O desporto e os grandes interesses financeiros (I)
Há cerca de 20 anos para cá que uma nova ordem desportiva mercantil e mundializada apareceu e impôs-se por todo o lado, em especial nos países do chamado mundo desenvolvido. À escala mundial, a alta competição, ou o desporto de alto nível espectacular e mediático, passou a ter grande interesse para as grandes empresas de comércio, de comunicação e da alta finança, tendo a televisão passado a desempenhar um papel decisivo na exploração do mito desportivo representado pelas grandes estrelas dos desportos mediáticos.
Em todo o mundo, o desporto passou a ocupar um lugar marcante no imaginário colectivo das nações. Traduzido, por exemplo, no número de espectadores televisivos que assistem, semana após semana, aos grandes acontecimentos desportivos: 41 milhões, em 200 países, em relação aos Jogos Olímpicos; 45 milhões, em 130 países, em relação aos grandes Prémios da Fórmula 1; 40 milhões, em 200 países, em relação à Taça do Mundo de Futebol.
Novos tipos de empresas apareceram, como a primeira agência mundial de marketing desportivo, a International Management Group (IMG), que se associou à Chase Capital Parterns para conseguir vários milhões de euros necessários à sua política de penetração em vários clubes profissionais de diferentes modalidades. A sociedade English National Investment Company (ENIC) detém cerca de 25% das acções do Glasgow Rangers, 54% do Slavia de Praga, 79% do AEK de Atenas. Nos Estados Unidos da América, nas duas últimas décadas, os principais grupos de comunicação passaram a controlar as Ligas Maiores («majeurs-basebal», basquetebol, futebol americano e hóquei sobre o gelo).
É evidente que este avanço massivo de capitais provocou enormes transformações no desporto, e o espectáculo desportivo, que tudo passou a comandar, passou a preocupar-se em exclusivo, com a rendibilidade financeira destas novas empresas.
Desta forma, os antigos clubes que se dedicavam ao futebol, por exemplo, deixaram de ter objectivos desportivos, assumindo, prioritariamente finalidades financeiras de acordo com a lógica que orienta as empresas e os accionistas que passaram a definir a sua estratégia de acção.
Relações obscuras
Ora, por mais que os defensores desta «nova ordem desportiva» não gostem de o ouvir, a verdade é que o desporto não foi organizado através dos clubes desportivos para que estes conseguissem obter lucros financeiros. Sendo certo que, tal como todas as outras actividades humanas, por mais tradicionalmente desinteressadas que se tenham manifestado durante o século passado (como a cultura e a arte) mas que foram «engolidas» pelos interesses financeiros, também o desporto não pode escapar a idêntica situação... Pensar num desporto «puro» foi um erro cometido por muitos durante muito tempo quando, afinal, vários interesse de diferente tipo se manifestavam já no desporto e através dele (urbanismo, afirmação política, etc.). Assim, a relação do desporto com o dinheiro não é negativa em si mesma, e reconhecer as vantagens da satisfação do mercado da procura, permitiu a democratização da prática desportiva e do espectáculo desportivo. Mas o mercado não pode deixar de constituir um meio, não devendo passar a tudo regular.
A situação actual permite-nos extrair as consequências de uma ultrapassagem significativa destes limites ao transformar os clubes em autênticas empresas destinadas a obter lucros financeiros como principal objectivo a que tudo, neles, se deve subordinar: a ética do desporto, quer em relação ao seu fundamento objectivo (o respeito pela regra e pelo próprio praticante), quer no seu fundamento subjectivo (o sistema de valores subjacentes à prática e à organização do próprio desporto), foi profundamente abalada. Antes de tudo, a alteração das regras com o único objectivo de responder a necessidades de comercialização põe em causa o processo autonómico do próprio desporto, fazendo-o também perder grande parte da sua função reguladora; a visão que cada modalidade passou a ter de si própria, em termos culturais e formativos, foi também profundamente alterada, passando a dominar exclusivamente, a preocupação com a vitória (conseguida a todo o custo!) e a detecção dos mais dotados como «artistas» de um espectáculo que passou a reger-se por um estatuto ainda demasiado confuso e indefinido (a «Lei Bosman» veio dar uma autêntica machadada numa situação de gritante injustiça, em termos do profissionalismo tão falado); a exploração sensacionalista do fait divers desportivo veio empobrecer seriamente o conteúdo cultural do desporto; a exploração da «paixão clubística» provocou já, em termos gerais, o aparecimento de uma obscura relação de interesses diferenciados (políticos, urbanísticos, etc.) que levou à germinação de múltiplas situações de pura corrupção.
