Um país destroçado que vai por maus caminhos
A memória colectiva tem de ser despertada. Não são dificuldades pontuais que agora desabam sobre os assalariados, a classe média e o povo português em geral. É, primeiro que tudo, o desabar de um grosseiro mito erguido sobre a utopia da «sociedade de sucesso» e da «renúncia à luta de classes». Portugal atravessa uma fase que recorda o velho pensamento «depois de nós, o Dilúvio».
As consequências das teses neocapitalistas impostas em regime democrático, controladas pelas grandes fortunas, são agora evidentes com uma inflação incontrolável, especulação financeira e quebra do produto nacional, preços cada vez mais altos dos bens essenciais, desemprego, degradação dos níveis de saúde, de segurança social, de ensino, etc.. O discurso dos ministros deixou de referir a «sociedade capitalista da abundância». Aceleradamente, tentam regressar à velha e putrefacta proposta de «salvação nacional», tão ao gosto da época fascista. O dinheiro só a alguns pertence. Mas os necessários sacrifícios devem ser pagos, no «altar da Nação», pelos trabalhadores e pelo povo humilde.
Agora, multiplicam-se as provas de que vivemos sob a ditadura dos mais ricos.
Desde a aprovação da anteproposta do novo «Código do Trabalho» – «atamancada» ao longo de 37 horas de sessões parlamentares – aos «desabafos» tardios do Fundo Monetário Internacional fundamentalista, sem dúvida um dos principais responsáveis, primeiro pela fulminante ascensão do neocapitalismo, depois pelo seu rápido desmoronar.
Neste sentido, o FMI acaba de chegar a uma conclusão evidente para o cidadão comum: Portugal está a viver acima das suas possibilidades. Uma verdade de La Palisse que os especialistas capitalistas se «esquecem» de generalizar a muitos outras sociedades de regime monetário e neoliberal. Tal como passam por cima das suas próprias responsabilidades de financiadores da obra de destruição da economia e da natureza social colectiva do Estado português. De uma penada, o FMI transforma-se a si próprio em entidade moralizadora, a exemplo do que, por outro lado, a Igreja Católica sempre tem tentado fazer.
Posições coincidentes
«Preocupado» com os cidadãos portugueses mais desfavorecidos, o FMI declara numa recente tomada de posição, dirigindo-se ao Estado português: «É preciso ter o cuidado (o Estado) em manter sob controlo o crescimento dos salários dos funcionários públicos (...) que continue a pedir mais e melhor avaliação e controlo na transparência das contas das empresas públicas e (...) cultive maior ambição no pagamento, a tempo e horas, das suas próprias dívidas». Um cego pede a outro cego que «veja» bem, ainda que sob condição de continuar a fazer sempre mais do mesmo! O que é preciso é ganhar tempo. Exactamente tal como o Banco de Portugal opta pela Ética de cátedra ou a Igreja católica recorre, nas crises, às «opções piedosas» que oferecem a vantagem de manter o sigilo sobre os patrimónios secretos, de reforçar as posições do clero como aliados preferenciais da alta finança e de consolidar, entre o povo, a imagem virtual da «benemerência cristã». Sempre assim foi, desde os tempos da Acção Católica à actual Cruzada da Sociedade Civil. Nas fases de maior força do regime, a Igreja colabora com o Estado. Quando vem a crise, refugia-se na mística cristã. Mas cedo a esquece, quando isso convém aos seus próprios interesses. Neste sentido, despertam a curiosidade dois exemplos recentes.
No primeiro caso, subsiste a «paciência cristã» do episcopado face à revisão final da Concordata. «Não temos pressa», declarou em nome da Igreja D. Jorge Ortiga. E prosseguiu: «Esse acordo obriga a uma regulamentação nova em relação a vários sectores da sociedade...». Ou seja, um milagre mais: a Concordata de 1940 virá a ser a mãe de muitas concordatas, graças às «regulamentações». Então, voltaremos então atrás, quando o poder do Estado se fundia com o poder da Igreja.
O segundo caso que é actualmente notícia prende-se com o povo cigano. Esta minoria étnica, tão ferozmente perseguida pelas inquisições católicas do passado e pelos regimes nazis-fascistas, volta a estar na mira do poder. Redescobre-se que o cigano corrói a sociedade, vive do crime organizado e não paga a quem deve. É certo que já se diz à boca pequena que o problema não é esse e o que está em causa antes será a localização de alguns «bairros sociais» cujos terrenos dariam bons lucros se fossem vendidos aos grandes empórios europeus da construção civil de luxo... Assunto que os desenvolvimentos futuros certamente esclarecerão.
O que espanta em tudo isto é a passividade da igreja. Então, o Patriarcado não dirige a Pastoral dos Ciganos? Não conhece o mundo dos negócios e a vergonhosa tradição de exclusão e sofrimento das minorias que a igreja diz defender? Como justificar o seu silêncio, só indirectamente quebrado pela encenação de um caricato «cortejo da Paz» ou pela intromissão da Escola (católica, da sociedade civil) na área de competências do Poder Local?
