Morreu Gladys Marín

Um exemplo de luta e coragem

O Partido Comunista do Chile perdeu, no passado domingo, a sua presidente. De Gladys Marín fica o exemplo de coragem e abnegação na luta pelos ideais do seu partido.

Gladys Marín en­tregou-se às mais duras ta­refas desde os 16 anos

«É com imensa dor que comunicamos que, poucas horas após entrar em estado de coma, faleceu a nossa querida companheira Gladys Marín Millie», informou, na madrugada de domingo passado, o Comité Central do Partido Comunista do Chile. Os comunistas chilenos recordam que a sua presidente, Gladys Marín, «nos comoveu com o seu exemplo de luta e nos fez participantes da sua confiança, da sua esperança e convicção de que o ideal que animou a sua vida se fará realidade num futuro próximo».
O seu corpo ficou em câmara ardente durante dois dias no salão de honra do antigo Congresso Nacional de Santiago do Chile, um local simbólico onde, como jovem deputada comunista, travou inúmeras batalhas pelos trabalhadores e pelo povo do seu país, até 1973, quando o golpe fascista da CIA e da junta militar de Pinochet interrompeu o processo revolucionário que se vivia no Chile. O enorme cortejo desde o local do seu falecimento até ao antigo Congresso Nacional foi encabeçado pelo secretário-geral do Partido Comunista do Chile, Guillermo Tellier.
O meio milhão de chilenos que se dirigiram ao local para prestar a última homenagem à dirigente comunista mostra bem o prestígio de que desfrutava entre o seu povo, pelo qual se bateu desde tenra idade. Discursando junto à urna, o secretário-geral do PCC afirmou que «ao anunciar o doloroso desenlace da doença que afectou a esta nossa inolvidável companheira, temos a certeza que a sua figura já não pertence apenas aos que militamos nas fileiras do seu partido. Com Gladys, mil vezes venceremos». Presente nas homenagens fúnebres esteve também Hortensia Bussi, viúva do presidente Salvador Allende, que declarou a grande colaboração dada por Gladys Marín ao «nosso governo. Foi sempre fiel aos ideais de Allende, lutou toda a sua vida pelos trabalhadores».
Gladys Marín foi cremada anteontem, Dia Internacional da Mulher. Em sua honra, foi decretado o luto nacional no Chile durante dois dias.

Lutas e amores

«Na minha vida há amores, pessoas, ideias que amei e amo, às quais dedico os meus dias e os meus passos. Viajei muito, mas sempre com o meu coração e a minha mente postos num lugar, numa história, que é a história da libertação das cadeias da exploração e injustiça que amarram a vida do meu povo e dos povos. Mas cada dia traz a descoberta de rotas, um voltar a nascer, um submergir, um respirar de novo para continuar o caminho.» Esta citação, da sua autobiografia, resume o que foi a sua vida, até ao último momento.
Aos 16 anos, Gladys Marín – que faleceu aos 63 anos – iniciou a sua actividade de dirigente estudantil e aderiu à Juventude Comunista do Chile, da qual chegou à Direcção Nacional. Nos anos do governo da Unidade Popular – entre os partidos comunista, socialista e outros –, foi deputada comunista ao Congresso Nacional, onde defendeu as causas revolucionárias do governo popular. Em 1973, na sequência do golpe fascista, foi obrigada, contra a sua vontade, a exilar-se. Mas prosseguiu a luta em prol do seu país, denunciando pelo mundo os crimes cometidos no Chile de Pinochet.
Cinco anos depois, em 1978, regressou ao Chile clandestinamente para dirigir durante mais de 12 anos a resistência e a actividade do Partido Comunista do Chile nas condições mais difíceis e adversas. Depois do fim da ditadura fascista prosseguiu a sua luta para que os crimes não ficassem impunes e que se fizesse justiça às milhares de vítimas do golpe de Pinochet e dos Estados Unidos.
Mesmo perante a grave doença que a vitimou no passado domingo, um tumor na cabeça, Gladys Marín manteve a coragem que sempre a caracterizou. O diagnóstico inicial dava-lhe apenas dois meses de vida, mas depois de duas operações e graças à sua determinação e amor à vida, bem como ao apoio de uma equipa médica cubana, a revolucionária chilena resistiu por muito mais tempo. Com a sua morte, perde-se uma das principais referências revolucionárias latino-americanas. Mas fica o seu exemplo e a sua luta, que continua!

Uma re­fe­rência in­ter­na­ci­onal

Partido internacionalista, o PCP não ficou alheio ao desaparecimento de uma figura tão destacada como Gladys Marín. No dia 7, o secretário-geral Jerónimo de Sousa enviou ao Comité Central do Partido Comunista do Chile uma mensagem em que destaca o «profundo pesar» que os comunistas portugueses sentem com o falecimento da presidente do PCC. Jerónimo de Sousa lembra na sua mensagem que a «camarada Gladys Marín foi, desde a sua juventude, uma incansável lutadora pela liberdade, a democracia e progresso social para o povo chileno, tendo dedicado toda a sua vida à defesa dos interesses dos trabalhadores e à causa do socialismo».
O secretário-geral do PCP evocou ainda «com emoção o seu papel na resistência à ditadura fascista de Pinochet que constituiu um exemplo e um estímulo para a juventude de todo o mundo». A terminar, Jerónimo de Sousa afirma: «Neste momento de luto e de dor para os comunistas chilenos manifestamo-vos a nossa solidariedade perante tão grande perda, transmitindo-vos as sentidas condolências dos comunistas portugueses.»
De todo o mundo, sobretudo da América Latina, muitos partidos e organizações progressistas expressaram as suas condolências pela morte de Gladys Marín. No ano passado, a presidente do PCC havia sido agraciada, em Cuba, com a Ordem José Martí, a mais alta condecoração do Estado cubano.


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