Em todo o mundo, o desporto passou a ocupar um lugar marcante no imaginário colectivo das nações. Traduzido, por exemplo, no número de espectadores televisivos que assistem, semana após semana, aos grandes acontecimentos desportivos: 41 milhões, em 200 países, em relação aos Jogos Olímpicos; 45 milhões, em 130 países, em relação aos grandes Prémios da Fórmula 1; 40 milhões, em 200 países, em relação à Taça do Mundo de Futebol.
Novos tipos de empresas apareceram, como a primeira agência mundial de marketing desportivo, a International Management Group (IMG), que se associou à Chase Capital Parterns para conseguir vários milhões de euros necessários à sua política de penetração em vários clubes profissionais de diferentes modalidades. A sociedade English National Investment Company (ENIC) detém cerca de 25% das acções do Glasgow Rangers, 54% do Slavia de Praga, 79% do AEK de Atenas. Nos Estados Unidos da América, nas duas últimas décadas, os principais grupos de comunicação passaram a controlar as Ligas Maiores («majeurs-basebal», basquetebol, futebol americano e hóquei sobre o gelo).
É evidente que este avanço massivo de capitais provocou enormes transformações no desporto, e o espectáculo desportivo, que tudo passou a comandar, passou a preocupar-se em exclusivo, com a rendibilidade financeira destas novas empresas.
Desta forma, os antigos clubes que se dedicavam ao futebol, por exemplo, deixaram de ter objectivos desportivos, assumindo, prioritariamente finalidades financeiras de acordo com a lógica que orienta as empresas e os accionistas que passaram a definir a sua estratégia de acção.
Relações obscuras
Ora, por mais que os defensores desta «nova ordem desportiva» não gostem de o ouvir, a verdade é que o desporto não foi organizado através dos clubes desportivos para que estes conseguissem obter lucros financeiros. Sendo certo que, tal como todas as outras actividades humanas, por mais tradicionalmente desinteressadas que se tenham manifestado durante o século passado (como a cultura e a arte) mas que foram «engolidas» pelos interesses financeiros, também o desporto não pode escapar a idêntica situação... Pensar num desporto «puro» foi um erro cometido por muitos durante muito tempo quando, afinal, vários interesse de diferente tipo se manifestavam já no desporto e através dele (urbanismo, afirmação política, etc.). Assim, a relação do desporto com o dinheiro não é negativa em si mesma, e reconhecer as vantagens da satisfação do mercado da procura, permitiu a democratização da prática desportiva e do espectáculo desportivo. Mas o mercado não pode deixar de constituir um meio, não devendo passar a tudo regular.
A situação actual permite-nos extrair as consequências de uma ultrapassagem significativa destes limites ao transformar os clubes em autênticas empresas destinadas a obter lucros financeiros como principal objectivo a que tudo, neles, se deve subordinar: a ética do desporto, quer em relação ao seu fundamento objectivo (o respeito pela regra e pelo próprio praticante), quer no seu fundamento subjectivo (o sistema de valores subjacentes à prática e à organização do próprio desporto), foi profundamente abalada. Antes de tudo, a alteração das regras com o único objectivo de responder a necessidades de comercialização põe em causa o processo autonómico do próprio desporto, fazendo-o também perder grande parte da sua função reguladora; a visão que cada modalidade passou a ter de si própria, em termos culturais e formativos, foi também profundamente alterada, passando a dominar exclusivamente, a preocupação com a vitória (conseguida a todo o custo!) e a detecção dos mais dotados como «artistas» de um espectáculo que passou a reger-se por um estatuto ainda demasiado confuso e indefinido (a «Lei Bosman» veio dar uma autêntica machadada numa situação de gritante injustiça, em termos do profissionalismo tão falado); a exploração sensacionalista do fait divers desportivo veio empobrecer seriamente o conteúdo cultural do desporto; a exploração da «paixão clubística» provocou já, em termos gerais, o aparecimento de uma obscura relação de interesses diferenciados (políticos, urbanísticos, etc.) que levou à germinação de múltiplas situações de pura corrupção.