Quase tudo pronto na Venezuela para receber 20 mil delegados
A terceira reunião preparatória internacional do 16.º Festival Mundial da Juventude e dos Estudantes realizou-se este fim-de-semana em Portugal, com a participação de mais de 100 delegados de cerca de 80 países. No final, Miguel Madeira, presidente da Federação Mundial da Juventude Democrática, David Velásquez e Paula Santos, membros dos comités preparatórios de Portugal e da Venezuela respectivamente, falaram ao Avante! sobre o evento e os participantes. O festival realiza-se de 7 a 15 de Agosto, em Caracas, na Venezuela, sob o lema «Pela paz e a solidariedade, lutamos contra o imperialismo e a guerra».
Como correu a terceira reunião preparatória internacional?
Miguel Madeira: Tínhamos como objectivos fechar as linhas gerais do programa político, cultural e desportivo do festival e fazer uma reavaliação de todas as condições técnicas e logística do festival, de saúde, propaganda, alojamento, comida, transportes, segurança, todos os elementos necessários para receber 15 mil delegados. Elegemos um comité organizador internacional, o órgão que trabalhará na Venezuela a partir de 4 de Junho e que, a par do Comité Nacional Preparatório venezuelano, irá assegurar o sucesso do festival. A partir de hoje é a estrutura que está responsabilizada pelo festival. É de realçar o aumento do número de participantes e da representatividade de países dos diversos continentes e de estruturas de juventude regionais em relação às duas reuniões anteriores. Hoje temos mais condições e mais instrumentos na nossa mão para desenvolver o trabalho de forma mais intensa, a três meses e meio do festival.
O Comité Preparatório Nacional (CNP) português é constituído por 25 organizações juvenis muito diferentes entre si. É fácil chegar a consensos?
Paula Santos: O CNP tem o objectivo de ter uma expressão nacional e já temos associações juvenis de 7 distritos. Isso é muito positivo para o próprio trabalho do CNP. Ao mesmo tempo, podemos levar mais longe a divulgação do festival. Esse é outro objectivo, que os jovens portugueses possam conhecer o festival e envolver o máximo de associações juvenis.
Há associações de carácter nacional envolvidas...
PS: Sim. Temos organizações muito variadas, desde de defesa da paz a grupos de teatro, associações ligadas à arte, ao desporto, à educação... Isto dá uma grande riqueza ao trabalho e ao próprio comité. Na mesma mesa juntamos jovens de diferentes sítios e âmbitos de trabalho muito diversos. Isto funciona bem, as associações juvenis têm um bom relacionamento. Existe um espírito de entusiasmo perante o festival e a sua preparação em Portugal: «Vamos lá arranjar os materiais para ir para a rua, vamos preparar a iniciativa, vamos chegar a mais gente...» Toda a preparação da terceira reunião preparatória internacional envolveu as organizações do CNP. Estamos todos virados para o mesmo lado, com muitas ideias diversificadas. O problema às vezes é agarrar todas as ideias e conseguir implementá-las. Isso surge exactamente do facto das associações terem âmbitos de intervenção muito diferentes.
Que ideias estão a ser concretizadas?
PS: Neste momento estamos a discutir que iniciativas a delegação portuguesa vai levar para o festival, o que vamos mostrar de Portugal e dos jovens portugueses. Ainda não está fechado o que iremos fazer, mas surgiu a ideia de fazer um encontro de lusófonia no âmbito da cultura e da arte. Já se falou no ambiente, na revolução do 25 de Abril... Queremos mesmo mostrar ao mundo o que foi a nossa revolução, os seus objectivos, o que trouxe para a população, os direitos alcançados... Mas o nosso principal objectivo é envolver o máximo de associações juvenis e de jovens. Quantas mais associações envolvermos, mais sucesso terá a preparação da delegação portuguesa e maior o será o seu contributo para o festival.
Há muitos jovens a querer participar no festival?
PS: Há, mas as limitações económicas estão muito presentes em Portugal. Muitos jovens estudantes, mesmo muitos jovens trabalhadores não se podem inscrever por a viagem ser cara.
Como está a decorrer a preparação do festival na Venezuela?
