abusos e violação de direitos laborais
Ilegalidades nas barbas do Governo
Avolumam-se os motivos de preocupação sobre a realidade laboral no nosso País. Nas empresas e locais de trabalho, crescendo como cogumelos, somam-se os casos de precariedade, trabalho ilegal e violação dos direitos dos trabalhadores.
Há uma vaga de precarização das relações laborais
Um quadro pormenorizado da situação foi dado a conhecer na passada semana, no Parlamento, em interpelação ao Governo suscitada pelo Grupo Parlamentar do PCP. Com as questões do emprego chamadas para primeiro plano, provado foi pelos deputados comunistas que também neste capítulo os problemas existentes são o resultado de uma política neoliberal que perpetua o atraso do País, desperdiça as suas potencialidades, provoca desemprego e precarização, mutila e destrói as funções sociais do Estado.
Capitalismo à mesa
Foi uma descrição detalhada e rigorosa a que os deputados comunistas traçaram ao longo do debate, funcionando como autêntico libelo acusatório contra esta política do Executivo PS que, cedendo às exigências e chantagens do capitalismo, promove a precariedade como factor quase absoluto a erigir nas relações laborais. «O capitalismo sentou-se à mesa do Estado», acusou a deputada comunista Odete Santos, sintetizando um aspecto chave que explica muitas das opções e prioridades assumidas pela governação.
Os dados referidos pelo deputado Francisco Lopes, na sua intervenção inicial em nome da bancada comunista, não deixam margem para dúvidas: mais de 750 mil trabalhadores tinham no último trimestre de 2005 contratos não permanentes, equivalendo a 19,7 por cento dos contratos, taxa que se situa entre as mais elevadas da União Europeia sendo apenas superada pela Polónia e pela Espanha.
A este quadro acrescem, ainda, as centenas de milhares de trabalhadores por conta de outrem obrigados a recorrer aos falsos recibos verdes, bem como os quase 570 mil trabalhadores a tempo parcial.
Panorama negro a que tem de se juntar também a crescente proliferação de empresas de trabalho temporário, actividade em expansão «sem controlo e sem lei».
Promessas esquecidas
Ora foram estes factos que a bancada comunistas tratou de colocar no centro do debate, chamando sobretudo a atenção para a circunstância de não ter sido esta a realidade que o PS prometeu. Os seus compromissos eleitorais foram outros, observou a deputada Odete Santos, recordando, nomeadamente, que todos os que Sócrates assumiu no sentido de mais emprego redundaram, afinal, em mais desemprego e mais precariedade.
«Prometendo trabalho com direitos (é do Programa Eleitoral a célebre frase: Porque o Estado de direito não pode ficar à porta das empresas) o PS retirou direitos, numa ofensiva jamais vista contra o Trabalho que tanto é exigido pelo capitalismo financeiro e por aquele que se diz produtivo», acusou a parlamentar do PCP, para quem a governação PS é a prova cabal de que o «neoliberalismo impõe a destruição de direitos laborais».
Odete Santos considerou mesmo, aliás, num registo muito duro, que o grande capital, hoje, mais não faz do que «prosseguir a sua passeata sobre os escombros de conquistas dos trabalhadores, sobre os destroços de um direito laboral moderno gerado no modelo social europeu».
«Precarizar, precarizar, precarizar continua a ser a estratégia prosseguida pelo capital», afirmou ainda a deputada do PCP, firme no repúdio e na recusa à chantagem de quantos afirmam que a alternativa aos baixos salários, à desregulamentação ou à precarização é o desemprego. Essa é uma grossa mentira, sustentou, explicando que não obstante todos os mecanismos de exploração que utiliza em seu favor (flexibilidade do trabalho, precarização dos contratos, redução dos custos do trabalho, progressos técnicos, polivalência, aumentos de produtividade), a verdade é que o número de desempregados não cessa de crescer perante a incapacidade histórica do capitalismo de aumentar a produção.
Regressar ao passado
Às acusações da bancada comunista, nomeadamente à de que o Governo está a «assumir os piores tiques patronais», pactuando com a precarização e o trabalho ilegal, respondeu o ministro do Trabalho e da Solidariedade Social com a promessa de reforço da acção fiscalizadora a essas «novas formas de organização do trabalho», sem no entanto deixar de expressar a sua convicção de que «há lugar para os contratos a termo e para as empresas de trabalho temporário». Vieira das Silva recusou ainda qualquer intuito no sentido de facilitar os despedimentos e afiançou que a «Inspecção-Geral do Trabalho está a ser reforçada nos seus meios técnicos e humanos para levar a cabo uma acção mais efectiva de controlo» das situações «irregulares».
