A redução do défice

Os maus resultados do «bom aluno» (1)

Eugénio Rosa
O Governo de Sócrates acabou de anunciar com pompa e circunstância a redução do défice orçamental de 2006, não para 4,6% do PIB como exigia a Comissão Europeia, mas sim para 3,9% para ser considerado «bom aluno», procurando apresentar tal redução como um grande feito e como também fosse um grande objectivo nacional.
Para convencer a opinião pública disso, imediatamente certa comunicação social solícita ao poder político foi ouvir a opinião daqueles a que Sócrates chama «economistas objectivos», por estarem sempre de acordo no essencial com a sua política (Silva Lopes, Augusto Mateus, Manuel Ferreira Leite, etc.), que disseram que o Governo estava no bom caminho, e que era preciso continuar.
Interessa, por isso, analisar alguns aspectos importantes da situação actual normalmente esquecidos pelos «economistas objectivos» de que Sócrates tanto gosta assim como o preço que os portugueses estão a pagar por uma política centrada no crescente domínio dos grandes grupos económicos estrangeiros e na redução abrupta do défice orçamental num momento em que o País se encontra mergulhado numa profunda e prolongada crise económica e social.
Uma parte cada vez maior dos activos (património) existentes em Portugal pertencem a grandes grupos económicos estrangeiros. Um exemplo paradigmático é o caso da PT em que já 74% do seu capital pertence a grupos económicos estrangeiros. O mesmo sucede em relação a quase todas as grandes empresas que foram privatizadas pelos governos do PS e do PSD/CDS. Como consequência, uma parcela crescente da riqueza criada todos os anos no nosso País é já transferida para o estrangeiro como mostram dados do INE (Quadro I da versão impressa do “Avante!”)
Como se sabe, o PIB corresponde ao valor da riqueza criada anualmente num país. O RNB (Rendimento Nacional Bruto) corresponde ao valor que fica no país, que se obtém adicionando ao PIB os rendimentos primários recebidos do resto do mundo e subtraindo os pagos ao resto do mundo.
Como mostram os dados publicados pelo INE, a parcela líquida que é transferida para o estrangeiro (diferença entre o PIB e o RNB) é cada vez maior. Entre 2002 e 2006, aumentou 70,5%, pois passou de 3.622,4 milhões de euros para 6.177,5 milhões de euros. Mas foi nos dois anos de Governo Sócrates que o crescimento foi maior, já que mais que duplicou (cresceu 113,4%), pois passou de 2.894,3 milhões de euros para 6.177,5 milhões de euros, uma vez que durante o Governo do PSD/CDS tinha diminuído em -20,1%, passando de 3.622,4 milhões de euros para 2.894,3 milhões de euros.
Estes dados do INE revelam também um crescente domínio da economia e da sociedade portuguesa pelos grandes grupos económicos estrangeiros. A confirmá-lo está o facto de que, segundo o gestor do Programa PRIME, se se retirar as entidades e as empresas ainda públicas, em 2006 mais de metade das empresas apoiadas por aquele programa – o mais importante cofinanciado pela U.E. que tem como objectivo a modernização da economia portuguesa –, foram empresas estrangeiras.
Para que se possa ficar com uma ideia da dimensão do problema interessa dizer que, de acordo com os dados do INE, os pagamentos de Portugal ao resto do mundo, ou seja, o valor da riqueza produzida em Portugal mas transferida para o estrangeiro, atingiu, em 2006, 17.590,2 milhões de euros, o que corresponde já a 11,5% do PIB desse ano. Mas o gráfico em anexo, construído com dados do INE, dá uma ideia clara da gravidade da evolução verificada neste campo, nomeadamente com o Governo de Sócrates.

Riqueza por habitante é cada vez menor

Como consequência da transferência de uma parte crescente da riqueza produzida em Portugal para o estrangeiro, a parcela que fica no nosso País, para os portugueses, é cada vez menor. Esta situação é ainda mais grave se se tiver presente que Portugal é o país da UE onde a repartição da riqueza é mais desigual, já que os 20% da população mais ricos recebem 8,2 vezes mais do que os 20% menos ricos, enquanto a média na União Europeia é 4,8 vezes, ou seja, quase metade.
Outros dados do INE (Quadro II da versão impressa do «Avante!») mostram da redução da riqueza se a calcularmos por habitante.
Os dados desse quadro estão a preços constantes de 2000 para anular o efeito da inflação. E eles mostram que, entre 2002 e 2006, o PIB por habitante, isto é, a riqueza criada no País, aumentou apenas 0,2%, mas o RNB por habitante, ou seja, a riqueza que ficou no País, diminuiu em -1,1%. Mas foi durante os dois anos de Governo de Sócrates que a diminuição foi maior pois o RNB por habitante diminuiu em -1%. Estes dados do INE confirmam que a clara diminuição, em termos reais, da riqueza criada por habitante que fica no País.


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