A situação económica e os grupos monopolistas

Agostinho Lopes (Membro da Comissão Política)
A situação em que nos encontramos, a situação a que chegámos, 50 mil milhões de fundos comunitários e 33 mil milhões de receitas de privatizações depois, é o resultado de 32 anos de políticas de direita. Responsabilidade de anteriores governos. Responsabilidade do actual Governo PS/Sócrates, que não só as continuou como extremou o sentido neoliberal dessas políticas.
Contrariamente ao que afirma, procurando desresponsabilizar-se, o actual agravamento é anterior ao detonar da crise financeira internacional. Sem subestimar os seus impactos, o que a crise põe a nu são as profundas fragilidades e dependências do País, que o tornaram extremamente vulnerável.
Não, a crise já estava cá dentro. Em potência e em desenvolvimento. Semeada e fertilizada pelas políticas do Governo.
O endividamento das famílias, das empresas e do País não começou agora, já era. Entre 2004 e 2007, subiu a dívida das famílias, a dívida das empresas não financeiras e o endividamento externo líquido. Este, camaradas, é o nosso verdadeiro e mais grave défice, que alguns só agora descobriram. Com a agravante de termos simultaneamente uma elevada Dívida Pública, 64%. Dívidas que continuaram a crescer em 2008!
A brutalidade da taxa de desemprego já cá estava e o PIB não parou de crescer em Setembro de 2008. O crescimento económico em Portugal no período 2005/2008 foi sempre anémico e menos de metade da União Europeia. E em 2009 teremos recessão! O défice da Balança Corrente não vai chegar a 11% do PIB em 2008 de repente! Nunca entre 2005 e 2007 saiu do intervalo 9,5%-10%! As desigualdades sociais e assimetrias regionais não surgiram em 2008.
Porque é que isto acontece durante a governação PS/Sócrates? O Governo não explica! Arranja um bode expiatório: a crise financeira internacional. Assim absolve as suas políticas. E pelo caminho iliba o sistema financeiro!
A política neoliberal, responsável pelo brutal agravamento da vulnerabilidade do País face à crise, teve a obsessão pelo défice no centro da sua política. Exclamam: «pusemos as contas públicas em ordem»;«a crise orçamental ficou para trás». Salazar também dizia o mesmo e fez de Portugal o País mais atrasado da Europa.
Mas recentes previsões mostram, que mesmo a dita consolidação orçamental tem pés de barro.
Não somos pelo desregramento das contas públicas. Mas de facto, só um crescimento económico sólido, sustentado e amplo pode responder de forma consolidada e durável aos desequilíbrios das contas públicas do Estado Português.

Ditadura dos grupos económicos

Como resultado da recomposição do capitalismo monopolista levada a cabo por sucessivos governos desde 1976 a sociedade portuguesa tem hoje uma estrutura e uma dinâmica económico-social determinada pela ditadura dos grupos económicos monopolistas, articulados com o capital transnacional. Uma poderosa oligarquia financeira, associada a outros sectores da grande burguesia portuguesa e estrangeira, que assegura, através da titularidade desses grupos a continuidade, reprodução e expansão do seu poder político, económico, social e ideológico.
Os principais problemas da difícil situação económica do País estão na apropriação da riqueza produzida em cada ano pelos grupos monopolistas. O País não tem apenas um grave problema na forma como produz. Tem um problema maior na forma como essa riqueza é distribuída. Problema este que acaba por determinar decisivamente os atrasos, as ineficiências, os défices da forma de produzir e consumir.
Distribuição desigual da riqueza produzida, feita a favor dos grupos monopolistas, pelos mecanismos do sistema capitalista, com a forte intervenção e ajuda do Estado.
A predação do trabalho. Pelas políticas de contenção salarial, de desvalorização do trabalho. Por uma regulação do mercado da força de trabalho favorável ao capital, ver Código(s) do Trabalho. Pelo desemprego e precariedade. Pela política orçamental. Por uma taxa de inflação sistematicamente subestimada e estruturalmente subavaliada. Pela política fiscal. Pelas deslocalizações. Com a contenção salarial, o capital apropria-se dos progressos de produtividade e enfraquece a capacidade de consumo e direitos sociais dos trabalhadores. Contenção salarial que está no centro da actual crise, ao substituir rendimentos do trabalho por crédito, criando um pantanoso mercado interno e uma insustentável situação económica para as famílias.
A predação das pequenas empresas e dos sectores produtivos. Pelo açambarcamento dos mercados e pelas imposições de preços e condições leoninas, pelos grupos monopolistas que hoje dominam a banca e os seguros, a grande distribuição, a energia, as telecomunicações, as auto-estradas ou os mercados dos produtos alimentares.
À predação pela Banca das famílias e das empresas não financeiras, e dos sectores produtivos, com comissões e especulativas taxas de juro, juntou-se a gula de grandes ex-empresas públicas fornecedoras de bens e serviços essenciais. Esta predação é feita, com a bênção das ditas entidades reguladoras (AdC, BdP, CMVM, ERSE, ANACOM, etc), através das tarifas da EDP, dos preços dos combustíveis, das portagens da BRISA e AENOR, dos preços dos cimentos ou das imposições das Celuloses (Portucel e Altri) ou da grande distribuição aos seus fornecedores, das imposições das companhias de seguros às oficinas de automóvel e rebocadores, etc, etc.
O contraponto para o elevado endividamento das famílias e pequenas empresas, por insuficiência de salários de uns e magros lucros ou resultados negativos de outros, são os lucros obscenos dos Grupos Económicos.

