Alkatiri nega ter ordenado armamento de milícias

Soberania ameaçada em Timor

Mari Alkatiri desmentiu as acusações de Vicente da Conceição «Railos», segundo o qual o governo terá formado um grupo armado com o objectivo de eliminar adversários políticos.

«A Austrália vai duplicar o número de efectivos policiais em Díli»

Em conferência de imprensa ocorrida anteontem, dia 20, no Palácio do Governo, em Díli, o primeiro-ministro timorense respondeu às acusações vindas a público nos últimos dias e manifestou total disponibilidade para colaborar com todas as solicitações requeridas pelas investigações em curso.
De acordo com as declarações anteriores do chefe do grupo miliciano, o ex-ministro do Interior, Rogério Lobato, e o próprio responsável do executivo maubere, Mari Alkatiri, terão distribuído armas e dado ordens a «Railos» para comandar uma força de intervenção paralela ao contingente policial, cujo fim seria identificar e eliminar os opositores internos e externos à Fretilin, partido que obteve a maioria parlamentar nas eleições legislativas mas cuja acção tem sido, desde então, alvo de críticas, boatos e bloqueios por parte de partidos e personalidades alojados noutros quadrantes políticos e de interesses.
Alkatiri considerou ainda as suspeitas levantadas por «Railos» desprovidas de fundamento, e acrescentou que «se for solicitado» a prestar esclarecimentos no âmbito do apuramento judicial desta matéria está «disposto a colaborar».
Em Díli, o Ministério Público anunciou a abertura de um inquérito sobre a formação de «esquadrões da morte» e ordenou a imediata detenção de Rogério Lobato no caso do ex-ministro tentar a fuga do país, cenário que, de um momento para o outro, começou a ser ventilado na capital timorense sem no entanto existirem indícios de que tal possa vir a acontecer.
Fonte ligada à ONU também precisou à Lusa que as Nações Unidas deram início a uma investigação sobre os acontecimentos de Abril e Maio no território, respondendo assim a uma solicitação feita por José Ramos-Horta junto da organização, mas rejeitou «juízos preconcebidos, com pessoas a serem consideradas culpadas». «Não faz sentido iniciar uma investigação com qualquer tipo de convicção quanto à culpabilidade de quem quer que seja», disse o responsável citado pela agência noticiosa portuguesa.
O mandato da UNOTIL, missão das Nações Unidas no território, cujo prazo expirou no passado dia 19 de Maio, foi entretanto prorrogado por mais dois meses, subsistindo, apesar desta decisão, a dúvida sobre o envio de um contingente de «capacetes azuis» para a ilha asiática.
Em entrevista ao semanário Expresso, publicada na edição de sábado passado, Lobato admitiu ter pedido a colaboração do grupo de «Railos» enquanto «pisteiros», isto é, integrando-os exclusivamente como batedores em colaboração com as forças da ordem. O antigo responsável pela tutela da Polícia Nacional de Timor Leste não adiantou dados sobre a alegada distribuição de metralhadoras ao grupo, deixando apenas a suspeita de que, neste caso, estarão envolvidos outros agentes políticos, incluindo Xanana Gusmão, interessados em «diabolizar» o governo da Fretilin.

Teia de cumplicidades

Entretanto, o agora ministro da Defesa de Timor, José Ramos-Horta, empossado no cargo depois do presidente Xanana Gusmão ter «sugerido» a Alkatiri o afastamento do então titular do cargo, Roque Rodrigues, figura destacada na direcção da Fretilin, visitou o grupo revoltoso estacionado em Leutala, no distrito de Liquiçá.
Na visita à localidade a cerca de 50 quilómetros de Díli, Ramos-Horta encontrou-se com os quase 30 elementos liderados por «Railos» e, após considerar a situação «grave e delicada», não se escusou a comentar as acusações destes contra o governo timorense.
A respeito da alegada distribuição de armas promovida pelo executivo da Fretilin, o qual Ramos-Horta integra, o governante disse que «lhe custa a crer que seja verdade» mas deu voz às suspeitas afirmando que «este grupo parece ser fidedigno, sério e sente-se defraudado». Ramos-Horta acrescentou que o grupo está disposto a «entregar as armas ao presidente da República», desde que, disse também, «as armas sejam preservadas como evidência de um crime».
A concluir, o titular da pasta da Defesa mencionou a existência de «muitos outros grupos armados da mesma maneira e com os mesmos objectivos», palavras que pouco ajudam a serenar os conflitos existentes, antes pelo contrário, perpetuam o clima de boato sobre o presumível envolvimento do governo de Alkatiri na constituição de milícias.

Vizinhos atentos

Antes da se deslocar junto de «Railos», Ramos-Horta seguiu os passos de Xanana Gusmão e encontrou-se com responsáveis indonésios. De acordo com os próprios, a visita procurou «descansar» o governo de Jacarta quanto ao aparente caos no território e sensibilizar os ex-ocupantes no que à presença de tropas estrangeiras enviadas por Portugal, Nova Zelândia, Malásia e Austrália diz respeito.
Da parte dos Australianos, a postura tutelar e de manutenção dos conflitos parece ser cada vez mais evidente. Os «mal-entendidos» e animosidades para com o contingente da GNR sucedem-se. Paralelamente ao número de militares australianos já estacionados em Timor, Camberra fez ainda saber, na sequência de uma visita relâmpago efectuada pelo ministro da Justiça da Austrália, Chris Ellison, e pelo comissário da Polícia Federal daquele país, Mick Keelty, que o número de efectivos policiais em Díli vai passar para o dobro.

