Fabricação

Vasco Cardoso
Muita tinta tem corrido a propósito da peregrina ideia da constituição de um «bloco central» no seguimento das próximas eleições legislativas. Tese que tem estado mais ou menos latente nos últimos meses e que foi trazida para o debate público por Cavaco Silva nas comemorações do 35.º aniversário do 25 de Abril e logo secundada por outros, desde o presidente da CIP até ao ex-Presidente da República Jorge Sampaio.
Apresentam-na ao País como se de uma novidade se tratasse e invocam para a sustentar o perigo da «instabilidade política» e das «condições de governabilidade» do próximo executivo para fazer face a uma «situação difícil».
Mais do que um recurso a que o capital terá sempre condições de recorrer para assegurar a continuidade de uma política favorável aos seus interesses de classe – possibilidade que, como é evidente, tem sempre o inconveniente de por a nu o facto de PS e PSD serem as duas faces da mesma moeda - o debate sobre esta questão cumpre naturalmente outros propósitos, seguramente mais imediatos:
Desde logo, a possibilidade que é dada a PS e a PSD para, quando questionados sobre este cenário, logo se demarcarem e cumprirem assim a rábula das grandes “divergências. Oculta que são precisamente estes os responsáveis – PS e PSD, sozinhos, em coligação ou acompanhados pelo CDS - que nos últimos trinta anos impuseram uma política contrária aos interesses dos trabalhadores, do Povo e que conduziram o país a esta situação. Serve para atrair para estes dois partidos o voto de muitos dos que se deixam condicionar pela ideia de que, perante a crise, não há alternativa à actual política de direita justificando a tese de que esta não é altura para grandes mudanças, para opções de ruptura como propõe o PCP. E por último, vai fazendo caminho (e «cabeças») para uma nova fase de sacrifícios a ser imposta logo após estas eleições, caso vejam alcançados os seus objectivos.
As operações e manobras que estão em curso para tentar condicionar a opção de voto de milhões de portugueses nas próximas batalhas eleitorais, estão longe de se esgotarem nesta fabricação. Como vimos nos últimos dias, desde as operações montadas contra o PCP, passando pelas mais impressionantes sondagens, e terminando nas constantes descriminações na comunicação social, tornam mais claro que o objectivo do capital de garantir a continuidade da política de direita é inseparável da tentativa de limitar o crescimento do PCP e da CDU. Mas não há nada, rigorosamente nada, que possa impedir que sejamos construtores do nosso próprio resultado.


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