Os trabalhadores não querem privatizações

A má gestão da Petrogal

Luís Gomes
As Subcomissões de Trabalhadores realizaram um encontro nacional na refinaria de Sines, alargado às federações sindicais. A ausência de um Plano Energético Nacional já fazia prever que o Governo ia avançar com privatizações.

Por­tugal vai per­dendo o seu pa­tri­mónio ener­gé­tico

Fequimetal/Sinorquifa/Sinquifa, a federação e sindicato dos escritórios, Fetese/Sitese, Sicop, a federação e sindicato dos quadros, Fensiq/Sensiq e Feticeq/Sindeq, analisaram, no dia 6 de Fevereiro, com as CT’s, a situação global da Galp Energia, da qual faz parte a Petrogal.
Ao analisar a situação nacional do sector, as organizações, na resolução final, salientaram a ausência de um Plano Energético Nacional ou de qualquer estratégia para as actividades petrolífera e de gás natural.
O encontro responsabilizou o Governo por se deixar subordinar pelo poder económico - como se tem constatado com a multinacional italiana ENI e, antes, com a Petrocontrol -, dando apenas importância ao lucro privado, em detrimento da economia nacional, numa atitude que tem permitido «novas arremetidas do grande capital sobre o sector».

O exemplo Pe­trogal

O encontro chumbou a actual gestão na Petrogal, por ter a «intenção de servir interesses pessoais e de grupo».
Os sindicatos destacam a forma como se tem desprezado a actividade do sector, visando o fim da exploração de petróleo e o desmantelamento da refinação.
Denunciaram a «política de markerting com avultadas somas gastas em publicidade no futebol, ao mesmo tempo que se reduz o número de postos Galp, a favor da concorrência».
Na gestão de pessoal, predomina «o favorecimento de amigos, compadrio e clientelismo partidário, com especial incidência a nível de quadros superiores da Galp Energia».
A nível social, registam-se perdas de direitos nas vertentes de saúde e das pensões de reforma.
Nos salários, predomina a discriminação «assente na manipulação de chavões como a “multivalência”, a “análise e qualificação de funções” e o “sistema de gestão de desempenho”», cuja aplicação varia consoante os interesses de ocasião da administração.
Ao ter-se furtado às negociações com os sindicatos, a administração tem contribuído para o alastrar do descontentamento, reflectido na recente luta dos trabalhadores da segurança da refinaria de Sines.
As federações concluíram estar-se perante uma prática de gestão de claro afrontamento aos trabalhadores, através da «demagogia e o verbalismo contorcionista» dos presidentes da administração e da comissão executiva da Galp Energia.

Ga­rantir o pa­tri­mónio

Os participantes tomaram decisões quanto aos passos a dar para salvaguardar o futuro da empresa e o quadro de pessoal da Petrogal:

- Reclamar dos órgãos de soberania, em particular do Governo, que garantam o domínio da empresa e da actividade petrolífera nacional pelo Estado, ao serviço do País.

- Implementar uma gestão «que consolide e desenvolva todas as suas actividades», investindo na modernização das refinarias do Porto e de Sines.

- Exigir uma gestão de pessoal inseparável de um relacionamento com as ORT’s nas negociações, respeitando os compromissos.

- Manifestar total empenho para informar e mobilizar os trabalhadores, de que é exemplo a «luta por uma correcta política de organização da segurança», nas refinarias do Porto e de Sines.

- Exigir uma imediata distribuição dos resultados do exercício de 2003.

- Exortar os sindicatos a garantir uma rápida conclusão das negociações que se iniciaram no dia 12 passado, de forma a que o fundamental destas estivesse concluído antes de Fevereiro, o que não aconteceu.

- Exigir a demissão imediata da administração da Galp Energia.

- Exigir do Governo a saída da ENI da empresa e a sua substituição pelo Estado, nomeando uma nova administração.

- Apelar aos trabalhadores que acompanhem a situação e mostrem disponibilidade para as acções que venham a ser decididas.

