Em defesa da paz

A luta pela paz e contra a guerra no Iraque é uma questão prioritária na nossa actividade como deputados comunistas no Parlamento Europeu. Foi assim que integrámos as delegações de deputados de quatro grupos políticos, e provenientes de onze países, indo ao Iraque no início de Fevereiro e aos EUA na primeira semana de Março.

Em Nova Iorque, onde, na ONU, reunimos com o chefe dos inspectores, Hans Blix, e com o secretário-geral, Koffi Annan, ficou claro que há alternativas à guerra para obter o desarmamento do Iraque. Daí a necessidade de mais alguns meses para que a actividade dos inspectores da ONU possa continuar, como reafirmou Hans Blix.

Igualmente em diversas reuniões, em Nova Iorque e Washington, com organizações e movimentos pacifistas, intelectuais, artistas e outras diversas personalidades, incluindo congressistas democratas americanos que se opõem à guerra, foram salientados aspectos importantes que importa conhecer: o agravamento das condições económico-sociais do povo americano por causa das despesas militares astronómicas com a preparação para a guerra, o receio do isolamento internacional dos EUA face à psicose belicista que Bush está a conduzir, o crescente movimento de oposição à guerra nos próprios EUA, como, aliás, tivemos ocasião de constatar, incluindo no interior do próprio Congresso americano.

Entretanto, nas reuniões com diversos embaixadores de países da União Europeia junto da ONU, foi especialmente gratificante ouvir a afirmação francesa de que não passaria uma segunda resolução autorizando uma acção militar contra o Iraque.

Assim, tendo em conta a Resolução do Parlamento Europeu do passado dia 30 de Janeiro, onde «manifesta a sua oposição a qualquer acção militar contra o Iraque e considera que um ataque preventivo não estaria de acordo com o Direito Internacional e a Carta das Nações Unidas e conduziria a uma crise mais profunda envolvendo outros países da região; salienta que devem ser envidados todos os esforços possíveis para evitar uma acção militar», pode-se dizer que houve posições muito coincidentes nestas diversas reuniões. O desacordo registou-se com os embaixadores britânico e o espanhol, como era de esperar, dadas as conhecidas posições seguidistas da Administração americana.

Registe-se, entretanto, que, pela nossa parte, demos seguimento à deliberação do Parlamento Europeu que «apela a que se explorem todos os canais políticos e diplomáticos para garantir uma resolução pacífica do conflito e salienta a necessidade de garantir e preservar a paz e a segurança internacional». Ao contrário do que vários colunistas laudatários de Bush afirmaram em Portugal, as nossas visitas e reuniões não se podem confundir com qualquer apoio a Saddam Hussein ou ao seu regime autoritário. Aliás, não deixa de ser sintomático que tenham ignorado a nossa ida aos EUA. Não era credível dizerem que tínhamos ido apoiar a Administração americana, ou, em concreto, Bush. Preferiram ignorá-la a ouvir os testemunhos que temos contra a guerra, dados por congressistas e outras entidades americanas. Como diziam estudantes americanos em numerosos cartazes que exibiam nas manifestações «ser patriota é estar contra a guerra». Apesar de toda a campanha desenvolvida na comunicação social americana, cresce a oposição popular a uma guerra que apenas visa servir interesses de uma pequena elite poderosa que, à moda imperial, sonha em ser «dona do mundo».

A verdade é que nunca confundimos um povo com o seu governo. O apoio ao povo iraquiano, vítima de um embargo, que dura há 12 anos, e de guerras sucessivas para que tem sido arrastado, é um apoio que se impõe, tanto mais quanto é enorme a fragilidade social, designadamente das crianças, e as carências de mais de 60 por cento da população iraquiana, dependente do programa alimentar «petróleo por alimentos». Uma guerra nestas condições seria uma catástrofe humanitária de proporções incalculáveis.

Neste quadro é ainda mais inadmissível a posição do governo português, expressa pelo Primeiro- Ministro Durão Barroso, de apoio a uma guerra contra o Iraque mesmo sem aprovação do Conselho de Segurança da ONU. A gravidade desta afirmação, à revelia da Constituição Portuguesa, da Assembleia da República e do próprio Presidente da República, desrespeita quer a posição do Parlamento Europeu acima referida, quer a decisão da reunião extraordinária do Conselho Europeu de 17 de Fevereiro, que reafirmou: «Estamos empenhados em que as Nações Unidas permaneçam no centro da ordem internacional. Reconhecemos que cabe ao Conselho de Segurança a responsabilidade principal para tratar a questão do desarmamento do Iraque». Ora, a verdade é que, como Koffi Annan advertiu, a Administração Bush e os seus seguidores estão prontos a ignorar a ONU, com tudo o que isto significa de se colocarem à margem do Direito Internacional, que vigora desde o final da segunda guerra mundial. É inadmissível que Portugal esteja a ser arrastado para uma posição destas. Continuaremos a desenvolver todos os esforços em prol da paz.



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