Paz regressa à hierarquia militar
Peticionários entregam armas

Já no final da semana passada, o grupo de militares que no mês de Abril iniciou a contestação ao governo da Fretilin, encabeçados pelo oficial Alfredo Reinado, procedeu à entrega de armas automáticas junto das tropas australianas, cumprindo, desta forma, com as garantias dadas ao presidente timorense, Xanana Gusmão.
Alkatiri manifestou o seu contentamento pelo sucedido expressando que tal acto constitui «um bom começo para estabilizar o país, para criar confiança entre a população». Perante a garantia de que os outros dois grupos de militares rebeldes acantonados em Gleno, no distrito de Ermera, igualmente conhecidos como «peticionários», também irão proceder à entrega dos espingardas, o primeiro-ministro reiterou que «não pode haver armas nas mãos de civis ou de pessoas que não pertençam a instituições como as Falintil-Forças de Defesa de Timor-Leste ou a Polícia Nacional de Timor-Leste», aproveitando a ocasião para incitar «outros» (grupos milicianos) a seguirem o exemplo dado pelo homens às ordens do major Reinado.
Durante a deslocação a Bali para se encontrar com o homólogo indonésio, Susilo Bambang Yudhoyono, Xanana Gusmão afirmou que «não foi o major Alfredo que provocou o problema, temos muitas outras questões em que pensar», ou seja, segundo o chefe de Estado, a crise político-militar desencadeada tem razões mais profundas que o levantamento castrense, entre as quais as diferenças quanto às orientações políticas fundamentais levadas a cabo pelo governo da Fretilin, legitimamente empossado após ter recolhido mais de 55 por cento dos votos populares.
Sobre esta questão, importa notar que, ainda na passada segunda-feira, o parlamento de Díli foi obrigado a prorrogar o prazo dado ao governo para a apresentação de uma versão corrigida do Código Penal.
O impasse na aprovação dos diplomas durava desde Julho de 2005. Em causa estava a dúvida presidencial sobre a aplicação de pena de prisão aos acusados pelo crime de difamação. O governo cedeu neste aspecto e no futuro Código Penal de Timor Leste passam a figurar, pela seguinte ordem, os crimes contra a paz, a humanidade e a liberdade; crimes contra as pessoas; crimes contra a vida em democracia; crimes contra o património; crimes contra a realização da justiça; crimes praticados no exercício de funções públicas; crimes de falsificação e crimes contra a economia.

PE aprova resolução sobre Timor
PCP exige respeito pelo povo

Em face dos acontecimentos em Timor Leste e do eco dado aos conflitos no território, o Parlamento Europeu (PE) discutiu e aprovou uma resolução sobre a matéria, no passado dia 15 de Junho.
Na intervenção proferida na sessão, o eurodeputado eleito pelo PCP, Pedro Guerreiro, considerou que «o conteúdo da resolução se caracteriza pela sua parcialidade no que se refere à leitura da situação política. Parcialidade que encerra o perigo de alimentar tentativas internas e externas de aproveitamento político que podem levar a novas situações de tensão».
De acordo com o parlamentar comunista, «por parte do Parlamento Europeu, o que se impõem, neste momento, é uma atitude de valorização da actuação e esforço de todas as instituições timorenses» e, nesse sentido, exige-se o apoio ao regresso à normalidade em matéria de segurança; a defesa da soberania do povo no respeito pleno pela sua livre opção na escolha dos respectivos representantes; a rejeição liminar de dinâmicas de ingerência externa, «nomeadamente por parte das potências regionais, a Austrália e a Indonésia», destacou; e a promoção da solidariedade desinteressada com vista ao desenvolvimento económico e social de uma nação destruída por décadas de ocupação e que, à escassos quatro anos, conquistou a independência.
Analisando o texto aprovado no PE, acresce, segundo Pedro Guerreiro, que «a resolução escamoteia os perigos reais de ingerência externa», conduta que «comporta dois perigos: direccionar todas as responsabilidades da situação para um dos órgãos de soberania timorenses, e não alertar para os perigos futuros de destabilização que manobras de ingerência, mais ou menos directas, podem ter num país ainda marcado pela ocupação indonésia e pelas manobras de destabilização que milícias armadas têm vindo consecutivamente a levar a cabo».
Por fim, o eleito do Partido sublinhou não só não ser «adequado estar a colocar a questão da presença de “capacetes azuis”» como ser necessário «que as forças militares e policiais estacionadas no território permaneçam apenas até a situação estar estabilizada, submetendo-se, por um lado, às suas cadeias de comando nacional e, por outro, ao poder político timorense de acordo com o teor dos acordos bilaterais, com o quadro constitucional do país e as normas do direito internacional».


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