David Velásquez: O ritmo de trabalho agora aumentou. Além do Comité Nacional Preparatório, foi criada uma Comissão Presidencial para o festival, onde estão integrados os ministros da Educação, do Desporto, da Cultura, da Comunicação e Informação, governadores e presidentes de câmaras municipais, representantes de universidades e do Instituto Nacional da Juventude. O festival é visto como um assunto de Estado e é preciso criar todas as condições para que os jovens venezuelanos possam contar com o máximo apoio para o seu trabalho. O nosso CNP há um ano que está a estabelecer mecanismos de trabalho e de entendimento para que esta seja uma estrutura operativa eficiente. Actualmente, estamos num período de divulgação interna do festival. No dia 1 de Abril começou a campanha comunicacional. O Miguel Madeira esteve recentemente em Caracas, participou no programa televisivo «Alô, Presidente», ontem o presidente Chavez voltou a mencionar o tema na televisão, diariamente há publicidade, artigos na imprensa... Estamos também a trabalhar muito na logística, partindo do número de 20 mil participantes estrangeiros. Não tem sido fácil, porque em Caracas não há nenhum tipo de infra-estrutura para uma iniciativa com esta dimensão, por isso estamos a combinar formas diferentes de receber os participantes, nomeadamente em residências, casas que estão a ser construídas no âmbito da política da habitação, albergues, instalações desportivas... tudo para garantir as condições de alojamento. Foram compradas camas, colchões, lençóis, almofadas e toalhas para 20 mil pessoas. É o primeiro evento desta magnitude que se faz na Venezuela e servirá como preâmbulo do Forum Social América, que lá se realiza no próximo ano. Muitas das estruturas agora construídas vão servir para esse evento.
Os jovens venezuelanos estão envolvidos na preparação do festival?
DV: Cremos que o festival conseguiu fortalecer o movimento estudantil e juvenil, num espaço de articulação e de discussão colectiva. Foram criadas as condições para que os jovens se vinculem mais activamente às políticas da revolução bolivariana. Fizemos recentemente uma reunião com todos os comités preparatórios, onde os jovens desportistas da chamada «Geração de Ouro» foram integrados na preparação do festival. São jovens que surgiram após a política de desenvolvimento das capacidades desportivas e agora estão na campanha de promoção do festival. Até Maio pensamos resolver todas as necessidades logísticas. Serão utilizadas cerca de 500 unidades de transporte das delegações, estamos a preparar um sistema de distribuição de alimentos, uma boa sinalização para que os delegados não se percam e as condições para que haja traduções simultâneas nas reuniões nas cinco línguas oficiais: inglês, francês, português, espanhol e árabe. Estamos ainda a desenvolver actividades para angariar dinheiro para realizar o festival. As delegações contribuem para um fundo de solidariedade internacional, uma conta que dará apoio às delegações de alguns países que não têm recursos para viajar. Há também delegações que estão a integrar jovens de outros países para garantir a maior representatividade possível. Cremos que o festival vai ser um êxito e irá superar muitas expectativas.
Quantas pessoas estarão envolvidas no festival, para além dos delegados?
DV: De Dezembro a Março, fez-se um processo de registo de voluntários para trabalhar no festival, que agora serão divididos em brigadas de acompanhamento, logística, guias, tradução, segurança, etc. Até agora estão envolvidos mais de dez mil jovens, para além da delegação venezuelana, que terá cerca de 2500 delegados.
Qual a importância da realização do festival na Venezuela internamente?
DV : Estamos a viver uma escalada de agressões verbais pelo Departamento de Estado dos EUA, que a médio prazo se poderá transformar em acções mais directas. O festival permitirá construir laços de solidariedade, de mecanismos de comunicação entre os jovens da Venezuela e dos outros países, de difusão da forma como de facto se está a desenvolver o processo revolucionário no nosso país, os avanços sociais conseguidos. Esperamos que também sirva como estímulo da luta de outros povos e para que colectivamente possamos construir novas formas de luta.
Há um caminho alternativo à ideologia dominante
Num contexto de agressão fácil, de guerra, de intolerância em relação a tudo o que foge ao pensamento dominante, o que representa o festival e os seus valores para os jovens?
