Crise leva GNR a Timor-Leste

Governo de Alkatiri não capitula

Governo e presidente da República Democrática de Timor-Leste reiteraram a cooperação para resolver a crise no país. Portugal vai enviar um contingente da GNR a pedido do executivo de Díli.

«A prioridade do governo é travar o passo à subversão da democracia»

No final da reunião do Conselho de Estado, que decorreu entre segunda e terça-feira, no Palácio das Cinzas, em Díli, o presidente Xanana Gusmão revelou ter chamado a si, enquanto comandante supremo das forças armadas, a «responsabilidade principal» pela defesa e segurança no país.
Numa declaração à comunicação social após duas sessões de diálogo com os membros daquele órgão consultivo, entre os quais o primeiro-ministro, Mari Alkatiri, e o presidente do Parlamento Nacional, Luolo, Xanana anunciou que vão ser tomadas «medidas de emergência» por forma a impedir a continuação da onda de violência semeada nos últimos dias por grupos de jovens armados, militares e polícias contestatários.
Contrariamente ao reclamam parte dos manifestantes e alguns dos sectores políticos desavindos com o executivo timorense, Xanana não demitiu o primeiro-ministro Mari Alkatiri nem dissolveu o parlamento, afirmando mesmo estar disposto a cumprir todos os «preceitos constitucionais», correspondendo, desta forma, à expectativa do chefe do governo nessa matéria.
Entre as medidas decididas na reunião, que entraram imediatamente em vigor e por um prazo máximo de 30 dias, destacam-se a «apreensão de armas, munições e explosivos» e a sua entrega às forças militares e de segurança internacionais já presentes no território.
Xanana sublinhou ainda a «colaboração estreita e articulação» com Alkatiri e Luolo, titulares dos órgãos de soberania, no «rápido restabelecimento da ordem pública».

Portugal envia GNR

Entretanto, o Governo português acedeu positivamente ao pedido do governo de Díli quanto ao envio de um contingente de 120 GNR’s para o território (decisão sobre a qual publicamos na caixa ao lado a apreciação do Secretariado do Comité Central do PCP), força que se junta aos 1800 militares australianos e às cerca de duas centenas de soldados da Malásia que desembarcaram em Timor-Leste na quinta-feira, 25.
Os confrontos e os ataques a pessoas e bens provocados por milícias e militares desmobilizados das Falintil tiveram, a semana passada, alguns dos episódios mais violentos. Segundo a ONU, o número de refugiados ascende já a mais de 60 mil em resultado dos conflitos.
Sábado, 27, em conferência de imprensa, Mari Alkatiri acusou os revoltosos de actuarem com o objectivo de proporcionarem um golpe de Estado em Timor, sem no entanto revelar os responsáveis pela instabilidade.
Para Alkatiri, «virá o tempo em que todos vamos saber quem está por trás» da intentona, mas por agora a prioridade do governo é travar o passo à subversão da democracia no país.

Documentos roubados

Atentos à situação, os indonésios estacionaram quatro navios de guerra ao largo de Timor-Leste. A potência regional que ocupou o país durante mais de duas décadas foi responsável pela última onda de violência no território, em 1999, quando elementos pertencentes a milícias pró-anexação espalharam o terror entre a população.
Os dados relativos à violência no território nesse período foram, a semana passada, saqueados durante o ataque à Procuradoria-Geral da República. Milhares de processos e centenas de computadores foram levados do edifício, facto que vai dificultar, se não mesmo impossibilitar, a continuação do apuramento dos factos ocorridos no decurso dos massacres.
«Até entraram nos gabinetes dos médicos forenses, onde ainda estavam restos mortais de vítimas ainda não identificadas dos crimes de 1999. Viraram tudo do avesso e destruíram muitas coisas», revelou o procurador-geral.
Longuinhos Monteiro acusou as Nações Unidas e os EUA de nada terem feito para evitar o roubo, na medida em que, disse, avisou atempadamente para o perigo que corriam os processos, «mas não enviaram qualquer segurança», concluiu.

Posição do PCP

Em nota divulgada no passado dia 26 de Maio, o Secretariado do Comité Central do PCP dá conta da posição dos comunistas relativamente ao envio de um contingente da GNR para Timor-Leste, e expressa as reservas e preocupações quanto à evolução da situação política no país.
«O PCP exprimiu o seu acordo ao envio de um contingente da GNR para Timor-Leste a pedido expresso e formal das instituições democráticas deste país: Governo, Presidência da República e Parlamento Nacional.
«Na sequência de posições de princípio já anteriormente divulgadas, este acordo foi expresso perante as garantias dadas pelo Governo português quanto à missão deste contingente, nomeadamente a de se situar no respeito pela soberania e as instituições democráticas de Timor-Leste, actuar na dependência dos legítimos órgãos de soberania timorenses, não ficar em caso algum subordinado a comando estrangeiro.
Esta posição do PCP decorre também dos particulares deveres de amizade e solidariedade de Portugal para com a República Democrática de Timor-Leste e a sua desinteressada contribuição para a consolidação da soberania e das instituições democráticas do Estado timorense.
«Naturalmente que a posição favorável do PCP ao envio do contingente da GNR, tendo como base o respeito pelas instituições e pelo quadro constitucional timorense, está condicionada à evolução da situação em Timor-Leste e ao seu enquadramento regional e internacional. Uma alteração nos anunciados pressupostos desta missão exigirá a sua pronta reconsideração.
«A grave situação criada em Timor-Leste é sem dúvida expressão das dificuldades e contradições inerentes à construção de um novo Estado independente após tantos anos de colonialismo e ocupação estrangeira. Mas é também expressão de interferências externas visando condicionar a livre opção do povo timorense e de reconhecidas ambições relacionadas com os recursos petrolíferos de Timor-Leste, como é manifestamente o caso da Austrália, que no passado chegou ao ponto de reconhecer a jurisdição da Indonésia ocupante. É por isso preocupante que o principal contingente militar estrangeiro seja australiano e tenha desembarcado em Timor-Leste em circunstâncias pouco claras.
«O PCP está consciente da complexidade da situação e considera indispensável que o Governo português mantenha a Assembleia da República, os partidos políticos e o povo português ao corrente de novos desenvolvimentos.
«O PCP reitera ao povo timorense e ao seu Governo legítimo a solidariedade de princípio para com a sua luta pela consolidação da soberania e pelo progresso social e confirma à Fretilin, a grande força da resistência e da libertação, a amizade e solidariedade dos comunistas portugueses».


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