Perfis do voluntariado
Num ponto estão de acordo patrões e trabalhadores: com o desenvolvimento da crise da economia mundial os dias que aí vêm serão de luta e cada vez mais sombrios. Preparam-se os trabalhadores e os seus sindicatos para os enfrentar. Alinham as suas forças patronato, governo e igreja para os aproveitar.
A Igreja Católica (já aqui ficou dito) domina em toda a sua extensão a chamada «sociedade civil». Duas mil e quinhentas associações regionais e nacionais - das IPSS aos Bancos Alimentares, da Cruz Vermelha às Mutualidades ou às Misericórdias - alinham-se estrategicamente na CNIS-Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade, pedra fundamental de todo o esquema de acção, presidido pelo Padre Lino Maia. Tal como este responsável reafirmou em recente congresso, a CNIS pratica o princípio da «subsidiariedade activa» que «muito para além das respostas tradicionais exige, por parte das Instituições, a procura de respostas abrangentes e globais e um funcionamento em rede e parcerias».
O outro eixo vital desta máquina gigantesca ainda se encontra em fase de instalação. A Comissão Instaladora, presidida por Eugénio da Fonseca, está a dar por findos os seus trabalhos e já marcou para Março próximo a realização do I Congresso que oficializará a Confederação Portuguesa do Voluntariado-CPV. Integram a comissão, além do CNIS, a Cruz Vermelha Portuguesa, o Instituto S. João de Deus, a Liga dos Bombeiros Portugueses, a Plataforma Saúde em Diálogo e a União das Misericórdias. Um grupo de élite que prepara uma «guerra-relâmpago».
Em entrevista dada ao jornal Solidariedade, órgão informativo do CNIS, Eugénio da Fonseca levantou a ponta do véu sobre os objectivos da nova organização: representar o voluntariado e defender os seus direitos; manter em funcionamento uma base de dados que permita saber permanentemente quantos voluntários existem e quem são; e alargar ao máximo os meios de intervenção do voluntariado na área social. A propósito de tudo isto faria Eugénio da Fonseca uma reveladora observação: «Há uma formação inicial que convém que seja mais homogénea para que o voluntário possa estar hoje numa organização, amanhã noutra» (o destaque é nosso mas as palavras são suas).
Registe-se finalmente a intimidade com o Poder que caracteriza a CNIS/CPV.
Cavaco Silva esteve presente e interveio no IV Congresso, Sócrates só lá não foi por motivos de agenda mas depois convidou para um almoço íntimo os corpos dirigentes da confederação, o ministro do Trabalho e da Solidariedade Social e mais três Secretários de Estado. Comeram e trabalharam no projecto comum das áreas que representam. O mesmo governo reuniu, dias depois, com o sector da Economia Social que inclui altos representantes do CNIS e assinou mais tarde 102 protocolos na área da Saúde com a Confederação e na presença de ministros, altos funcionários e de Sócrates. Foi então reconhecido que a Economia Social Solidária (católica) será preponderante nos 400 centros de formação para desempregados que o governo afirma ir activar a curto prazo. Para além de tudo isto não param de surgir em torrente as acções em comum igreja/poder. Mantendo-se, é claro, a ficção do «Estado laico». Aliás, no decorrer das intervenções do IV Congresso foi explicitamente declarado (Henrique Pinto/Cais): «Esta CNIS não se revê em lado nenhum, tem de ser notícia... Uma CNIS política que deve estar na vanguarda. A CNIS não pode ser carroça, mas estar na frente!»
Começam a definir-se claramente os contornos do papel que a economia social da igreja pretende desempenhar numa sociedade capitalista em crise profunda. Em parte, aceita ser extensão do Estado que é seu principal financiador. Mas continuará autónoma do Estado em tudo o resto, na definição de objectivos próprios, nas escolhas e alianças da sua acção política, na conquista de apoios financeiros privados ou no controlo e atribuição das tarefas que exige ao seu exército de voluntários da noite. Estes passam a ter um enquadramento severo em relação à Igreja mas serão anónimos na intervenção social. Tanto poderão funcionar numa empresa como saltar para outra área, pública ou privada. Disporão da agilidade que as «parcerias», formais ou informais, concedem ao parceiro mais forte. Terão autoridade e rios de dinheiro.
