Omissões e compromissos adensam preocupação
Quererá o Governo corresponder, sem defraudar esperanças e expectativas, ao profundo sentido de mudança expresso pelos portugueses nas últimas eleições ? O debate do Programa do XVII Governo Constitucional, realizado segunda e terça-feira, fez adensar as dúvidas sobre a real vontade de romper com as políticas do passado, justificando, por isso, desde já, acrescidas e fundadas preocupações.
Há matérias em que não é clara a ruptura com as políticas do passado
Ainda que seja prematuro emitir juízos definitivos, há, com efeito – e isso tanto está patente no Programa do Governo como foi visível no debate - , pelas formulações generalistas, pelas evasivas, pelas deliberadas omissões mas também pela clareza de algumas orientações políticas negativas, motivos para admitir que está longe de ser perfeita a sintonia entre o documento que norteará a acção governativa e aquela que foi a profunda vontade de mudança emanada do sufrágio popular de 20 de Fevereiro.
Falta de clareza
O que alguns sinais vieram confirmar, bem pelo contrário, é que em áreas fundamentais o Governo «não assume com clareza as indispensáveis rupturas com a política anterior».
Permanece assim a dúvida quanto a saber se ao novo ciclo político – e esta é «a questão fundamental» por esclarecer, segundo o líder parlamentar do PCP, Bernardino Soares - «corresponde uma nova política ou se, pelo contrário, o novo ciclo trará consigo uma continuidade de políticas».
No seu discurso de apresentação das grandes linhas de actuação do Governo, ainda que fosse compreensível não os desenvolver a todos, era de esperar que, em relação a alguns dos seus principais objectivos, José Sócrates pudesse ir mais longe no aprofundamento dos conteúdos.
A verdade é que não o fez. E foi pena, já que isso teria um efeito clarificador no sentido de melhor compreender no seu conjunto as opções e prioridades do Governo.
Esta postura, de resto, não escapou ao olhar atento da bancada do PCP. Jerónimo de Sousa, referindo-se à intervenção inicial de mais de uma hora do Primeiro-Ministro, dirigindo-se a este, no período de perguntas, considerou que nela não tinham faltado as «declarações de boas intenções» - em abundância, de resto -, o que tinha faltado, sim, foi a «substância e o esclarecimento quanto ao que é importante».
Vazios de mais
Mas da leitura do Programa e do que foi dito no debate aspectos há que, pelo seu significado, importa reter. A estes aludiu Bernardino Soares, chamando a atenção para três deles: é o caso da existência de «matérias em que se exigia um claro romper com o passado» mas que não se encontram no texto que contém as linhas programáticas do Governo, vazio este que é extensivo a outras matérias «onde eram necessários compromissos claros com medidas indispensáveis para construir um futuro melhor», enquanto, por outro lado, diferentemente, há «matérias onde se encontram compromissos concretos mas que se referem a medidas negativas e erradas».
José Sócrates definira, por exemplo, no que chamou de «contrato para a confiança», como prioridades do seu Governo, a aposta no investimento, o relançar do crescimento económico e a criação de emprego, adiantando ainda que a consolidação das contas públicas não é uma «obsessão mas um instrumento ao serviço do crescimento económico».
Repartição da riqueza
Jerónimo de Sousa, neste ponto, expressou o seu acordo quanto à ideia de que «no actual quadro, o problema nacional não é de facto as contas públicas mas sim a situação económica».
Mas o dirigente comunista foi bastante mais longe do que o chefe do Governo e, à ideia da «necessidade vital de crescimento» e de criar mais emprego, bem como de criar mais riqueza, acrescentou uma outra ideia não menos importante: a riqueza criada não pode dissociar-se de uma «repartição mais justa».
O que coloca, necessariamente, a questão dos meios e instrumentos para lá chegar. Ora sobre esta questão central não se ouviu uma palavra nem do Primeiro-Ministro nem de nenhum outro membro do Governo. Coube à bancada do PCP lembrar que o ponto de partida fundamental é a defesa do aparelho produtivo nacional. «O que não é dissociável nem contraditório com a necessidade de modernização do nosso aparelho produtivo, do perfil produtivo da nossa economia que, infelizmente, é muito
assente na subcontratação e nos baixos salários», sublinhou Jerónimo de Sousa.
Silêncio notado
Nesta formulação encontrou o Secretário-geral do PCP o mote para lançar três outras questões da maior importância. Todas elas, lamentavelmente, ausentes das mais de 20 páginas de discurso de José Sócrates. De tal maneira que essa falta de referência foi classificada pela bancada do PCP como um «silêncio de chumbo». E mesmo depois de interpelado nesse sentido pelo dirigente comunista, a nenhuma das questões respondeu o líder do PS e primeiro-ministro. Nem uma palavra sobre a necessidade de revalorizar os salários, nem uma palavra sobre a questão da Bombardier, nem uma palavra sobre as ameaças que pairam sobre o sector têxtil e vestuário nacional.