A Democracia Portuguesa está, de facto, gravemente doente.
As consequências das teses neocapitalistas impostas em regime democrático, controladas pelas grandes fortunas, são agora evidentes com uma inflação incontrolável, especulação financeira e quebra do produto nacional, preços cada vez mais altos dos bens essenciais, desemprego, degradação dos níveis de saúde, de segurança social, de ensino, etc.. O discurso dos ministros deixou de referir a «sociedade capitalista da abundância». Aceleradamente, tentam regressar à velha e putrefacta proposta de «salvação nacional», tão ao gosto da época fascista. O dinheiro só a alguns pertence. Mas os necessários sacrifícios devem ser pagos, no «altar da Nação», pelos trabalhadores e pelo povo humilde.
Agora, multiplicam-se as provas de que vivemos sob a ditadura dos mais ricos.
Desde a aprovação da anteproposta do novo «Código do Trabalho» – «atamancada» ao longo de 37 horas de sessões parlamentares – aos «desabafos» tardios do Fundo Monetário Internacional fundamentalista, sem dúvida um dos principais responsáveis, primeiro pela fulminante ascensão do neocapitalismo, depois pelo seu rápido desmoronar.
Neste sentido, o FMI acaba de chegar a uma conclusão evidente para o cidadão comum: Portugal está a viver acima das suas possibilidades. Uma verdade de La Palisse que os especialistas capitalistas se «esquecem» de generalizar a muitos outras sociedades de regime monetário e neoliberal. Tal como passam por cima das suas próprias responsabilidades de financiadores da obra de destruição da economia e da natureza social colectiva do Estado português. De uma penada, o FMI transforma-se a si próprio em entidade moralizadora, a exemplo do que, por outro lado, a Igreja Católica sempre tem tentado fazer.
Posições coincidentes
«Preocupado» com os cidadãos portugueses mais desfavorecidos, o FMI declara numa recente tomada de posição, dirigindo-se ao Estado português: «É preciso ter o cuidado (o Estado) em manter sob controlo o crescimento dos salários dos funcionários públicos (...) que continue a pedir mais e melhor avaliação e controlo na transparência das contas das empresas públicas e (...) cultive maior ambição no pagamento, a tempo e horas, das suas próprias dívidas». Um cego pede a outro cego que «veja» bem, ainda que sob condição de continuar a fazer sempre mais do mesmo! O que é preciso é ganhar tempo. Exactamente tal como o Banco de Portugal opta pela Ética de cátedra ou a Igreja católica recorre, nas crises, às «opções piedosas» que oferecem a vantagem de manter o sigilo sobre os patrimónios secretos, de reforçar as posições do clero como aliados preferenciais da alta finança e de consolidar, entre o povo, a imagem virtual da «benemerência cristã». Sempre assim foi, desde os tempos da Acção Católica à actual Cruzada da Sociedade Civil. Nas fases de maior força do regime, a Igreja colabora com o Estado. Quando vem a crise, refugia-se na mística cristã. Mas cedo a esquece, quando isso convém aos seus próprios interesses. Neste sentido, despertam a curiosidade dois exemplos recentes.
No primeiro caso, subsiste a «paciência cristã» do episcopado face à revisão final da Concordata. «Não temos pressa», declarou em nome da Igreja D. Jorge Ortiga. E prosseguiu: «Esse acordo obriga a uma regulamentação nova em relação a vários sectores da sociedade...». Ou seja, um milagre mais: a Concordata de 1940 virá a ser a mãe de muitas concordatas, graças às «regulamentações». Então, voltaremos então atrás, quando o poder do Estado se fundia com o poder da Igreja.
O segundo caso que é actualmente notícia prende-se com o povo cigano. Esta minoria étnica, tão ferozmente perseguida pelas inquisições católicas do passado e pelos regimes nazis-fascistas, volta a estar na mira do poder. Redescobre-se que o cigano corrói a sociedade, vive do crime organizado e não paga a quem deve. É certo que já se diz à boca pequena que o problema não é esse e o que está em causa antes será a localização de alguns «bairros sociais» cujos terrenos dariam bons lucros se fossem vendidos aos grandes empórios europeus da construção civil de luxo... Assunto que os desenvolvimentos futuros certamente esclarecerão.
O que espanta em tudo isto é a passividade da igreja. Então, o Patriarcado não dirige a Pastoral dos Ciganos? Não conhece o mundo dos negócios e a vergonhosa tradição de exclusão e sofrimento das minorias que a igreja diz defender? Como justificar o seu silêncio, só indirectamente quebrado pela encenação de um caricato «cortejo da Paz» ou pela intromissão da Escola (católica, da sociedade civil) na área de competências do Poder Local?
A Democracia Portuguesa está, de facto, gravemente doente.