A conquista do Centro burguês
Depois das gigantescas movimentações populares em que a CGTP foi pólo de mobilização contra as políticas do actual Governo; após as enormes manifestações locais contra o encerramento de escolas e serviços de urgência e a seguir ao falhanço do Não no referendo à despenalização da IVG, as forças da direita sentem-se em situação de risco. É preciso maquilhar a imagem de brutalidade que o poder do dinheiro comunica às massas. Reconquistar o centro burguês alarmado com as devastações arrasadoras do grande capital e com as imposições ditatoriais do Governo. Ressuscitar a esquecida doutrina social da Igreja, sobretudo no capítulo das formas de negação da luta de classes como motor da História. Numa palavra, dar corpo a uma nova evangelização da classe média portuguesa. É a este novo passo que iremos assistir. Se a actual Igreja portuguesa tiver capacidades para tanto, caber-lhe-á neste esquema de reaproximação, branquear a imagem das políticas capitalistas e apaziguar os levantamentos que se esboçam na área social. Reforçar a ideia de Reconciliação. A Pastoral Social - tem recordado a hierarquia católica - consiste «em encaixar-se na vida, alegrar-se com os que se alegram, chorar com os que choram, fazer-se judeu com os judeus». Mantendo, como é sua tradição, os grandes objectivos de maior riqueza e de mais poder para a Igreja.
A Terceira Via
Depois dos desaires da direita, logo se começou a notar uma tentativa generalizada das forças mais ligadas ao capital financeiro no sentido de atenuarem a imagem cuja sombra estavam a projectar sobre a sua própria e principal base de apoio, a classe média. De repente, o PPD lembrou-se que era social-democrata, o CDS declarou que«“a virtude está no centro do rio» e as centrais patronais garantiram que flexibilização dos despedimentos «só à portugues»”, com o exercício da Caridade.
A Igreja católica não foi excepção. Também ela apela a um «Centr» que representa, afinal, um refúgio para os derrotados e inseguros na fé. Não é tempo para recordar os gloriosos dias passados.
A dominante veio, como seria de esperar, do próprio cardeal-patriarca. Raramente se terá visto (ou nunca aconteceu) um cardeal acusar de radicalismo bispos de direita da hierarquia portuguesa. A imagem do tiro no pé para caracterizar as posições de colegas seus do colégio episcopal é de completo desnorte. D. José constata que Portugal, a Nação fidelíssima, «já não é o que era...o referendo fez-me reflectir na fragilidade da nossa catequese... está tudo em causa... há muito individualismo... as nossas catequeses cumprem ritos mas não fidelizam cristãos». Os bispos alarmam-se e alarmam.
Procurar reforçar os apoios da classe média e da juventude organizada ao «Centro» parece ser agora o único recurso disponível. Através da voz dos seus intelectuais, a Igreja está agora a ensaiar a defesa de uma terceira via que faça esquecer os disparates da sua distinção teológica entre capitalismo bom e um outro selvagem. É uma mudança estratégica necessária. Mas nota-se que nem mesmo neste assunto tão urgente há unidade entre os bispos. Por exemplo, à pergunta se a Igreja aceita, ou não, as políticas sociais do actual Governo, D. José respondeu como os bons jesuítas: «A Igreja lida com pessoas. E é sempre uma rectaguarda. As pessoas que sofrem com todas estas mudança são nossos clientes, passe a expressão. Pessoas que temos de apoiar. Mas não temos posição sobre as políticas ou as reformas». Resposta ambígua, um «pau de dois bicos» já característico de um «Centro» acizentado.
Mais claro ainda é o texto (notável) do padre e professor de filosofia dr. Anselmo Borges, sob o título «A religião de mercado: Deus e Mamona». Em síntese, refere que a religião, tal como é entendida no mundo cristão, surgiu nos anos 80, por oposição ao socialismo e à teologia da libertação. Apresenta o capitalismo como o sistema mais humano, racional e justo. O mercado é como um Deus. Se causa sofrimento e morte para alguns, é a chave da solução dos problemas e da felicidade. O mercado assume-se pois como uma nova teologia. O seu dogma básico é o do poder do dinheiro que anuncia aos pobres o evangelho da felicidade. Os bancos são os seus templos.
