Uma peça na engrenagem

Filipe Diniz
Uma página de jornal como tantas outras. Neste caso, a página 8 do Sol (03.07.09), dedicada às listas de candidatura às eleições legislativas. Dois terços (com fotografia) dedicados ao PSD. Do restante espaço, quatro colunas para o BE, duas para a CDU. O conteúdo noticioso das notícias sobre o BE e a CDU é idêntico: as duas forças políticas propõem à eleição os deputados actuais. Essa manutenção significa, para o jornalista, que os comunistas são «conservadores», coisa que, naturalmente, não sucede com o BE, que apenas pretende «meter no Parlamento quase toda a direcção do partido».
Esse propósito do BE é explicado assim por um membro da sua comissão política: «o principal espaço de luta é o Parlamento e aí devem estar os principais dirigentes».
Muito progrediu o BE desde a sua criação. Já vai longe, pelos vistos, aquele bernsteiniano «movimento» descrito na Declaração «Começar de Novo», empenhado em enriquecer «instrumentos de participação directa dos cidadãos na vida política», tão crítico do «impasse do sistema político português», que sublinhava que «as principais decisões não se tomam em sede parlamentar ou sequer no governo».
Dez anos de vida ensinaram ao BE muito respeito pelas instituições e pelo parlamentarismo. É este BE que defende que o actual Parlamento Europeu - com uma larguíssima maioria de direita e com a social-democracia que sabemos - deve ser incumbido de elaborar uma nova proposta de Tratado Europeu.
Não aprendeu com os quatro anos de maioria absoluta do PS.
Se o actual Governo e a sua maioria parlamentar caminham agora aceleradamente para a derrota, certa e merecida, é porque os trabalhadores portugueses, em vez de considerarem a Assembleia da República «o principal espaço de luta», combateram tenazmente a sua política e defenderam os seus direitos nas empresas, nas escolas, nas ruas, em tantas e tantas grandiosas acções de massas em que os dirigentes do BE vieram mostrar-se, pelos vistos a contra-gosto.
Começa a assentar como uma luva ao próprio BE a crítica que a sua mencionada <Declaração» fazia então à «política que existe»: «a fulanização aproxima-a de uma feira de vaidades, o minimalismo da dependência face aos media retira-lhe densidade e qualidade».


Mais artigos de: Opinião

Entre barreiras

Perplexo e não refeito, o País esforça-se por desvendar o enigmático, embora bastante popularizado, gesto com que Manuel Pinho brindou o hemiciclo. Há os que, por simplicidade e maior linearidade de raciocínio, vêem no gesto expressão de grosseria ou má educação, resultado provável de «papa maizena» em excesso e...

Pouca história e pouca vergonha

Falta história ao PS no combate ao fascismo. O PS da primeira República rendeu-se e dissolveu-se no início do salazarismo. As posições social-democratas, no longo combate contra a «ditadura terrorista dos monopólios associados ao imperialismo estrangeiro e dos latifundiários», andaram pelo colaboracionismo, na «abertura...

O Chora

O ministro Manuel Pinho, após cornear, literalmente e de uma assentada, a Assembleia da República, o Governo a que pertencia, o cargo que ocupava e as regras básicas da civilidade, foi inevitavelmente despedido com os encómios da praxe – aqueles que, nos funerais, transformam qualquer morto num vivo acervo de virtudes.As...

Para onde sopram os ventos da crise capitalista?

A demissão do ministro da economia, na sequência da indigna reacção à crítica da bancada do PCP durante o debate sobre o estado da Nação, bem expressiva do nervosismo e desorientação que grassa na área governamental, é um facto político relevante.

«Obamismo», guerra e militarismo

As tropas de Obama iniciaram mais uma ofensiva militar no Afeganistão para tentar liquidar a resistência contra a ocupação estrangeira e se possível fazer alastrar o conflito ao Paquistão, um Estado possuidor de armas nucleares. A chamada «operação paz duradoura» que sustenta a agressão militar dos EUA e da NATO resulta...