Miguel Madeira: O festival tem um historial de luta do movimento juvenil e o facto de em 1997 se ter retomado este evento comprova a vontade dos jovens anti-imperialistas de prosseguir esta grande iniciativa, o maior acontecimento juvenil anti-imperialista à escala mundial. Num quadro da mudança de correlação de forças no início dos anos 90 e com uma agressividade imperialista cada vez maior, existe a vontade de dar uma resposta a essa ofensiva. O festival não é nem pode ser apenas aqueles dias em Agosto ou um festival para os delegados que participam. Por isso, todo o processo preparatório nos diversos países tem como objectivo envolver os jovens de cada país e divulgar o espírito e as características do festival. O festival é um ponto de chegada das lutas, das preocupações e dos problemas dos jovens de todo o mundo, mas este espaço de intercâmbio e discussão tem de servir também para que as organizações de juventude possam sair reforçadas, se desenvolvam campanhas e acções coordenadas a nível mundial e que avance a luta em cada país.
O festival tem um carácter muito reivindicativo?
MM: Sem dúvida. Uma das grandes diferenças em relação a outro tipo de iniciativas de jovens que são feitas no mundo é a firmeza de ser um festival anti-imperialista, anti-fascista e anti-colonialista, organizado pelo e para o movimento juvenil, mas também o facto de ter as suas conclusões. As conclusões das conferências, dos seminários e do «Tribunal Internacional Anti-Imperialista» farão parte dos documentos do festival. Depois terão de ser criadas as condições para que as conclusões se traduzam em acções concretas que contribuam para o desenvolvimento da luta e o reforço destas organizações progressistas que nos seus países desenvolvem uma luta contra o imperialismo. O festival mostra que há outro caminho, alternativo à tentativa de imposição da ideologia dominante. Embora haja muito trabalho pela frente, temos todas as condições para o fazer, apesar de tentativas de boicote, desmobilização e ofensiva ideológica para impedir a participação dos jovens. Isso não é novo. Nos EUA os media já dizem que vai ser formada uma tropa de força na Venezuela, que haverá uma lavagem cerebral ideológica durante o festival... Também em Portugal há notícias que empolam situações de insegurança e instabilidade.
Acontece o mesmo na Venezuela?
David Velásquez: Estamos a construir uma revolução anti-imperialista e de libertação nacional, a discutir o socialismo como a única alternativa ao capitalismo. Na América Latina vivem-se processos de alteração da correlação de forças. O festival mostra a necessidade de desenvolver um espaço de encontro para construir acções futuras do movimento estudantil e juvenil para lutar contra a guerra, o imperialismo, pela paz e reivindica o papel histórico dos povos na luta contra o fascismo. Cremos que há provas suficientes de que a luta dos povos tem perspectivas de desenvolvimento, de capacidade para derrotar o imperialismo e o festival ajuda a que os jovens se insiram nesse espaço, possam fazer partilhas e reconhecer-se como um factor capaz de transformar a realidade. Alguma comunicação social diz que o festival vai formar «agentes de Chavez». O que queremos de facto fazer é construir uma rede de solidariedade com a revolução bolivariana, até para que as experiência positivas que se estão a ser feitas na Venezuela possam servir de apoio às lutas que se estão a desenvolver noutros países. Queremos também que os jovens que vão para a Venezuela possam conhecer o que está a acontecer na verdade no nosso país, porque há um bloqueio informativo sobre a revolução e a realidade latino-americana.
Quatro anos depois do último festival, como está o mundo?
MM: Registou-se um conjunto de acontecimentos nos últimos quatro anos que abriram boas perspectivas para o desenvolvimento da luta anti-imperialista. A corrida ao armamento e a agressividade depois dos ataques do 11 de Setembro, nomeadamente com a ocupação do Afeganistão e do Iraque, teve como resposta grandes mobilizações em todo o mundo, com a juventude a desempenhar um papel determinante. Isso permitiu um despertar de consciências, que é necessário capitalizar. Todo este descontentamento e rejeição da ofensiva do imperialismo pode ter criado as condições para que as organizações de jovens possam sair do festival mais reforçadas. Não é alheio a isto o facto de o festival ter lugar na Venezuela, onde se vive um processo particular e especial.
Existe a ideia de que os jovens são passivos. Quem participa no festival constitui a excepção ou é o desmentido dessa ideia?
