar conquistas sociais e direitos democráticos alcançados por décadas de duras lutas, reforçar o seu próprio poder. Mais ainda. Num quadro em que o capitalismo não se encontra condicionado pela competição e comparação com o socialismo e a sua evidente superioridade social, os arautos do sistema, que sempre o apresentaram como a mais avançada de todas as formas de sociedade, estão a congeminar para o «pós-crise» cenários de brutal recuo civilizacional em que, mesmo os direitos mais elementares hoje consagrados na Carta da ONU e no Direito Internacional, seriam letra morta. É neste sentido que apontam as políticas de «ajuste» que estão a lançar para cima dos trabalhadores e dos povos, os custos das gigantescas injecções de capital que salvaram e engordaram o sistema financeiro. É neste sentido que aponta o Programa de Estabilidade e Crescimento que o Governo do PS, de braço dado com os partidos da direita e submisso às exigências da UE, quer impor ao povo português. É neste sentido que apontam as teorias de que se tem «vivido acima das possibilidades» e não será mais possível «viver como dantes», sendo necessário acabar com a «anomalia do Estado social europeu». É neste sentido que aponta um «novo paradigma de crescimento» capitalista, em que tudo seria transformado em mercadoria e o trabalhador reduzido à condição de simples produtor de mais valia. Tão ambiciosos projectos de regressão não passam por ora disso mesmo, de projectos. A resistência e a luta que se desenvolve por todo o mundo pode derrotá-los. Mas eles existem e são realmente perigosos pois são acompanhados de uma frenética corrida aos armamentos num quadro em que se multiplicam as agressões imperialistas e os focos de tensão que (como bem mostram os antecedentes da 2.ª Guerra Mundial, da invasão japonesa da Manchúria a Munique, passando pela guerra Civil de Espanha ou pela invasão da Etiópia por Mussolini), podem vir a ter desenvolvimentos imprevisíveis. Tanto mais que se agudizam as rivalidades e as contradições inter-imperialistas, com os EUA a insistir numa afirmação de «liderança» que já não corresponde ao seu peso real no xadrez mundial, um Japão onde renasce o militarismo e crescem pretensões hegemónicas na região Ásia-Pacífico, a «grande» Alemanha a submeter a UE aos seus interesses como se viu no último Concelho Europeu em torno da chamada «ajuda» à Grécia, num processo que abalou seriamente a credibilidade do euro e que levou mesmo um «europeista» tão empedernido como Filipe Gonzalez, presidente do «Grupo de reflexão sobre o futuro da União», a afirmar que «a situação da UE é de emergência». Neste quadro a luta dos comunistas e o reforço da sua solidariedade internacionalista é insubstituível. Contra a exploração, contra o militarismo e contra a guerra. Pelo fortalecimento da frente anti-imperialista. Tirando partido das dificuldades e contradições entre as grandes potências capitalistas. Neste sentido é de realçar a importância da posição comum aprovada na recente reunião do Grupo de Trabalho dos Encontros de Partidos Comunistas e Operários realizada em Lisboa, a propósito da Cimeira da NATO que terá lugar em Novembro em Portugal.


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