Subterrâneos da Liberdade

O incessante declínio que tem caracterizado, no seu conjunto, a actividade mineira em Portugal, representa um factor de enfraquecimento económico nacional, e tipifica o comportamento dos concessionários, maioritariamente constituídos por representantes do capital estrangeiro especulador e oportunista.
A exploração mineira no nosso país compreendeu, desde sempre, não só a lavra das jazidas de minério, como o pagamento de salários de miséria a marteleiros, entivadores, mineiros, e escombreiros, alimentando a revolta dos condenados a um trabalho violento e insalubre nas galerias e poços do subsolo nacional.
A mineração nas terras alentejanas é prática ancestral, e os vestígios dessa actividade nos jazigos das pirites de cobre e ferro-cúpricas na zona de Aljustrel (Algares e São João do Deserto), remontam à ocupação romana, pelo menos, ao século I da nossa era. Todavia, é no século XIX, com a revolução industrial que se intensifica a mineração e, em Aljustrel, temos informação duma actividade regular em 1886, ano em que a extracção das pirites rondou as 142 toneladas, tendo ascendido a 27.890, em 1900.
Terminada a primeira guerra mundial (1914-1918), Portugal mergulhou numa grave crise económica, com uma vertiginosa subida dos preços, do desemprego e de novos ritmos de trabalho ultra-explorado, dando origem a uma enorme vaga de lutas reivindicativas do movimento operário português. E, é nesse quadro que o grito do protesto em Aljustrel ecoa, e se materializa numa longa greve entre Outubro de 1922 e Janeiro de 1923, desencadeando no país múltiplas greves de solidariedade, e mobilizando a classe operária no apoio à luta dos mineiros, acolhendo os seus filhos.
Nos anos trinta, com o regime fascista ditando as regras da exploração, o “Avante!” de Dezembro de 1937 denunciava as condições de extorsão a que eram submetidos os mineiros em Aljustrel onde a iluminação do seu local de trabalho, com pedra de gasómetro, era paga do seu bolso.
Ao longo de décadas, multiplicaram-se concentrações reivindicativas dos mineiros de Aljustrel quanto a salário e condições de trabalho, difundidas pelo órgão do PCP, único periódico que lhes deu visibilidade: Outubro-Novembro - 1952; Fevereiro-Março - 1953; Setembro e Dezembro - 1958, Fevereiro e Abril - 1959, e Março-Abril de 1960.
Perante a unidade dos operários das minas e o vigor da sua luta, o salazarismo aumentou a repressão e, em Abril de 1962 aprontou uma punição exemplar. Em 8 e 9 desse mês, simulou negociar com 150 mineiros em greve no fundo da mina, enquanto à superfície a GNR reprimia a manifestação de solidariedade de familiares e companheiros de trabalho. Encenada a concórdia com os grevistas, 130 trabalhadores ludibriados tiveram como destino a masmorra. Poucos dias depois, a 28 de Abril, nos preparativos das comemorações do 1º de Maio, o povo de Aljustrel ao exigir a libertação dos mineiros presos é varrido a tiro pelas forças repressivas, aí tombando assassinados António Adângio e Francisco Madeira. Mas, a luta heróica dos mineiros da Aljustrel prosseguiu até as minas entrarem em hibernação na década de noventa do século que findou.
Hoje, as pirites estão lá, muitos mineiros desempregados também, enquanto o capital beduíno aguarda novos códigos de exploração do trabalho e atraentes benefícios fiscais, para recuperar o apetite na extracção da riqueza nacional.


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