Paula Santos: Os jovens não são passivos, as condições em que vivem é que os podem tornar em parte passivos. Desde que entram na escola há um forte cunho da ideologia dominante, uma tentativa de os formatar. Não lhes é dada uma oportunidade de reflectir sobre o mundo. Prova-se na preparação do festival que os jovens têm ideias e muita vontade de trabalhar. A acomodação e a passividade é mais uma ideia que se tenta passar. Há muitos focos de descontentamento. Temos é de chegar até eles e organizá-los para estas reivindicações e esta luta.
DV: Passivos os jovens não são, mas há um efeito que é produzido por uma campanha ideológica de egocentrismo, de individualismo e de anulação dos valores sociais. Há algum tempo na Venezuela falava-se dos jovens como a «Geração Boba», estigmatizando-os e considerando-os apáticos, passivos e anti-sociais. Quem participa no festival recusa esta ideia e luta por que os jovens tenham um papel mais decisivo na construção de uma nova sociedade. Ensinam-nos na escola a sermos apolíticos, a preocuparmo-nos com os nossos interesses pessoais, como se os valores nacionais, os interesses comuns e a cultura não importassem. Há muitos jovens que se alimentam desse processo ideológico e que permitem que sejam os outros a decidir por eles. No início da revolução, muitos jovens não se identificavam com o processo e foram feitas campanhas, debates, actividades culturais e desportivas, abordando as suas necessidades reais, não a necessidade de ter sapatos de marca mas sim a necessidade de ter saúde, educação, habitação, espaço de divertimento, cultura. É difícil combater um aparato internacional dos media que permanentemente diz que deves usar roupa de marca e mostrar aos jovens que devem ter outra visão do mundo. Hoje, a juventude venezuelana é o principal motor de transformação. A campanha de alfabetização, por exemplo, desenvolveu-se graças aos jovens.
Os jovens são as maiores vítimas dos ataques do imperialismo, nomeadamente na retirada de direitos. A maioria tem consciência disso?
MM: Poderão não ter nalguns casos a consciência política da razão por que isso está a acontecer, mas de certeza que sabem o que se passa, porque sentem na sua vida... Aqui entra a tal ofensiva ideológica, da inércia, de fazer com que os jovens pensem que é inevitável estas coisas acontecerem. É um grande trabalho que temos pela frente e temos de ter consciência de que as máquinas que estão ao serviço do imperialismo são poderosíssimas. Mas os jovens têm vindo a ganhar consciência de quem são os responsáveis por esta situação. Nós temos de deixar bem claro qual o caminho para construir uma nova sociedade.
Miguel Madeira: Tínhamos como objectivos fechar as linhas gerais do programa político, cultural e desportivo do festival e fazer uma reavaliação de todas as condições técnicas e logística do festival, de saúde, propaganda, alojamento, comida, transportes, segurança, todos os elementos necessários para receber 15 mil delegados. Elegemos um comité organizador internacional, o órgão que trabalhará na Venezuela a partir de 4 de Junho e que, a par do Comité Nacional Preparatório venezuelano, irá assegurar o sucesso do festival. A partir de hoje é a estrutura que está responsabilizada pelo festival. É de realçar o aumento do número de participantes e da representatividade de países dos diversos continentes e de estruturas de juventude regionais em relação às duas reuniões anteriores. Hoje temos mais condições e mais instrumentos na nossa mão para desenvolver o trabalho de forma mais intensa, a três meses e meio do festival.
O Comité Preparatório Nacional (CNP) português é constituído por 25 organizações juvenis muito diferentes entre si. É fácil chegar a consensos?
Paula Santos: O CNP tem o objectivo de ter uma expressão nacional e já temos associações juvenis de 7 distritos. Isso é muito positivo para o próprio trabalho do CNP. Ao mesmo tempo, podemos levar mais longe a divulgação do festival. Esse é outro objectivo, que os jovens portugueses possam conhecer o festival e envolver o máximo de associações juvenis.
Há associações de carácter nacional envolvidas...
