Críticas cerradas do PCP à acção do Governo

Uma política injusta e errada

Os problemas concretos dos portugueses e do País passaram à margem nas intervenções de Santana Lopes, no debate mensal, com a sua presença, faz hoje oito dia, no Parlamento.

Visão neoliberal domina toda a acção do Governo

Apesar da produzida pose institucional e de se exibir com relativo à-vontade, num discurso onde as palavras nem sempre traduziram rigor, cedendo as mais das vezes à demagogia, o Primeiro-Ministro acabou por se desviar das questões centrais que lhe foram colocadas ao longo do debate pelas bancadas da oposição e, em particular, pela comunista.
Mesmo nas duas matérias escolhidas pelo Governo para o debate – nova lei do arrendamento e SCUT – foi notória a tentativa de iludir a gravidade e as consequências das medidas por si preconizadas.

A casa como mercadoria

Isso foi particularmente visível logo na questão da Lei das Rendas, em que não foi aduzido nenhum argumento de peso para responder à convicção expressa por Carvalhas de que a nova legislação «não vai resolver os problemas da juventude, nem a recuperação das casas degradadas».
É que, acusou, a concepção do Governo é a da casa como uma mercadoria, como um mero bem, sem a sua função social. «Uma concepção neoliberal do estilo de quem quer saúde que a pague, quem quer ensino que o pague, quem quer casa que a pague e se queres pagar menos impostos torna-te banqueiro», frisou o dirigente comunista, para concluir que «é o assalto aos bairros históricos do centro das cidades para as segundas casas, é a falta de segurança para o inquilino porque o senhorio fica com a faca e o queijo na mão ao fim de três anos».
«O Primeiro-Ministro diz-se disponível para debater com todas as forças da oposição mas o que aqui traz são autorizações legislativas», afirmou, por outro lado,
Carlos Carvalhas, que desafiou o Governo a apresentar no Parlamento uma proposta de lei material.
Um repto que não obteve de Santana Lopes qualquer resposta, como por responder ficou a questão a ele dirigida directamente pelo líder comunista para que esclarecesse quais as razões que explicam – resolvendo o mercado todos os problemas, como afirma o Governo -, que os actuais cerca de 500 mil fogos devolutos, sem qualquer restrição ao aumento da renda, não apareçam no mercado.

Defraudar expectativas

Quanto às SCUT, outro dos temas em destaque, Carvalhas, depois de lembrar que a última auto-estrada que seguiu aquele modelo foram assinada pelo ex-ministro Valente Oliveira, do PSD, sublinhou o facto de tanto este partido como o PS terem estado ambos de acordo quanto a esta solução. «Agora, ao olhar para a factura, diz que é impossível pagá-la, mas quem é que assinou os contratos, como é que eles foram feitos ?», perguntou Carvalhas, acrescentando, a propósito, ser esta uma situação idêntica à da Brisa, em que «por cada cem escudos de portagens 90 escudos vão para o bolso dos patrões».
Por isso a condenação do PCP à decisão de fazer pagar a portagem nas SCUT, depois de ter sido feita às populações a promessa de auto-estradas sem pagamento.
Ainda por cima sem oferecer alternativas, observou o líder do PCP, citando o caso do IP 5. «A alternativa é dar a volta ao Vale do Vouga para chegar a Aveiro ou vice-versa», questionou Carvalhas, deixando ainda o exemplo da Via do Infante para perguntar se a alternativa a esta é a «rua» que dá pelo nome de EN 125.

Casa do Douro

A merecer uma resposta concreta de Santana Lopes, ainda que só depois de alguma insistência da bancada comunista, foi a questão das promessas feitas no Verão passado, na serra algarvia, quanto ao pagamento das indemnizações às populações pelos graves prejuízos provocados pelos incêndios. Disse o chefe do Executivo que o pagamento às populações do Algarve atingidas pelos
incêndios será feito «já a 15 ou a 20 de Outubro».
Outra questão concreta colocada pelo dirigente do PCP, sem que tenha obtido resposta cabal, refere-se à casa do Douro e sua organização institucional, problema para o qual o PCP já antes chamara a atenção, tendo o próprio Primeiro-Ministro, na altura, reconhecido a sua existência.
Ora sucede que o problema persiste, ou seja, a Casa do Douro continua a viver uma situação aflitiva, não podendo vender uma garrafa de vinho do Porto, nem podendo pagar os salários aos trabalhadores. «Que medida tomou, que alterações fez, o que nos pode apresentar aqui ?», perguntou.