Intenções que não foram suficientes para tranquilizar a bancada comunista face a um Governo que partilha uma concepção que «em vez de olhar o futuro pretende restaurar os critérios das relações laborais do Século XIX e adoptar modelos ultrapassados de mais de um século».
Foi o que disse, sem papas na língua, Francisco Lopes, numa alusão à falácia que procura fazer crer que em Portugal a legislação laboral é a que mais protege os trabalhadores contra o despedimento individual, ideia muito propalada na sequência da fuga do Governo ao compromisso de alterar os aspectos mais negativos do Código do Trabalho, nomeadamente quanto à contratação colectiva.
«Esta tese falsa não é mais do que a preparação do Governo PS para introduzir alterações ao Código do Trabalho no sentido de facilitar os despedimentos individuais sem justa causa», advertiu o deputado comunista, considerando tal propósito «de todo inaceitável».
Defendendo um rumo alternativo, que aposte no desenvolvimento económico e no combate ao desemprego, o Grupo comunista considerou ainda no decurso do debate que o combate à precariedade e ao trabalho não declarado e ilegal «deve constituir uma política de Estado», propondo, nesse sentido, a criação de uma Comissão Nacional que, acompanhando a realidade, «centralize informação e dinamize uma forte sensibilização social» que enfrente aquelas pragas.
Graves violações de direitos
As violações aos direitos dos trabalhadores são hoje o pão nosso de cada dia. Essa é uma realidade que assumindo as mais variadas formas está bem presente no quotidiano das empresas. Na intervenção inicial com que apresentou a interpelação da sua bancada o deputado comunista Francisco Lopes citou casos que testemunham exemplarmente a inadmissível situação a que se chegou.
«Este é o país em que numa empresa, a Lusosider, com três dirigentes sindicais, a administração na base da ameaça e da chantagem obrigou um a rescindir o contrato, conduziu outro à baixa por desestabilização emocional e o terceiro foi já alvo de dois processos de suspensão, visando assim eliminar a organização e a liberdade de acção sindical na empresa», sublinhou o parlamentar do PCP, que denunciou igualmente o facto de a GNR, «transformada em milícia patronal, a pedido da administração da mesma Lusosider», depois de chamada para o efeito, ter interrompido uma reunião sindical e identificado dois dirigentes que ajuda a colocar fora das instalações, «em clara violação da Constituição e da Lei, como o tribunal posteriormente reconheceu».
Francisco Lopes lamentou, por outro lado, perante tantos e tão graves atropelos e flagrantes violações dos direitos dos trabalhadores – citados foram, por exemplo, a REPSOL ou os hotéis Tivoli e Marriot -, que o Governo revele uma completa insensibilidade pelo problema, que nada aconteça e a impunidade seja a regra, assim legitimando as próximas iniciativas repressivas.
«Este é o país em que dirigentes, delegados sindicais, membros de comissões de trabalhadores, trabalhadores em geral, são alvo de processos de despedimento e de processos de suspensão que lhes retiram o salário durante meses, enquanto as contestações se arrastam nos tribunais», acusou ainda o parlamentar do PCP, antes de condenar o Governo por, face a tais atropelos e violações, lavar as mãos e não garantir a eficácia da Inspecção Geral do Trabalho. Recordados, a este propósito, de acordo com um levantamento da União dos Sindicatos de Lisboa, foram as 554 solicitações de intervenção que desde 1999 ficaram sem resposta, 46 das quais respeitantes a não pagamento de salários, oito a encerramento de empresa, 86 a violações de horários de trabalho, havendo ainda 25 casos de violação do direito à greve.
À crítica do deputado comunista não escapou igualmente a artimanha do Governo de tudo remeter para os tribunais quando é certo que estes não dispõem dos meios necessários para uma justiça célere, mantendo-se, em paralelo, «custas judiciais e da acção executiva a valores proibitivos e apoios judiciários irrisórios que impedem em muitos casos o acesso à Justiça».
Realidade dramática
«Trabalhamos sábados, domingos e feriados. Trabalhámos no dia 10 de Junho. As horas são pagas sempre a 2,25 euros de noite, dia ou feriado. As minhas colegas de uma secção próxima da minha, foram trabalhar um Domingo das 21 horas às 3 horas de Segunda e às 8 horas da manhã já lá estavam novamente.
