Enquanto Obama falava
Permita-se-me que me dispense de ir ver a data exacta em que o presidente Barack Obama partiu dos Estados Unidos para fazer o que talvez possa ser designado por «périplo europeu/africano». Registo, isso sim, que a televisão portuguesa, em convergência aliás com a TV de muitos outros lugares, deu grande destaque a essa tournée, como de resto se justificava, ainda que sempre ou quase sempre se esquecendo de aspectos limitativos dos méritos abundantemente proclamados da viagem presidencial. Tudo bem, enfim. Ou quase. Mas registo também que entretanto o presidente democraticamente eleito das Honduras, Manuel Zelaya, foi afastado do poder e humilhado (terá sido detido no seu domicílio em pijama e assim mesmo expulso do país num avião em que foi metido à força) por militares golpistas obedecendo às ordens directas de um presidente usurpador e de um tribunal agindo à margem da legalidade. Era o regresso à técnica latino-americana do golpe militar apoiado do exterior, tristíssima tradição que se tornou uma vergonha para a região. Rejeitado formalmente por todos os estados do continente americano, incluindo os Estados Unidos, mas nem sempre nos termos indignados que bem se justificariam, a golpaça foi noticiada pelas estações portuguesas de televisão, é certo, mas em termos algo distraídos, como quem fala de qualquer coisa de secundário. De então para cá, os diversos telenoticiários e seus complementos parecem ter perdido o rasto ao acontecimento, tão escassamente se lhe referem. Sublinham ainda, isso sim, as supostas ou efectivas virtudes da viagem de Obama e das suas palavras. Infelizmente, porém, não me apercebi de que entre todas elas algumas se destinassem expressa e claramente a verberar a golpaça de Tegucigalpa e a exprimir inteira solidariedade para com Manuel Zelaya, afinal seu colega, vítima de uma brutalidade inaceitável enquanto ele próprio, Obama, semeava boas palavras em diversos lugares do mundo.
Os dados omitidos
Vista assim, digamos que olhada à superfície, a situação já não era linda de ver. Porém, como aliás é de regra em tais casos, um exame um poucochinho mais aprofundado aponta para uma realidade muito mais feia. Dados colhidos sem que sequer seja preciso recorrer a fontes de acessibilidade difícil revelam que o embaixador norte-americano em Tegucigalpa, um tal Hugo Llorenz, é um cubano-americano emigrado em Miami e foi Director dos Assuntos Andinos do Conselho Nacional de Segurança de Washington quando ocorreu o frustrado golpe militar contra o presidente Hugo Chavez. Sabe-se também que Llorenz tem no seu currículo (ou, se se preferir outra palavra, no seu cadastro) frequente colaboração com Otto Reich, que pelo nome não perca. Reich é um «histórico» do grupo de falcões que conferiu à administração Bush a sua feição mais sinistra, e Llorenz promete não lhe ficar muito atrás. Escusado será dizer que estes dados lançam importantes pistas para o entendimento do que aconteceu em Tegucigalpa e do que continua a acontecer agora nos bastidores dos acontecimentos mais espectaculares que, por o serem, são obrigatoriamente temas de notícias, ainda que dadas discretamente e como que a contragosto. Porém, nos estúdios das estações portuguesas de televisão parece não se saber nada disto, o que é de muito espantar. De facto, se até um obscuro comentador do que a TV diz ou cala tem acesso a tais elementos, é muito curioso que nas estações lusas de televisão sejam ignorados e mais ainda que, não o sendo, não sejam revelados. Acontece até que estas informações adicionais mas contudo basilares podem apontar para um certo grau de inocência do presidente Obama relativamente à patifaria cometida: Obama continua no altar de muitas esperanças ou de muitas hipocrisias, conforme os casos, e bem se pode admitir que não controle as acções de muitos dos facínoras profissionais que pululam nas estruturas dos diferentes poderes norte-americanos. Isto é: que mande pouco, hipótese que contribuirá para prolongar o seu «estado de graça». Por isso mesmo não se entende a raiz da deformadora parcimónia informativa da TV portuguesa quanto ao golpe nas Honduras. E essa dificuldade de entender até pode permitir a suspeita, decerto absurda, de que algum Otto Reich mande por cá alguma coisa.
Os dados omitidos
Vista assim, digamos que olhada à superfície, a situação já não era linda de ver. Porém, como aliás é de regra em tais casos, um exame um poucochinho mais aprofundado aponta para uma realidade muito mais feia. Dados colhidos sem que sequer seja preciso recorrer a fontes de acessibilidade difícil revelam que o embaixador norte-americano em Tegucigalpa, um tal Hugo Llorenz, é um cubano-americano emigrado em Miami e foi Director dos Assuntos Andinos do Conselho Nacional de Segurança de Washington quando ocorreu o frustrado golpe militar contra o presidente Hugo Chavez. Sabe-se também que Llorenz tem no seu currículo (ou, se se preferir outra palavra, no seu cadastro) frequente colaboração com Otto Reich, que pelo nome não perca. Reich é um «histórico» do grupo de falcões que conferiu à administração Bush a sua feição mais sinistra, e Llorenz promete não lhe ficar muito atrás. Escusado será dizer que estes dados lançam importantes pistas para o entendimento do que aconteceu em Tegucigalpa e do que continua a acontecer agora nos bastidores dos acontecimentos mais espectaculares que, por o serem, são obrigatoriamente temas de notícias, ainda que dadas discretamente e como que a contragosto. Porém, nos estúdios das estações portuguesas de televisão parece não se saber nada disto, o que é de muito espantar. De facto, se até um obscuro comentador do que a TV diz ou cala tem acesso a tais elementos, é muito curioso que nas estações lusas de televisão sejam ignorados e mais ainda que, não o sendo, não sejam revelados. Acontece até que estas informações adicionais mas contudo basilares podem apontar para um certo grau de inocência do presidente Obama relativamente à patifaria cometida: Obama continua no altar de muitas esperanças ou de muitas hipocrisias, conforme os casos, e bem se pode admitir que não controle as acções de muitos dos facínoras profissionais que pululam nas estruturas dos diferentes poderes norte-americanos. Isto é: que mande pouco, hipótese que contribuirá para prolongar o seu «estado de graça». Por isso mesmo não se entende a raiz da deformadora parcimónia informativa da TV portuguesa quanto ao golpe nas Honduras. E essa dificuldade de entender até pode permitir a suspeita, decerto absurda, de que algum Otto Reich mande por cá alguma coisa.