«Um silêncio absoluto que não é bom», observou Jerónimo de Sousa que, na altura, estando-se ainda no início do debate, admitiu ter ainda o Primeiro Ministro «tempo para esclarecer». Esperança vã...
Falta de clareza
O que alguns sinais vieram confirmar, bem pelo contrário, é que em áreas fundamentais o Governo «não assume com clareza as indispensáveis rupturas com a política anterior».
Permanece assim a dúvida quanto a saber se ao novo ciclo político – e esta é «a questão fundamental» por esclarecer, segundo o líder parlamentar do PCP, Bernardino Soares - «corresponde uma nova política ou se, pelo contrário, o novo ciclo trará consigo uma continuidade de políticas».
No seu discurso de apresentação das grandes linhas de actuação do Governo, ainda que fosse compreensível não os desenvolver a todos, era de esperar que, em relação a alguns dos seus principais objectivos, José Sócrates pudesse ir mais longe no aprofundamento dos conteúdos.
A verdade é que não o fez. E foi pena, já que isso teria um efeito clarificador no sentido de melhor compreender no seu conjunto as opções e prioridades do Governo.
Esta postura, de resto, não escapou ao olhar atento da bancada do PCP. Jerónimo de Sousa, referindo-se à intervenção inicial de mais de uma hora do Primeiro-Ministro, dirigindo-se a este, no período de perguntas, considerou que nela não tinham faltado as «declarações de boas intenções» - em abundância, de resto -, o que tinha faltado, sim, foi a «substância e o esclarecimento quanto ao que é importante».
Vazios de mais
Mas da leitura do Programa e do que foi dito no debate aspectos há que, pelo seu significado, importa reter. A estes aludiu Bernardino Soares, chamando a atenção para três deles: é o caso da existência de «matérias em que se exigia um claro romper com o passado» mas que não se encontram no texto que contém as linhas programáticas do Governo, vazio este que é extensivo a outras matérias «onde eram necessários compromissos claros com medidas indispensáveis para construir um futuro melhor», enquanto, por outro lado, diferentemente, há «matérias onde se encontram compromissos concretos mas que se referem a medidas negativas e erradas».
José Sócrates definira, por exemplo, no que chamou de «contrato para a confiança», como prioridades do seu Governo, a aposta no investimento, o relançar do crescimento económico e a criação de emprego, adiantando ainda que a consolidação das contas públicas não é uma «obsessão mas um instrumento ao serviço do crescimento económico».
Repartição da riqueza
Jerónimo de Sousa, neste ponto, expressou o seu acordo quanto à ideia de que «no actual quadro, o problema nacional não é de facto as contas públicas mas sim a situação económica».
Mas o dirigente comunista foi bastante mais longe do que o chefe do Governo e, à ideia da «necessidade vital de crescimento» e de criar mais emprego, bem como de criar mais riqueza, acrescentou uma outra ideia não menos importante: a riqueza criada não pode dissociar-se de uma «repartição mais justa».
O que coloca, necessariamente, a questão dos meios e instrumentos para lá chegar. Ora sobre esta questão central não se ouviu uma palavra nem do Primeiro-Ministro nem de nenhum outro membro do Governo. Coube à bancada do PCP lembrar que o ponto de partida fundamental é a defesa do aparelho produtivo nacional. «O que não é dissociável nem contraditório com a necessidade de modernização do nosso aparelho produtivo, do perfil produtivo da nossa economia que, infelizmente, é muito
assente na subcontratação e nos baixos salários», sublinhou Jerónimo de Sousa.
Silêncio notado
Nesta formulação encontrou o Secretário-geral do PCP o mote para lançar três outras questões da maior importância. Todas elas, lamentavelmente, ausentes das mais de 20 páginas de discurso de José Sócrates. De tal maneira que essa falta de referência foi classificada pela bancada do PCP como um «silêncio de chumbo». E mesmo depois de interpelado nesse sentido pelo dirigente comunista, a nenhuma das questões respondeu o líder do PS e primeiro-ministro. Nem uma palavra sobre a necessidade de revalorizar os salários, nem uma palavra sobre a questão da Bombardier, nem uma palavra sobre as ameaças que pairam sobre o sector têxtil e vestuário nacional.
«Um silêncio absoluto que não é bom», observou Jerónimo de Sousa que, na altura, estando-se ainda no início do debate, admitiu ter ainda o Primeiro Ministro «tempo para esclarecer». Esperança vã...
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