Anti-comunismo: doutrina do capital

Vasco Cardoso
Chegou recentemente aos escaparates de livros nos hipermercados, pela quantia de 30€, um volumoso livro que tem por título «Ditadores», com uma capa a «condizer», mostrando em primeiro plano uma fotografia de José Estaline e pairando no fundo (como se fosse uma projecção do primeiro) uma outra de Adolf Hitler, supostamente irmanados na acção e no destino. O livro inclui dezenas de fotos, mapas, gráficos e números em barda que falam de extermínios, deportações, campos de concentração, assassinatos, conspirações e onde sobretudo se desenvolve e amplia a tese de que Nazi-fascismo o Comunismo são de uma forma diferente a mesma coisa.
Se nos aventurarmos por uma qualquer livraria, facilmente encontramos prateleiras inteiras dedicadas ao anti-comunismo. FNAC, Bertrand e outras, têm em local visível, normalmente sempre com um ou dois volumes em lugar de destaque, uma vasta bibliografia publicada nos últimos anos, cujo conteúdo é, mais coisa menos coisa, a condenação e criminalização do ideal comunista.
Mesmo que em muitos casos estas obras tenham como principal fonte outros títulos da mesma família, citando-se uns aos outros sucessivamente, procura-se dar sempre uma ideia eminentemente ciêntífica da obra apresentada (o que melhor sirva para construir a mentira). Ele é o historiador da Universidade tal, o jornalista especialista naquela matéria, «o político» em pré-reforma com uma vasta experiência internacional, quando não, as três coisas ao mesmo tempo.
Seguem-se os lançamentos dos livros, os debates televisivos, as recomendações de leitura, as citações em jornais, comentários na internet e as transcrições para os manuais escolares.
A par desta dinâmica e como foi divulgado pelo Avante!, esteve em discussão na semana passada, em sede de Conselho da Europa, uma proposta de resolução que visava não só a condenação e criminalização do ideal comunista (com base na sua equiparação ao Nazi-fascismo), como um plano de acção programático para que cada país accionasse (em muitos casos aprofundasse) uma política de Estado anti-comunista. Esta resolução foi parcialmente aprovada (por agora ficou de parte o plano de acção), pelo que constitui por si só, um sinal claro dos tempos que correm. Por um lado, o medo que resulta da grande capacidade de atracção dos valores progressistas e libertadores do ideal comunista particularmente junto dos trabalhadores e da juventude, dos partidos e outras organizações revolucionárias, do exemplo de luta e resistência dos povos, do papel extraordinário que o movimento comunista imprimiu ao rumo da história da humanidade desde os princípios do século XX, por outro, a forma descarada com que as forças do capitalismo procuram por todos os meios impedir o avanço e por em causa a existência destas mesmas forças.
Como sempre, a luta ideológica é um plano da luta de classes. Nos dias que correm, pela natureza da luta que travamos esta ofensiva acentua-se e agudiza-se. Mesmo sem resolução do Conselho da Europa, procura-se impor uma doutrina/pensamento único de carácter fascizante que leve os povos a submeterem-se à cada vez mais intensa exploração. Quem diria, ali, a luta das ideias, na prateleira de um supermercado.


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