PS: Sim. Temos organizações muito variadas, desde de defesa da paz a grupos de teatro, associações ligadas à arte, ao desporto, à educação... Isto dá uma grande riqueza ao trabalho e ao próprio comité. Na mesma mesa juntamos jovens de diferentes sítios e âmbitos de trabalho muito diversos. Isto funciona bem, as associações juvenis têm um bom relacionamento. Existe um espírito de entusiasmo perante o festival e a sua preparação em Portugal: «Vamos lá arranjar os materiais para ir para a rua, vamos preparar a iniciativa, vamos chegar a mais gente...» Toda a preparação da terceira reunião preparatória internacional envolveu as organizações do CNP. Estamos todos virados para o mesmo lado, com muitas ideias diversificadas. O problema às vezes é agarrar todas as ideias e conseguir implementá-las. Isso surge exactamente do facto das associações terem âmbitos de intervenção muito diferentes.
Que ideias estão a ser concretizadas?
PS: Neste momento estamos a discutir que iniciativas a delegação portuguesa vai levar para o festival, o que vamos mostrar de Portugal e dos jovens portugueses. Ainda não está fechado o que iremos fazer, mas surgiu a ideia de fazer um encontro de lusófonia no âmbito da cultura e da arte. Já se falou no ambiente, na revolução do 25 de Abril... Queremos mesmo mostrar ao mundo o que foi a nossa revolução, os seus objectivos, o que trouxe para a população, os direitos alcançados... Mas o nosso principal objectivo é envolver o máximo de associações juvenis e de jovens. Quantas mais associações envolvermos, mais sucesso terá a preparação da delegação portuguesa e maior o será o seu contributo para o festival.
Há muitos jovens a querer participar no festival?
PS: Há, mas as limitações económicas estão muito presentes em Portugal. Muitos jovens estudantes, mesmo muitos jovens trabalhadores não se podem inscrever por a viagem ser cara.
Como está a decorrer a preparação do festival na Venezuela?
David Velásquez: O ritmo de trabalho agora aumentou. Além do Comité Nacional Preparatório, foi criada uma Comissão Presidencial para o festival, onde estão integrados os ministros da Educação, do Desporto, da Cultura, da Comunicação e Informação, governadores e presidentes de câmaras municipais, representantes de universidades e do Instituto Nacional da Juventude. O festival é visto como um assunto de Estado e é preciso criar todas as condições para que os jovens venezuelanos possam contar com o máximo apoio para o seu trabalho. O nosso CNP há um ano que está a estabelecer mecanismos de trabalho e de entendimento para que esta seja uma estrutura operativa eficiente. Actualmente, estamos num período de divulgação interna do festival. No dia 1 de Abril começou a campanha comunicacional. O Miguel Madeira esteve recentemente em Caracas, participou no programa televisivo «Alô, Presidente», ontem o presidente Chavez voltou a mencionar o tema na televisão, diariamente há publicidade, artigos na imprensa... Estamos também a trabalhar muito na logística, partindo do número de 20 mil participantes estrangeiros. Não tem sido fácil, porque em Caracas não há nenhum tipo de infra-estrutura para uma iniciativa com esta dimensão, por isso estamos a combinar formas diferentes de receber os participantes, nomeadamente em residências, casas que estão a ser construídas no âmbito da política da habitação, albergues, instalações desportivas... tudo para garantir as condições de alojamento. Foram compradas camas, colchões, lençóis, almofadas e toalhas para 20 mil pessoas. É o primeiro evento desta magnitude que se faz na Venezuela e servirá como preâmbulo do Forum Social América, que lá se realiza no próximo ano. Muitas das estruturas agora construídas vão servir para esse evento.
Os jovens venezuelanos estão envolvidos na preparação do festival?
DV: Cremos que o festival conseguiu fortalecer o movimento estudantil e juvenil, num espaço de articulação e de discussão colectiva. Foram criadas as condições para que os jovens se vinculem mais activamente às políticas da revolução bolivariana. Fizemos recentemente uma reunião com todos os comités preparatórios, onde os jovens desportistas da chamada «Geração de Ouro» foram integrados na preparação do festival. São jovens que surgiram após a política de desenvolvimento das capacidades desportivas e agora estão na campanha de promoção do festival. Até Maio pensamos resolver todas as necessidades logísticas. Serão utilizadas cerca de 500 unidades de transporte das delegações, estamos a preparar um sistema de distribuição de alimentos, uma boa sinalização para que os delegados não se percam e as condições para que haja traduções simultâneas nas reuniões nas cinco línguas oficiais: inglês, francês, português, espanhol e árabe. Estamos ainda a desenvolver actividades para angariar dinheiro para realizar o festival. As delegações contribuem para um fundo de solidariedade internacional, uma conta que dará apoio às delegações de alguns países que não têm recursos para viajar. Há também delegações que estão a integrar jovens de outros países para garantir a maior representatividade possível. Cremos que o festival vai ser um êxito e irá superar muitas expectativas.