Bem se poderá afirmar que nos actuais dias de pobreza e de falência do sistema, em Portugal está em construção um estado confessional dentro e a partir do próprio Estado que se autodefine como garante da igualdade dos cidadãos perante a lei.
A Igreja Católica (já aqui ficou dito) domina em toda a sua extensão a chamada «sociedade civil». Duas mil e quinhentas associações regionais e nacionais - das IPSS aos Bancos Alimentares, da Cruz Vermelha às Mutualidades ou às Misericórdias - alinham-se estrategicamente na CNIS-Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade, pedra fundamental de todo o esquema de acção, presidido pelo Padre Lino Maia. Tal como este responsável reafirmou em recente congresso, a CNIS pratica o princípio da «subsidiariedade activa» que «muito para além das respostas tradicionais exige, por parte das Instituições, a procura de respostas abrangentes e globais e um funcionamento em rede e parcerias».
O outro eixo vital desta máquina gigantesca ainda se encontra em fase de instalação. A Comissão Instaladora, presidida por Eugénio da Fonseca, está a dar por findos os seus trabalhos e já marcou para Março próximo a realização do I Congresso que oficializará a Confederação Portuguesa do Voluntariado-CPV. Integram a comissão, além do CNIS, a Cruz Vermelha Portuguesa, o Instituto S. João de Deus, a Liga dos Bombeiros Portugueses, a Plataforma Saúde em Diálogo e a União das Misericórdias. Um grupo de élite que prepara uma «guerra-relâmpago».
Em entrevista dada ao jornal Solidariedade, órgão informativo do CNIS, Eugénio da Fonseca levantou a ponta do véu sobre os objectivos da nova organização: representar o voluntariado e defender os seus direitos; manter em funcionamento uma base de dados que permita saber permanentemente quantos voluntários existem e quem são; e alargar ao máximo os meios de intervenção do voluntariado na área social. A propósito de tudo isto faria Eugénio da Fonseca uma reveladora observação: «Há uma formação inicial que convém que seja mais homogénea para que o voluntário possa estar hoje numa organização, amanhã noutra» (o destaque é nosso mas as palavras são suas).
Registe-se finalmente a intimidade com o Poder que caracteriza a CNIS/CPV.
Cavaco Silva esteve presente e interveio no IV Congresso, Sócrates só lá não foi por motivos de agenda mas depois convidou para um almoço íntimo os corpos dirigentes da confederação, o ministro do Trabalho e da Solidariedade Social e mais três Secretários de Estado. Comeram e trabalharam no projecto comum das áreas que representam. O mesmo governo reuniu, dias depois, com o sector da Economia Social que inclui altos representantes do CNIS e assinou mais tarde 102 protocolos na área da Saúde com a Confederação e na presença de ministros, altos funcionários e de Sócrates. Foi então reconhecido que a Economia Social Solidária (católica) será preponderante nos 400 centros de formação para desempregados que o governo afirma ir activar a curto prazo. Para além de tudo isto não param de surgir em torrente as acções em comum igreja/poder. Mantendo-se, é claro, a ficção do «Estado laico». Aliás, no decorrer das intervenções do IV Congresso foi explicitamente declarado (Henrique Pinto/Cais): «Esta CNIS não se revê em lado nenhum, tem de ser notícia... Uma CNIS política que deve estar na vanguarda. A CNIS não pode ser carroça, mas estar na frente!»
Começam a definir-se claramente os contornos do papel que a economia social da igreja pretende desempenhar numa sociedade capitalista em crise profunda. Em parte, aceita ser extensão do Estado que é seu principal financiador. Mas continuará autónoma do Estado em tudo o resto, na definição de objectivos próprios, nas escolhas e alianças da sua acção política, na conquista de apoios financeiros privados ou no controlo e atribuição das tarefas que exige ao seu exército de voluntários da noite. Estes passam a ter um enquadramento severo em relação à Igreja mas serão anónimos na intervenção social. Tanto poderão funcionar numa empresa como saltar para outra área, pública ou privada. Disporão da agilidade que as «parcerias», formais ou informais, concedem ao parceiro mais forte. Terão autoridade e rios de dinheiro.
Bem se poderá afirmar que nos actuais dias de pobreza e de falência do sistema, em Portugal está em construção um estado confessional dentro e a partir do próprio Estado que se autodefine como garante da igualdade dos cidadãos perante a lei.