Pri­vados co­biçam os lu­cros

O Estado deixou de ser o maior accionista da Petrogal no mês passado, ao transferir 4,8 por cento das acções para a REN que usufruiu ainda da cedência das acções, antes da Caixa Geral de Depósitos, equivalentes a 13,49 por cento.
A REN passou a deter mais de 18 por cento da Petrogal, em detrimento do Estado, que ficou apenas com 30 por cento. Graças a estas mudanças, a italiana ENI é agora o maior accionista da empresa com 33,3 por cento. Segue-se a EDP, com 14,2, e alguns pequenos accionistas com menor expressão.
Durão Barroso anunciou, sexta-feira, na Assembleia da República a intenção de privatizar até 2005, uma grande fatia da EDP, ficando o Estado com apenas dez por cento, além de uma primeira fase de alienação da REN, mais uma fase de privatização da GALP. Assim, ficou evidente a intenção de passar também a Petrogal para mãos privadas, uma vez que os seus accionistas estatais estão agora ameaçados de privatização.
Os resultados líquidos da Galp-Energia – onde a Petrogal tem um papel determinante - revelam porque motivo o sector privado pretende apoderar-se do sector: o Grupo Galp Energia facturou 247 milhões de euros em 2003, segundo o seu relatório de contas. Deste montante, 203 milhões são resultados da Petrogal.
Acresce que o Grupo Petrogal recebeu 1,6 milhões de euros em fundos comunitários, enquanto o GDP recebeu 111,3 milhões, tendo os dois ainda a receber da União Europeia, 74,8 e 136,5 milhões de euros, respectivamente.
Em 2002, a Petrogal garantiu ao Estado, através de receitas de impostos sobre produtos, mais de 313 milhões de contos na moeda antiga, montante que subiu aos 357 milhões no ano passado. No mesmo ano, o Estado investiu, na área do petróleo, menos 150,3 milhões de euros do que em 2001, enquanto no gás natural o desinvestimento foi de 22,6 milhões em igual período.

Des­pe­di­mentos

Em 2001, o Grupo Galp Energia contava com 5549 trabalhadores, dos quais 4588 estavam no Grupo Petrogal. A Petrogal conta agora com 2157 trabalhadores.
Do total de postos de trabalho nas empresas-chave do Grupo, a Petrogal tem sido a empresa que mais os tem suprimido, ao passar de 2449 em 2001, para 2157 em 2003.
Em três anos, viu o seu quadro de pessoal diminuir em 570 trabalhadores, através de «rescisões negociadas», pré-reformas e reformas antecipadas que, para os sindicatos são, na esmagadora maioria, «despedimentos encapotados».

Ad­mi­nis­tração ir­res­pon­sável

Dois dias após este encontro que tinha alertado para a falta de condições de segurança na refinaria de Sines, ocorreu uma grave explosão num equipamento.
O acidente só não causou vítimas porque, na altura, «não se encontrava ninguém nas proximidades», segundo um telegrama do Sinquifa que responsabilizou a administração, em consequência do «mau planeamento da paragem» e de «procedimentos ilegais que «põem em causa vidas e equipamentos».
Nos dias 12 e 13, os trabalhadores das segurança da refinaria estiveram em greve e, segundo as normas de segurança, nenhum trabalho pode ser executado sem uma autorização dos operadores de segurança. No entanto, o Sinquifa acusa os empreiteiros de não terem respeitado as regras e de terem executado trabalhos «sem qualquer autorização e fora de qualquer controlo».
A administração optou por um esquema da sua responsabilidade e obstruiu a acção do piquete de greve.
A hora de paragem entre os dois turnos é assegurada por precários. Estes foram confrontados com a tentativa da administração de fugir ao pagamento do salário/hora, uma vez que, com a greve, não trabalharam por falta de segurança, ao que a administração tentou negar-lhes o pagamento.
O sindicato solicitou a intervenção da IGT que afirmou, entretanto, que «aos trabalhadores impedidos de trabalhar nada pode ser descontado».


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