Quantas pessoas estarão envolvidas no festival, para além dos delegados?
DV: De Dezembro a Março, fez-se um processo de registo de voluntários para trabalhar no festival, que agora serão divididos em brigadas de acompanhamento, logística, guias, tradução, segurança, etc. Até agora estão envolvidos mais de dez mil jovens, para além da delegação venezuelana, que terá cerca de 2500 delegados.
Qual a importância da realização do festival na Venezuela internamente?
DV : Estamos a viver uma escalada de agressões verbais pelo Departamento de Estado dos EUA, que a médio prazo se poderá transformar em acções mais directas. O festival permitirá construir laços de solidariedade, de mecanismos de comunicação entre os jovens da Venezuela e dos outros países, de difusão da forma como de facto se está a desenvolver o processo revolucionário no nosso país, os avanços sociais conseguidos. Esperamos que também sirva como estímulo da luta de outros povos e para que colectivamente possamos construir novas formas de luta.
Há um caminho alternativo à ideologia dominante
Num contexto de agressão fácil, de guerra, de intolerância em relação a tudo o que foge ao pensamento dominante, o que representa o festival e os seus valores para os jovens?
Miguel Madeira: O festival tem um historial de luta do movimento juvenil e o facto de em 1997 se ter retomado este evento comprova a vontade dos jovens anti-imperialistas de prosseguir esta grande iniciativa, o maior acontecimento juvenil anti-imperialista à escala mundial. Num quadro da mudança de correlação de forças no início dos anos 90 e com uma agressividade imperialista cada vez maior, existe a vontade de dar uma resposta a essa ofensiva. O festival não é nem pode ser apenas aqueles dias em Agosto ou um festival para os delegados que participam. Por isso, todo o processo preparatório nos diversos países tem como objectivo envolver os jovens de cada país e divulgar o espírito e as características do festival. O festival é um ponto de chegada das lutas, das preocupações e dos problemas dos jovens de todo o mundo, mas este espaço de intercâmbio e discussão tem de servir também para que as organizações de juventude possam sair reforçadas, se desenvolvam campanhas e acções coordenadas a nível mundial e que avance a luta em cada país.
O festival tem um carácter muito reivindicativo?
MM: Sem dúvida. Uma das grandes diferenças em relação a outro tipo de iniciativas de jovens que são feitas no mundo é a firmeza de ser um festival anti-imperialista, anti-fascista e anti-colonialista, organizado pelo e para o movimento juvenil, mas também o facto de ter as suas conclusões. As conclusões das conferências, dos seminários e do «Tribunal Internacional Anti-Imperialista» farão parte dos documentos do festival. Depois terão de ser criadas as condições para que as conclusões se traduzam em acções concretas que contribuam para o desenvolvimento da luta e o reforço destas organizações progressistas que nos seus países desenvolvem uma luta contra o imperialismo. O festival mostra que há outro caminho, alternativo à tentativa de imposição da ideologia dominante. Embora haja muito trabalho pela frente, temos todas as condições para o fazer, apesar de tentativas de boicote, desmobilização e ofensiva ideológica para impedir a participação dos jovens. Isso não é novo. Nos EUA os media já dizem que vai ser formada uma tropa de força na Venezuela, que haverá uma lavagem cerebral ideológica durante o festival... Também em Portugal há notícias que empolam situações de insegurança e instabilidade.
Acontece o mesmo na Venezuela?
