A Comuna de Barcarena

J.M. Costa Feijão

Remontam aos primórdios do século XVI as notícias das Ferrarias de El-Rei, em Barcarena, como fábrica sustentada por conta da fazenda real de D. Manuel I, operando com engenhos movidos pela energia hidráulica proporcionada pela Ribeira de Agualva. No surto de indústrias manufactureiras que se expandiu entre 1720 e 1740, foi reinstalada a fábrica de pólvora em Barcarena, voltando a ser administrada pelo Estado, por intermédio da Junta dos Três Estados em 1753.

A inquestionável importância logística do sector era tal que, entre 1763 e 1769, os trabalhadores ligados às fábricas de pólvora de Alcântara e Barcarena, já integravam os quadros do Estado na exploração de actividades industriais e, nesse húmus de mesteres metalúrgicos e polvoristas, se foram caldeando experiências e construindo uma consciência operária.

Foram estas raízes que nos permitem entender o posterior aparecimento dum operário, Júlio da Silva Rego, como delegado ao I Congresso do PCP, em representação da Comuna de Barcarena, a 10 de Novembro de 1923.

Pelas fontes disponíveis, a organização local do comunistas cedo ganhou significativa influência política e, em 23 de Março de 1924, realiza-se a sessão solene de inauguração da sede da Comuna de Barcarena, presidida por José da Mota Amorim, da Federação Comunal de Lisboa, Maximiniano Pinheiro, da organização local, e Manuel Pedroso, da Comuna da Amadora.

Durante a sessão intervieram, entre outros, um delegado da Subcomissão Sindical da Comissão Central do PCP, e Carlos de Araújo, do Secretariado da Federação Comunal de Lisboa, que exortaram os trabalhadores a confiarem no triunfo do comunismo, chamando a atenção para a necessidade e importância da sindicalização. O acto foi abrilhantado pela Filarmónica de Brejos que tocou A Internacional, entusiasticamente aplaudida pela assistência, enquanto uma brigada de jovens comunistas constituída por: Maria José de Oliveira, Felicidade Prazeres Duarte, Sofia Moreira e Maria do Cabo, procedeu à venda de um dístico com o emblema da URSS.

Da intensa actividade dos comunistas de Barcarena falam os resultados. - Em 5 de Abril de 1925, no Largo 1.º de Maio, promovem um grande comício de propaganda, largamente participado pelos operários da Fábrica da Pólvora e onde intervieram o arsenalista do exército Júlio Luís sobre «a AIT, o Congresso de Amsterdão e a atitude da CGT», Carlos Marques, dos Partidários da ISV-Internacional Sindical Vermelha, sobre «a necessidade de instrução dos trabalhadores e dos seus filhos, como forma de se libertarem do jugo da burguesia», e o delegado da Federação Comunal de Lisboa, Manuel Ferreira Quartel, sobre «a organização operária antes e depois da Grande Guerra». - Em 4 de Novembro, realizam um comício de propaganda eleitoral e, culminando o esforço militante, em 8 de Novembro de 1925, são eleitos os primeiros candidatos comunistas, nas eleições autárquicas em Vale de Vargo, São Manços, Sobral da Adiça, Amadora e Barcarena.



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