O painel, de novo

Henrique Custódio
Em finais de Março demos aqui nota da visita oficial de José Sócrates e do seu ministro da Economia, Manuel Pinho, às instalações da Energie, na Póvoa do Varzim, com os dois governantes «apadrinhando explicitamente esta empresa como a escolhida para a produção de painéis necessários à captação de energia solar, essa nova cocqueluche do Governo Sócrates neste tempo de caça ao voto». Referíamos igualmente os protestos dos principais responsáveis pela investigação e indústria solar no País «que apontavam a Energie – sem tergiversações – como “uma empresa que assenta a sua propaganda num embuste”, ao fazer “publicidade enganosa” com a apresentação de “uma bomba de calor accionada a electricidade com apoio secundário em energia solar” como sendo um “painel térmico”».
Nada disto havia impedido o primeiro-ministro Sócrates de, pessoalmente, avalizar a escolha da empresa Energie para a produção de «painéis solares termodinâmicos» - segundo as sua próprias palavras - , apesar de os especialistas alertarem para o «embuste» que tal afirmação significava. Embuste igualmente apontado pela associação ambientalista Geota, que denunciava o sistema da Energie como um «frigorífico ao contrário», que «continua a ser alimentado por energia eléctrica e não solar».
Foi exactamente isso – o sistema Energie ser alimentado por energia eléctrica e não solar – que levou os organismos certificadores europeus a retirar à empresa da Póvoa de Varzim a «certificação solar» que lhe haviam concedido há menos de um mês, e na base da qual o Governo de Sócrates montara o seu espectáculo dos «painéis solares».
A argumentação dos certificadores é incisiva: os chamados painéis da Energie usam energia elećtrica não de forma subsidiária, mas como fonte principal (como denunciavam os especialistas portugueses), o que não acontece com os colectores solares térmicos. E as regras são claras: a energia solar beneficia de vários incentivos fiscais e financeiros, pela Europa fora, para incentivar a sua procura, porque ao ser produzida por uma bomba de calor classificada como solar térmica quase dispensa a energia eléctrica.
Ora o sistema Energie utiliza dez vezes mais electricidade para funcionar, o que faz com que a sua compra, no pressuposto de que é um «colector solar térmico» (como garantiu o próprio eng. Sócrates), fará a conta da electricidade aumentar, em vez de diminuir.
Daí o chumbo do sistema Energie, menos de um mês depois de ter sido certificado, o que deixa a empresa sem condições de aceder aos programas governamentais de apoio à instalação destes equipamentos - onde já tinha sido incluída.
Perante isto, o gabinete do ministro da Economia, Manuel Pinho, informou o Público (o jornal que tem acompanhado toda esta trapalhada) que «se receber informação oficial, a situação da Energie será reanalisada».
É pena que o Governo de José Sócrates não tivesse «reanalisado» a situação quando os especialistas da indústria solar também o informaram – e antecipadamente - das falhas desta empresa que desembocaram no seu previsível chumbo.
Desta embrulhada resultam dois mistérios: o de que terá levado o Governo Sócrates a privilegiar uma empresa inadequada para o seu «projecto solar» e o de quanto custará tudo isto ao País.


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