Prometeram-lhes que lhes davam uma tarde livre e pagavam, agora negam. Nós mães temos dias que nem os filhos vimos.
Será isto normal ?»
Estas são palavras de uma trabalhadora descrevendo a situação na sua empresa. O quadro é tal que termina a sua carta dizendo: «Não me identifico com medo.» Para o deputado comunista Francisco Lopes, que leu o conteúdo da missiva da tribuna, este é um testemunho que reflecte bem a «precariedade, arbitrariedade e violação de direitos elementares» que hoje caracterizam as relações laborais.
E por ser esta a difícil realidade para muitos trabalhadores nas empresas e locais de trabalho, sublinhou, há que lhe contrapor o «reforço das garantias legais, mecanismos efectivos de aplicação dos princípios constitucionais, esquemas de apoio às vítimas destas violações».
O flagelo do desemprego
O desemprego foi uma das questões em foco na interpelação do PCP ao Governo. Demonstrado foi, nomeadamente, que o número dos trabalhadores que se encontram naquela situação tem vindo a aumentar. «Apesar de todas as manipulações que se possam fazer dos números, o desemprego continuou a aumentar com o Governo do Partido Socialista», acusou Odete Santos.
Fundamentando a sua afirmação, a deputada comunista lembrou que o desemprego real não diminuiu do final do ano de 2005 para o 1.º trimestre de 2006, enquanto, por outro lado, segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), «os inactivos disponíveis e o subemprego visível fazem ascender o número de desempregados a 575.200 no final do 1.º trimestre de 2006».
Outro dado relevante do INE é o que se refere à população empregada, cujo número se situava no 4.º trimestre de 2005 nos 5.134.000, tendo diminuído para 5.126.800 no 1.º trimestre de 2006.
Informação estatística igualmente a reter é a que nos diz que o desemprego de longa duração tem vindo a aumentar, totalizando já cerca de 50 por cento dos trabalhadores desempregados.
Nada animador é também o panorama respeitante ao desemprego dos jovens até aos 25 anos, cuja taxa era já de 16,1 por cento, mais do dobro da taxa média do desemprego. Não menos preocupante é o aumento da taxa de desemprego de licenciados, num país onde tanto se fala de qualificação, elevando-se a 42.300 o número de pessoas com formação superior sem emprego.
Também no plano do desemprego feminino as coisas não vão nada bem, apesar de todas as promessas eleitorais do PS em sentido contrário, cifrando-se a respectiva taxa na casa dos 8,6 por cento nos finais de 2005, estimando-se que esteja agora nos 9,1 por cento. Certo é que dos novos desempregados no último ano 92,4 por cento foram mulheres.
Precarização extrema
A vaga de precarização das relações laborais perpassa todos os sectores da economia. Proliferam as empresas de trabalho temporário. Há trabalhadores que chegam ao fim do dia não sabendo como será no dia seguinte.
Os maus exemplos chegam de todo o lado, incluindo do próprio Estado. Na administração pública, com efeito, estão a ocorrer situações de precarização extrema que ofendem a dignidade. Usa-se e abusa-se da contratação precária, visando, como denunciou o deputado comunista Jorge Machado, objectivos claros: por um lado, reduzir as despesas; por outro, criar condições para uma mais fácil privatização dos serviços públicos.
É o vale tudo: desde recibos verdes durante anos a fio até à inimaginável situação que é a existência no Ministério das Finanças de cerca de 500 trabalhadores pagos à hora.
Face a este quadro não admira, pois, que o nosso país ocupe o desonroso 2.º lugar entre a contratação temporária (22,3 por cento de mulheres e 19 por cento de homens), segundo dados de 2003 divulgados em 2005 pela Eurofoundation, sediada em Dublin.
Esta entidade afirmava ainda no mesmo Relatório, citado por Odete Santos, referindo-se aos trabalhadores que empobrecem trabalhando, que enquanto a média na União Europeia era de 7 por cento essa relação em Portugal atingia o dobro os 14 por cento.
Não ao trabalho ilegal
Outra ideia central para a qual a bancada do PCP chamou a atenção diz respeito ao carácter indissociável entre a precariedade e o «grave problema do trabalho não declarado e ilegal, incluindo o trabalho infantil e o tráfico de mão-de-obra», suporte em larga medida da economia subterrânea que, embora difícil de avaliar em toda a sua extensão, cálculos estimam possa representar entre 20 a 25 por cento do PIB.
