Investir na qualidade
Para o PCP, só a aposta na formação dos trabalhadores, de forma a atrair investimento de qualidade, poderá resolver o problema do desemprego nos licenciados.
«O País precisa de mão-de-obra qualificada e temos em Portugal milhares de jovens licenciados, especializados, que não encontram trabalho», afirmou Carlos Carvalhas numa iniciativa dedicada ao problema do desemprego entre os diplomados, englobada na acção «Em movimento por um Portugal com futuro», realizada no passado dia 25, em Lisboa. Para o dirigente comunista, «alguns procuram ocupação no estrangeiro, depois de terem aqui obtido formação», o que não faz reverter em benefícios para o País os conhecimentos dos licenciados portugueses. Mas para muitos é a única alternativa.
O secretário-geral comunista reafirmou a convicção de que o País não precisa de uma política «assente no trabalho precário, nos baixos salários, numa economia subcontratada». O que Portugal necessita, prossegue, é de melhor investimento, de empresas de maior valor acrescentado e não daquele investimento «tipo beduíno», que se instala cá e, quando encontra melhores negócios, parte e «deixa ficar apenas o desemprego e as dificuldades para as autarquias e para a segurança social». Se este rumo não for invertido, adverte, o desemprego – com especial incidência para o desemprego jovem qualificado – continuará a aumentar. «Sem investimento produtivo não há empresas», afirmou Carlos Carvalhas. E sem empresas não há emprego.
O secretário-geral considera que o Governo bem pode responsabilizar a actual situação internacional e a herança que herdou do anterior executivo que não conseguirá apagar as suas responsabilidades próprias, que são grandes: «Houve uma cegueira na política económica, orientada exclusivamente para o controlo do défice.» Não sendo contrabalançada a quebra do investimento privado o resultado foi a actual situação de recessão, prevista aliás pelo PCP no momento da apresentação do programa de Governo. E recessão significa «mais desemprego, mais empresas encerradas e sobretudo mais dificuldades para os jovens diplomados», afirmou Carlos Carvalhas.
Conhecimentos à venda
Antes da intervenção do secretário-geral foram dados diversos testemunhos da realidade do desemprego entre os recém licenciados. Gonçalo Caroço, que concluiu recentemente o seu curso na área da química, conta que muitos destes jovens vendem os seus conhecimentos por muito pouco, e alguns por nada, com esperança de ter a experiência necessária para poder aspirar a algo melhor. Afirmou ainda que «as necessidades do mercado de trabalho não são as necessidades do País», lembrando que a actual ausência de saídas profissionais não deve provocar um desinvestimento na educação. Em seguida, criticou a política educativa dos sucessivos governos, que acusa de se terem desresponsabilizado do ensino público. «Há licenciados a menos e não a mais», lembrou.
Luísa Mota, bióloga, é bolseira. Quando terminar a bolsa, outro bolseiro ocupará o seu lugar. Assim é assegurada a investigação científica em Portugal, assegura. Foi esta situação que levou alguns dos seus colegas para o estrangeiro. «Os estudantes portugueses são muito bem aceites nos países europeus, mesmo naqueles que consideramos mais desenvolvidos», relata. Membro fundador da Associação de Bolseiros de Investigação Científica, esteve reunida com o secretário de Estado da Ciência e do Ensino Superior reivindicando melhores condições de trabalho. «Quem quer contrato não quer trabalhar», terá respondido o governante. «Nunca pensei que o dissessem», afirmou a jovem que, contudo, não terá ficado surpreendida com a afirmação.
Carvalhas assegurou que os contributos recolhidos serão encaminhados para o grupo parlamentar, para que tomem a forma de resoluções, requerimentos e projectos de lei.
Os números do atraso
«A actual tendência para a contracção do emprego dos diplomados não é conjuntural, pois é detectável ao longo da última década, num movimento inverso ao do crescimento da oferta», afirmou Luísa Araújo, da Comissão Política, na abertura da iniciativa. Representando cerca de 18 por cento da população activa do País, os diplomados viram o seu número aumentar na última década em 153 por cento. Mas o emprego especializado esteve longe de acompanhar esse crescimento. A percentagem de quadros empregados decresceu cerca de oito por cento entre 1992 e 2000, quando se fixou em 20,5 por cento (dados do INE). Inversamente, o número de diplomados cresceu de 21 mil para mais de 54 mil no mesmo intervalo. Isto reflecte-se também no mercado de trabalho, «onde a habilitação é absolutamente desfasada da função ou actividade exercida».
Citando dados do Instituto de Emprego e Formação Profissional, Luísa Araújo afirmou que, no conjunto do desemprego, os «desempregados com habilitação superior representam 7,2 por cento do total, isto é, 29.123, denotando um crescimento contínuo no último quadriénio». Para a dirigente comunista, são os jovens recém-diplomados os mais atingidos por esta diminuição do emprego especializado.