Uma nova política

Nas causas dos problemas económicos e sociais estão os constrangimentos e imposições da integração comunitária, federal e neoliberal. A que deverá acrescentar-se a acentuada dependência estrutural externa e a vulnerabilidade da economia face a centros de decisão estrangeiros/capital transnacional. Uma significativa subcontratação e um terço da estrutura accionista das principais empresas detida por capital estrangeiro. Que além do mais transfere lucros para o exterior, baixando de forma relevante o rendimento nacional disponível.
Os que hoje enfatizam a importância do euro na resistência do País à crise não estão apenas a falar cedo demais. Deveriam explicar que sustentabilidade e acréscimos de produtividade e competitividade trouxe o euro à economia portuguesa. Ou pelo menos interrogar-se sobre como vai o País pagar a sua gigantesca dívida externa. Porque se há coisa segura e certa, é que os credores, mais tarde ou mais cedo, vão cobrá-la!
Se há questão clara para o PCP, é que não há solução para os problemas do povo e do País que não passe pela ruptura com a política de direita. A ruptura com o domínio do capital monopolista. A ruptura com a «obsessão» pelo défice orçamental. A ruptura com a desvalorização do trabalho e a mutilação e subversão das políticas sociais. A ruptura com a atribuição de um lugar estratégico ao capital estrangeiro e com a desvalorização e desprotecção do mercado interno. A ruptura com o processo de integração capitalista europeia e a subordinação do nosso território e nosso mar a lógicas alheias ao interesse do País. A ruptura com a violação e subversão da Constituição da República Portuguesa.
Como concluímos na nossa Conferência, são elementos centrais da nova política económica e social a soberania nacional, a luta pela construção de outra Europa, a propriedade social e o papel do Estado e a planificação do desenvolvimento, a significativa melhoria dos salários e vencimentos e o respeito pelos direitos dos trabalhadores, o desenvolvimento das actividades produtivas, a defesa do mercado nacional, a dinamização do investimento e o apoio às MPME, a realização nas actuais condições, de uma reforma agrária nos campos do Sul e a racionalização fundiária pelo livre associativismo no Norte e Centro, a reforma da política fiscal, o ordenamento do território e a criação das Regiões Administrativas, o Estado como promotor do desenvolvimento social.
A crise e o combate ao capitalismo, tornam indispensável a articulação entre a luta diária por objectivos concretos e imediatos, a ruptura com a política de direita, a exigência de uma alternativa de esquerda e a concretização do objectivo de uma nova sociedade.
Porque existe uma alternativa real ao sistema capitalista. O socialismo. Colocado pela história, é uma tarefa do nosso tempo. O Partido Comunista Português é portador dessa alternativa de fundo às crises e à crise do capitalismo.


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