«Trata-se de um forte incentivo à precariedade, à baixa produtividade e à falta de formação, bem como uma forma de debilitar o financiamento da Segurança Social e de limitar as receitas do Estado», realçou Francisco Lopes, antes de acusar o Executivo de, também nesta matéria, ser relapso no que se refere ao cumprimento da lei e dar maus exemplos com a manutenção dos recibos verdes e de muitas outras situações precárias na administração pública.
Capitalismo à mesa
Foi uma descrição detalhada e rigorosa a que os deputados comunistas traçaram ao longo do debate, funcionando como autêntico libelo acusatório contra esta política do Executivo PS que, cedendo às exigências e chantagens do capitalismo, promove a precariedade como factor quase absoluto a erigir nas relações laborais. «O capitalismo sentou-se à mesa do Estado», acusou a deputada comunista Odete Santos, sintetizando um aspecto chave que explica muitas das opções e prioridades assumidas pela governação.
Os dados referidos pelo deputado Francisco Lopes, na sua intervenção inicial em nome da bancada comunista, não deixam margem para dúvidas: mais de 750 mil trabalhadores tinham no último trimestre de 2005 contratos não permanentes, equivalendo a 19,7 por cento dos contratos, taxa que se situa entre as mais elevadas da União Europeia sendo apenas superada pela Polónia e pela Espanha.
A este quadro acrescem, ainda, as centenas de milhares de trabalhadores por conta de outrem obrigados a recorrer aos falsos recibos verdes, bem como os quase 570 mil trabalhadores a tempo parcial.
Panorama negro a que tem de se juntar também a crescente proliferação de empresas de trabalho temporário, actividade em expansão «sem controlo e sem lei».
Promessas esquecidas
Ora foram estes factos que a bancada comunistas tratou de colocar no centro do debate, chamando sobretudo a atenção para a circunstância de não ter sido esta a realidade que o PS prometeu. Os seus compromissos eleitorais foram outros, observou a deputada Odete Santos, recordando, nomeadamente, que todos os que Sócrates assumiu no sentido de mais emprego redundaram, afinal, em mais desemprego e mais precariedade.
«Prometendo trabalho com direitos (é do Programa Eleitoral a célebre frase: Porque o Estado de direito não pode ficar à porta das empresas) o PS retirou direitos, numa ofensiva jamais vista contra o Trabalho que tanto é exigido pelo capitalismo financeiro e por aquele que se diz produtivo», acusou a parlamentar do PCP, para quem a governação PS é a prova cabal de que o «neoliberalismo impõe a destruição de direitos laborais».
Odete Santos considerou mesmo, aliás, num registo muito duro, que o grande capital, hoje, mais não faz do que «prosseguir a sua passeata sobre os escombros de conquistas dos trabalhadores, sobre os destroços de um direito laboral moderno gerado no modelo social europeu».
«Precarizar, precarizar, precarizar continua a ser a estratégia prosseguida pelo capital», afirmou ainda a deputada do PCP, firme no repúdio e na recusa à chantagem de quantos afirmam que a alternativa aos baixos salários, à desregulamentação ou à precarização é o desemprego. Essa é uma grossa mentira, sustentou, explicando que não obstante todos os mecanismos de exploração que utiliza em seu favor (flexibilidade do trabalho, precarização dos contratos, redução dos custos do trabalho, progressos técnicos, polivalência, aumentos de produtividade), a verdade é que o número de desempregados não cessa de crescer perante a incapacidade histórica do capitalismo de aumentar a produção.
Regressar ao passado
Às acusações da bancada comunista, nomeadamente à de que o Governo está a «assumir os piores tiques patronais», pactuando com a precarização e o trabalho ilegal, respondeu o ministro do Trabalho e da Solidariedade Social com a promessa de reforço da acção fiscalizadora a essas «novas formas de organização do trabalho», sem no entanto deixar de expressar a sua convicção de que «há lugar para os contratos a termo e para as empresas de trabalho temporário». Vieira das Silva recusou ainda qualquer intuito no sentido de facilitar os despedimentos e afiançou que a «Inspecção-Geral do Trabalho está a ser reforçada nos seus meios técnicos e humanos para levar a cabo uma acção mais efectiva de controlo» das situações «irregulares».
Intenções que não foram suficientes para tranquilizar a bancada comunista face a um Governo que partilha uma concepção que «em vez de olhar o futuro pretende restaurar os critérios das relações laborais do Século XIX e adoptar modelos ultrapassados de mais de um século».