Perda do poder de compra

Os aumentos iguais aos da inflação para os trabalhadores da administração pública, prometidos por Santana Lopes, foi outro dos temas abordados por Carlos Carvalhas. Advertiu que, assim, é a continuação da diminuição dos salários, já que a previsão da inflação é sempre inferior à real e, por outro lado, ao não incorporar os ganhos de produtividade, gera de novo uma redistribuição do rendimento nacional desfavorável aos trabalhadores.
Santana Lopes nada adiantou quanto à forma como se traduzirá o prometido aumento dos salários da Função Pública.
No que respeita ao rumo do País, ao crescimento económico e à chamada «retoma», Carvalhas observou que por este andar o «País nunca mais se aproximará da média europeia nem nunca mais se atingirão os dois pontos prometidos por Durão Barroso para recuperar do atraso». Tudo, concluiu, «por responsabilidade de uma política errada, uma política injusta, uma política que levou o País à recessão».

Demita-se!

O Secretário-Geral do PCP desafiou o primeiro-ministro a demitir-se. Uma decisão para «facilitar a vida» ao Presidente da República e dar «uma alegria» ao País, sublinhou Carlos Carvalhas.
«Diga aqui com um gesto de audácia, de desprendimento pessoal e de grandeza: "obviamente, demito-me". Pague o favor que deve ao Presidente da República, facilitando-lhe a vida e novas decisões», afirmou o dirigente comunista, dirigindo-se a Santana Lopes, na passada semana, na estreia deste como primeiro-ministro no debate mensal no Parlamento.
«É a única oportunidade que tem ao seu alcance de dar uma alegria aos portugueses, porque temos vindo a assistir à degradação da vida social, política, com o país a degradar-se cada vez mais», enfatizou o Secretário-Geral do PCP, depois de acusar Santana Lopes de ser o mais destacado continuador de uma política que «levou o País à recessão, à estagnação, ao aumento do desemprego, à acentuação das desigualdades, à destruição do aparelho produtivo e à concentração da riqueza».
Ao repto do líder comunista, que apanhou de surpresa o chefe do Executivo, respondeu este com o argumento de que tem «o apoio da maioria dos portugueses», remetendo para as legislativas de 2006 uma decisão sobre a sua continuidade à frente do Governo.

Trapalhadas e contradições

Os trabalhadores da Sorefame/Bombardier continuam à espera que seja assinado o protocolo, cuja concretização estava prometida até final de Setembro, que permitirá viabilizar a empresa. Este foi um dos exemplos dados por Bernardino Soares para ilustrar o que considerou ser o resultado das «consequências desastrosas para o País» da continuação da política deste Governo.
Interpelando sob a forma de pergunta directamente Santana Lopes, a este propósito, citados pelo presidente da bancada comunista foram ainda os casos relacionados com a colocação de professores e, por outro lado, com a aplicação do princípio do preço de referência nos medicamentos, uma medida inventada pelo Executivo para poupar dinheiro à custa dos utentes, dos trabalhadores e dos reformados que, lembrou, tiveram de pagar mais 6,7 milhões de euros só nos sete primeiros meses de 2004.
Analisando o desempenho global do Executivo, Bernardino Soares classificou-o ainda como um «governo de trapalhadas e contradições», destacando, de entre esta última característica, como exemplos, as posições dissonantes entre o Primeiro-Ministro e alguns dos seus ministros em matérias tão díspares como a GALP ou a GNR no Iraque, a colocação de professores ou as taxas moderadoras.
Outro traço distintivo que tem vindo a marcar este Governo pela negativa, segundo Bernardino Soares, respeita à utilização abusiva que faz da comunicação social.
«O Primeiro-Ministro não consegue esconder as mais do que confirmadas pressões sobre a TVI para o silenciamento do comentador Marcelo Rebelo de Sousa, nem outras investidas deste tipo que protagonizou no passado», acusou o líder parlamentar do PCP, para quem Santana Lopes «não consegue explicar as mudanças no grupo PT» e a descarada promoção de Luís Delgado, essa serviçal figura conhecida por ser o mais fiel comentador do governo e da direita.
«São episódios do domínio da comunicação social por grupos económicos que impõem diariamente a falta de isenção e liberdade de expressão aos profissionais», sustentou Bernardino Soares.


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