Compromisso político com a cultura
Suplemento «No centenário do nascimento de Fernando Lopes-Graça»
Confesso-lhe com toda a sinceridade que prefiro, do ponto de vista de comunicação artística, deslocar-me com o Coro da Academia de Amadores de Música à mais esquecida vila alentejana ou beirã, ou à mais popular (e não alienada) colectividade filarmónica da Outra Banda, a receber os aplausos medidos e convencionais que na generalidade se dignam dispensar à minha música os frequentadores habituais das salas de concerto da capitalEm 1950, o então denominado Coro do Grupo Dramático Lisbonense, fundado por Lopes-Graça com estreita ligação ao MUD, dá lugar ao Coro da Academia de Amadores de Música, projecto que desde o início assumiu um compromisso político com a cultura, a liberdade, a democracia e a expressão artística independente. Não raras vezes, as sessões públicas que realizava incluíam declamação de poesia e teatro amador, actividades dinamizadas por Manuela Porto em conjunto com Lopes-Graça.
In Manuel Augusto Araújo, Caderno Vermelho n.º 14, Setembro de 2006
Impedido pelo fascismo de interpretar as Canções Heróicas nas muitas actuações pelo país, o Coro passa a ser veículo de divulgação da música regional e tradicional portuguesa, granjeando enorme aceitação entre as populações rurais e urbanas, quebrando barreiras geracionais e aproximando as pessoas no que de comum lhes dizia respeito.
Em 1954, um despacho ministerial afasta Lopes-Graça do Coro e impede a actividade pedagógica e musical do maestro na Academia de Amadores de Música.
Lopes-Graça regressaria em 1972 à instituição, muito embora se possa dizer que nem o fascismo conseguiu interromper por decreto a colaboração entre o compositor e o grupo por si criado. Exemplo disso é a edição continua da revista «Gazeta Musical» e do «Dicionário de Música», da responsabilidade de Lopes-Graça.
Até ao 25 de Abril de 1974, o Coro edita discos contendo essencialmente canções tradicionais, mas a revolução trouxe as Heróicas à luz do dia e muitas outras composições de Lopes-Graça ao Coro, fazendo-o percorrer de novo Portugal de lés-a-lés em contacto com milhares de pessoas.
Quando em 1994 desaparece o maestro Lopes-Graça, a assembleia-geral da Academia de Amadores de Música delibera, por unanimidade, que o Coro se passe a chamar Coro Lopes-Graça da Academia de Amadores de Música.
Actualmente, a direcção musical do Coro Lopes-Graça está entregue ao maestro José Robert, mantendo-se fiel à defesa das causas da justiça, da paz e da fraternidade.