Sugere o autor uma equitativa distribuição social da riqueza. Fala na Bíblia e socorre-se do exemplo de Zaqueu, chefe dos odiados cobradores de impostos, convertido ao cristianismo. «Não se diz que Zaqueu renunciou ao seu dinheiro ou ao seu ofício. Mas a salvação entrou em sua casa porque decidiu dar metade dos seus bens aos pobres e compensar generosamente as injustiças cometidas .»
Vai ser esta a próxima tónica geral das intervenções da Igreja. Sem mudança do rumo principal.
A Terceira Via
Depois dos desaires da direita, logo se começou a notar uma tentativa generalizada das forças mais ligadas ao capital financeiro no sentido de atenuarem a imagem cuja sombra estavam a projectar sobre a sua própria e principal base de apoio, a classe média. De repente, o PPD lembrou-se que era social-democrata, o CDS declarou que«“a virtude está no centro do rio» e as centrais patronais garantiram que flexibilização dos despedimentos «só à portugues»”, com o exercício da Caridade.
A Igreja católica não foi excepção. Também ela apela a um «Centr» que representa, afinal, um refúgio para os derrotados e inseguros na fé. Não é tempo para recordar os gloriosos dias passados.
A dominante veio, como seria de esperar, do próprio cardeal-patriarca. Raramente se terá visto (ou nunca aconteceu) um cardeal acusar de radicalismo bispos de direita da hierarquia portuguesa. A imagem do tiro no pé para caracterizar as posições de colegas seus do colégio episcopal é de completo desnorte. D. José constata que Portugal, a Nação fidelíssima, «já não é o que era...o referendo fez-me reflectir na fragilidade da nossa catequese... está tudo em causa... há muito individualismo... as nossas catequeses cumprem ritos mas não fidelizam cristãos». Os bispos alarmam-se e alarmam.
Procurar reforçar os apoios da classe média e da juventude organizada ao «Centro» parece ser agora o único recurso disponível. Através da voz dos seus intelectuais, a Igreja está agora a ensaiar a defesa de uma terceira via que faça esquecer os disparates da sua distinção teológica entre capitalismo bom e um outro selvagem. É uma mudança estratégica necessária. Mas nota-se que nem mesmo neste assunto tão urgente há unidade entre os bispos. Por exemplo, à pergunta se a Igreja aceita, ou não, as políticas sociais do actual Governo, D. José respondeu como os bons jesuítas: «A Igreja lida com pessoas. E é sempre uma rectaguarda. As pessoas que sofrem com todas estas mudança são nossos clientes, passe a expressão. Pessoas que temos de apoiar. Mas não temos posição sobre as políticas ou as reformas». Resposta ambígua, um «pau de dois bicos» já característico de um «Centro» acizentado.
Mais claro ainda é o texto (notável) do padre e professor de filosofia dr. Anselmo Borges, sob o título «A religião de mercado: Deus e Mamona». Em síntese, refere que a religião, tal como é entendida no mundo cristão, surgiu nos anos 80, por oposição ao socialismo e à teologia da libertação. Apresenta o capitalismo como o sistema mais humano, racional e justo. O mercado é como um Deus. Se causa sofrimento e morte para alguns, é a chave da solução dos problemas e da felicidade. O mercado assume-se pois como uma nova teologia. O seu dogma básico é o do poder do dinheiro que anuncia aos pobres o evangelho da felicidade. Os bancos são os seus templos.
Sugere o autor uma equitativa distribuição social da riqueza. Fala na Bíblia e socorre-se do exemplo de Zaqueu, chefe dos odiados cobradores de impostos, convertido ao cristianismo. «Não se diz que Zaqueu renunciou ao seu dinheiro ou ao seu ofício. Mas a salvação entrou em sua casa porque decidiu dar metade dos seus bens aos pobres e compensar generosamente as injustiças cometidas .»
Vai ser esta a próxima tónica geral das intervenções da Igreja. Sem mudança do rumo principal.