Foi o que disse, sem papas na língua, Francisco Lopes, numa alusão à falácia que procura fazer crer que em Portugal a legislação laboral é a que mais protege os trabalhadores contra o despedimento individual, ideia muito propalada na sequência da fuga do Governo ao compromisso de alterar os aspectos mais negativos do Código do Trabalho, nomeadamente quanto à contratação colectiva.
«Esta tese falsa não é mais do que a preparação do Governo PS para introduzir alterações ao Código do Trabalho no sentido de facilitar os despedimentos individuais sem justa causa», advertiu o deputado comunista, considerando tal propósito «de todo inaceitável».
Defendendo um rumo alternativo, que aposte no desenvolvimento económico e no combate ao desemprego, o Grupo comunista considerou ainda no decurso do debate que o combate à precariedade e ao trabalho não declarado e ilegal «deve constituir uma política de Estado», propondo, nesse sentido, a criação de uma Comissão Nacional que, acompanhando a realidade, «centralize informação e dinamize uma forte sensibilização social» que enfrente aquelas pragas.
Graves violações de direitos
As violações aos direitos dos trabalhadores são hoje o pão nosso de cada dia. Essa é uma realidade que assumindo as mais variadas formas está bem presente no quotidiano das empresas. Na intervenção inicial com que apresentou a interpelação da sua bancada o deputado comunista Francisco Lopes citou casos que testemunham exemplarmente a inadmissível situação a que se chegou.
«Este é o país em que numa empresa, a Lusosider, com três dirigentes sindicais, a administração na base da ameaça e da chantagem obrigou um a rescindir o contrato, conduziu outro à baixa por desestabilização emocional e o terceiro foi já alvo de dois processos de suspensão, visando assim eliminar a organização e a liberdade de acção sindical na empresa», sublinhou o parlamentar do PCP, que denunciou igualmente o facto de a GNR, «transformada em milícia patronal, a pedido da administração da mesma Lusosider», depois de chamada para o efeito, ter interrompido uma reunião sindical e identificado dois dirigentes que ajuda a colocar fora das instalações, «em clara violação da Constituição e da Lei, como o tribunal posteriormente reconheceu».
Francisco Lopes lamentou, por outro lado, perante tantos e tão graves atropelos e flagrantes violações dos direitos dos trabalhadores – citados foram, por exemplo, a REPSOL ou os hotéis Tivoli e Marriot -, que o Governo revele uma completa insensibilidade pelo problema, que nada aconteça e a impunidade seja a regra, assim legitimando as próximas iniciativas repressivas.
«Este é o país em que dirigentes, delegados sindicais, membros de comissões de trabalhadores, trabalhadores em geral, são alvo de processos de despedimento e de processos de suspensão que lhes retiram o salário durante meses, enquanto as contestações se arrastam nos tribunais», acusou ainda o parlamentar do PCP, antes de condenar o Governo por, face a tais atropelos e violações, lavar as mãos e não garantir a eficácia da Inspecção Geral do Trabalho. Recordados, a este propósito, de acordo com um levantamento da União dos Sindicatos de Lisboa, foram as 554 solicitações de intervenção que desde 1999 ficaram sem resposta, 46 das quais respeitantes a não pagamento de salários, oito a encerramento de empresa, 86 a violações de horários de trabalho, havendo ainda 25 casos de violação do direito à greve.
À crítica do deputado comunista não escapou igualmente a artimanha do Governo de tudo remeter para os tribunais quando é certo que estes não dispõem dos meios necessários para uma justiça célere, mantendo-se, em paralelo, «custas judiciais e da acção executiva a valores proibitivos e apoios judiciários irrisórios que impedem em muitos casos o acesso à Justiça».
Realidade dramática
«Trabalhamos sábados, domingos e feriados. Trabalhámos no dia 10 de Junho. As horas são pagas sempre a 2,25 euros de noite, dia ou feriado. As minhas colegas de uma secção próxima da minha, foram trabalhar um Domingo das 21 horas às 3 horas de Segunda e às 8 horas da manhã já lá estavam novamente.
Prometeram-lhes que lhes davam uma tarde livre e pagavam, agora negam. Nós mães temos dias que nem os filhos vimos.
Será isto normal ?»
Estas são palavras de uma trabalhadora descrevendo a situação na sua empresa. O quadro é tal que termina a sua carta dizendo: «Não me identifico com medo.» Para o deputado comunista Francisco Lopes, que leu o conteúdo da missiva da tribuna, este é um testemunho que reflecte bem a «precariedade, arbitrariedade e violação de direitos elementares» que hoje caracterizam as relações laborais.
