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A vaga de privatizações à escala global que se prepara no âmbito das negociações do Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços pode ter consequências desastrosas.
A liberalização do comércio internacional voltou ao Parlamento Europeu, na passada segunda-feira, incidindo desta vez o debate sobre o Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços (AGCS) que está a ser negociado no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC).
Para os deputados do Grupo Confederal da Esquerda Unitária, que apresentaram uma resolução sobre a matéria, «as negociações têm por objectivo provocar uma nova vaga de liberalizações e, consequentemente, de privatizações no sector dos serviços», que constituem um perigo para o acesso das populações a bens essenciais como ao saúde e a água, mas também a educação, a cultura, a energia, os transportes e as telecomunicações.
Recorde-se que os países membros da OMC, depois de terem apresentado os seus pedidos de acesso aos mercados de serviços, têm de definir, até ao final do corrente mês, quais os sectores que cada um está disposto a abrir à concorrência internacional.
Aparentemente, os estados conservam o direito de determinar a lista de sectores e actividades que serão liberalizados, contudo, como se lê na proposta de resolução apresentada pelo grupo parlamentar onde se integram os deputados do PCP, «a lógica do AGCS consiste em levar cada parceiro a fazer concessões aos outros em troca do que pede e, por conseguinte, a alargar progressivamente o campo dos sectores liberalizados». Por outro lado, «o objectivo expressamente fixado pelos negociadores deste acordo é obter o mais depressa possível uma liberalização total do sector dos serviços».
Neste contexto, nada garante que mesmo os sectores da saúde, audiovisual e educação, os únicos que a Comissão Europeia se propõe defender da concorrência externa, não venham a ser usados como moeda de troca no decurso das negociações.
Intervindo no debate, Ilda Figueiredo lembrou os exemplos desastrosos de privatizações em numerosos países, incluindo dos transportes na Grã-Bretanha, da electricidade, nos EUA e em Portugal, e da distribuição de água e serviços de saúde em numerosos países em desenvolvimento. A deputada do PCP explicou assim a sua preocupação face às propostas da Comissão as quais «esquecem a importância de serviços públicos em áreas como a energia, os transportes, os correios e as telecomunicações para a coesão social, o bem estar das populações e a inclusão social e não tomam em devida conta a forte mobilização do movimento social em defesa dos serviços públicos de qualidade».
Mandato insuficiente
A resolução considera que a Comissão Europeia não está habilitada para negociar o AGCS, necessitando de um novo mandato do Conselho após consulta dos parlamentos nacionais e europeu, e acusa o executivo comunitário de manter um sigilo «injustificado» sobre as listas de pedidos e de ofertas de liberalização, cujo único efeito «é impedir qualquer debate democrático no interior da própria UE».
Neste sentido, os deputados da Esquerda Unitária Europeia solicitam uma moratória sobre o AGCS e exigem que seja elaborado um balanço sobre as consequências económicas, sociais e ambientais das políticas de liberalização da OMC, tanto na Europa como nos países em desenvolvimento, bem como um estudo prospectivo sobre as consequências de uma liberalização dos serviços».
A resolução, que conta entre os seus autores com o deputado, do PCP, Joaquim Miranda, apela ainda à Comissão que se abstenha de pedir a liberalização dos serviços em países terceiros, em especial nos países em desenvolvimento.