David Velásquez: Estamos a construir uma revolução anti-imperialista e de libertação nacional, a discutir o socialismo como a única alternativa ao capitalismo. Na América Latina vivem-se processos de alteração da correlação de forças. O festival mostra a necessidade de desenvolver um espaço de encontro para construir acções futuras do movimento estudantil e juvenil para lutar contra a guerra, o imperialismo, pela paz e reivindica o papel histórico dos povos na luta contra o fascismo. Cremos que há provas suficientes de que a luta dos povos tem perspectivas de desenvolvimento, de capacidade para derrotar o imperialismo e o festival ajuda a que os jovens se insiram nesse espaço, possam fazer partilhas e reconhecer-se como um factor capaz de transformar a realidade. Alguma comunicação social diz que o festival vai formar «agentes de Chavez». O que queremos de facto fazer é construir uma rede de solidariedade com a revolução bolivariana, até para que as experiência positivas que se estão a ser feitas na Venezuela possam servir de apoio às lutas que se estão a desenvolver noutros países. Queremos também que os jovens que vão para a Venezuela possam conhecer o que está a acontecer na verdade no nosso país, porque há um bloqueio informativo sobre a revolução e a realidade latino-americana.
Quatro anos depois do último festival, como está o mundo?
MM: Registou-se um conjunto de acontecimentos nos últimos quatro anos que abriram boas perspectivas para o desenvolvimento da luta anti-imperialista. A corrida ao armamento e a agressividade depois dos ataques do 11 de Setembro, nomeadamente com a ocupação do Afeganistão e do Iraque, teve como resposta grandes mobilizações em todo o mundo, com a juventude a desempenhar um papel determinante. Isso permitiu um despertar de consciências, que é necessário capitalizar. Todo este descontentamento e rejeição da ofensiva do imperialismo pode ter criado as condições para que as organizações de jovens possam sair do festival mais reforçadas. Não é alheio a isto o facto de o festival ter lugar na Venezuela, onde se vive um processo particular e especial.
Existe a ideia de que os jovens são passivos. Quem participa no festival constitui a excepção ou é o desmentido dessa ideia?
Paula Santos: Os jovens não são passivos, as condições em que vivem é que os podem tornar em parte passivos. Desde que entram na escola há um forte cunho da ideologia dominante, uma tentativa de os formatar. Não lhes é dada uma oportunidade de reflectir sobre o mundo. Prova-se na preparação do festival que os jovens têm ideias e muita vontade de trabalhar. A acomodação e a passividade é mais uma ideia que se tenta passar. Há muitos focos de descontentamento. Temos é de chegar até eles e organizá-los para estas reivindicações e esta luta.
DV: Passivos os jovens não são, mas há um efeito que é produzido por uma campanha ideológica de egocentrismo, de individualismo e de anulação dos valores sociais. Há algum tempo na Venezuela falava-se dos jovens como a «Geração Boba», estigmatizando-os e considerando-os apáticos, passivos e anti-sociais. Quem participa no festival recusa esta ideia e luta por que os jovens tenham um papel mais decisivo na construção de uma nova sociedade. Ensinam-nos na escola a sermos apolíticos, a preocuparmo-nos com os nossos interesses pessoais, como se os valores nacionais, os interesses comuns e a cultura não importassem. Há muitos jovens que se alimentam desse processo ideológico e que permitem que sejam os outros a decidir por eles. No início da revolução, muitos jovens não se identificavam com o processo e foram feitas campanhas, debates, actividades culturais e desportivas, abordando as suas necessidades reais, não a necessidade de ter sapatos de marca mas sim a necessidade de ter saúde, educação, habitação, espaço de divertimento, cultura. É difícil combater um aparato internacional dos media que permanentemente diz que deves usar roupa de marca e mostrar aos jovens que devem ter outra visão do mundo. Hoje, a juventude venezuelana é o principal motor de transformação. A campanha de alfabetização, por exemplo, desenvolveu-se graças aos jovens.
Os jovens são as maiores vítimas dos ataques do imperialismo, nomeadamente na retirada de direitos. A maioria tem consciência disso?
MM: Poderão não ter nalguns casos a consciência política da razão por que isso está a acontecer, mas de certeza que sabem o que se passa, porque sentem na sua vida... Aqui entra a tal ofensiva ideológica, da inércia, de fazer com que os jovens pensem que é inevitável estas coisas acontecerem. É um grande trabalho que temos pela frente e temos de ter consciência de que as máquinas que estão ao serviço do imperialismo são poderosíssimas. Mas os jovens têm vindo a ganhar consciência de quem são os responsáveis por esta situação. Nós temos de deixar bem claro qual o caminho para construir uma nova sociedade.