E por ser esta a difícil realidade para muitos trabalhadores nas empresas e locais de trabalho, sublinhou, há que lhe contrapor o «reforço das garantias legais, mecanismos efectivos de aplicação dos princípios constitucionais, esquemas de apoio às vítimas destas violações».
O flagelo do desemprego
O desemprego foi uma das questões em foco na interpelação do PCP ao Governo. Demonstrado foi, nomeadamente, que o número dos trabalhadores que se encontram naquela situação tem vindo a aumentar. «Apesar de todas as manipulações que se possam fazer dos números, o desemprego continuou a aumentar com o Governo do Partido Socialista», acusou Odete Santos.
Fundamentando a sua afirmação, a deputada comunista lembrou que o desemprego real não diminuiu do final do ano de 2005 para o 1.º trimestre de 2006, enquanto, por outro lado, segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), «os inactivos disponíveis e o subemprego visível fazem ascender o número de desempregados a 575.200 no final do 1.º trimestre de 2006».
Outro dado relevante do INE é o que se refere à população empregada, cujo número se situava no 4.º trimestre de 2005 nos 5.134.000, tendo diminuído para 5.126.800 no 1.º trimestre de 2006.
Informação estatística igualmente a reter é a que nos diz que o desemprego de longa duração tem vindo a aumentar, totalizando já cerca de 50 por cento dos trabalhadores desempregados.
Nada animador é também o panorama respeitante ao desemprego dos jovens até aos 25 anos, cuja taxa era já de 16,1 por cento, mais do dobro da taxa média do desemprego. Não menos preocupante é o aumento da taxa de desemprego de licenciados, num país onde tanto se fala de qualificação, elevando-se a 42.300 o número de pessoas com formação superior sem emprego.
Também no plano do desemprego feminino as coisas não vão nada bem, apesar de todas as promessas eleitorais do PS em sentido contrário, cifrando-se a respectiva taxa na casa dos 8,6 por cento nos finais de 2005, estimando-se que esteja agora nos 9,1 por cento. Certo é que dos novos desempregados no último ano 92,4 por cento foram mulheres.
Precarização extrema
A vaga de precarização das relações laborais perpassa todos os sectores da economia. Proliferam as empresas de trabalho temporário. Há trabalhadores que chegam ao fim do dia não sabendo como será no dia seguinte.
Os maus exemplos chegam de todo o lado, incluindo do próprio Estado. Na administração pública, com efeito, estão a ocorrer situações de precarização extrema que ofendem a dignidade. Usa-se e abusa-se da contratação precária, visando, como denunciou o deputado comunista Jorge Machado, objectivos claros: por um lado, reduzir as despesas; por outro, criar condições para uma mais fácil privatização dos serviços públicos.
É o vale tudo: desde recibos verdes durante anos a fio até à inimaginável situação que é a existência no Ministério das Finanças de cerca de 500 trabalhadores pagos à hora.
Face a este quadro não admira, pois, que o nosso país ocupe o desonroso 2.º lugar entre a contratação temporária (22,3 por cento de mulheres e 19 por cento de homens), segundo dados de 2003 divulgados em 2005 pela Eurofoundation, sediada em Dublin.
Esta entidade afirmava ainda no mesmo Relatório, citado por Odete Santos, referindo-se aos trabalhadores que empobrecem trabalhando, que enquanto a média na União Europeia era de 7 por cento essa relação em Portugal atingia o dobro os 14 por cento.
Não ao trabalho ilegal
Outra ideia central para a qual a bancada do PCP chamou a atenção diz respeito ao carácter indissociável entre a precariedade e o «grave problema do trabalho não declarado e ilegal, incluindo o trabalho infantil e o tráfico de mão-de-obra», suporte em larga medida da economia subterrânea que, embora difícil de avaliar em toda a sua extensão, cálculos estimam possa representar entre 20 a 25 por cento do PIB.
«Trata-se de um forte incentivo à precariedade, à baixa produtividade e à falta de formação, bem como uma forma de debilitar o financiamento da Segurança Social e de limitar as receitas do Estado», realçou Francisco Lopes, antes de acusar o Executivo de, também nesta matéria, ser relapso no que se refere ao cumprimento da lei e dar maus exemplos com a manutenção dos recibos verdes e de muitas outras situações precárias na administração pública.