Lucros em tempo de crise
Depois de semanas inundadas com notícias de fazer chorar as calçadas sobre as terríveis «perdas» que a crise estaria a provocar nos lucros dos grandes grupos económicos, os resultados financeiros dos quatro principais bancos, no primeiro semestre do ano, vieram desfazer dúvidas. Repousem pois os que por razões de filantropia se preparavam já para alguma acção mais benemérita em socorro deste novo contingente de depauperados e suspirem de alivio os que, por bom coração, se consumiam com as dilacerantes perdas que corroíam o futuro de Belmiro e seus pares. Pelos intervalos da crise a banca, na pessoa das quatro mais importantes instituições financeiras privadas, arrecadou quase seiscentos milhões de euros de lucros. Coisa pouca, a julgar pela insatisfação dos respectivos titulares e de uns quantos comentadores apostados em fazer crescer a ideia de que isto da crise, é assim como o sol, quando nasce seria para todos. Ideia com que julgariam poder minorar a indignação dos que, depositários líquidos de todos os sacrifícios, injustiças e exploração, assim veriam as suas razões de protesto diminuídas em face das dificuldades gerais que a crise transportaria consigo. E sobretudo semear um campo de conformismo e de aceitação de algumas outras decisões que Governo e grande patronato preparam para garantir as exigidas margens de lucro que o capital reclama. A recente noticia sobre a possibilidade de pagamento do salário, ou parte dele, em espécie por decisão unilateral da entidade empregadora que a recente proposta de revisão do Código do Trabalho acolhe, lá introduzida pela mão do Governo do PS e silenciosamente aceite pela central sindical ao seu serviço (a UGT) seria, a não ser derrotada, como o código que a acolhe, uma nova mão estendida em direcção ao capital e às margens de lucro que à força querem ver realizados. Mesmo em tempos de crise.