Governo corta no investimento e nas despesas sociais

Impor sacrifícios sem resolver os problemas

O chamado Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC) apresentado pelo Governo passou no Parlamento com o apoio do PS. Frontalmente contra esteve o PCP, que defendeu a sua completa revisão, considerando que só vai agravar as dificuldades do País.

Em debate no Parlamento revisão do Programa de Estabilidade e Crescimento

Em debate na passada semana, este instrumento que condicionará as política económica e financeira para 2003-2006 foi apresentado pelo Executivo como um imperativo para cumprir as recomendações da União Europeia.

Na intervenção com que abriu o debate, a ministra de Estado e das Finanças cedo avisou que as orientações subjacentes à elaboração do PEC «são indiscutíveis» porque resultam «da recomendação da União Europeia sobre a situação de défices excessivos».

A tanta certeza e para cumprir tais objectivos juntou o mesmo receituário de sempre, ou seja, reduzir as despesas com os trabalhadores da administração pública (13,9 por cento do Produto Interno Bruto em 2006, anunciou), o que será conseguido à custa de uma «forte moderação salarial» e da «contenção nas admissões».

Esta é, aliás, uma das metas prevista no Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC) para o período de 2003 a 2006, o qual prevê ainda a redução da despesa primária (de 43,2 por cento do PIB em 2001 para 40,6 por cento em 2006), redução esta também feita à custa da diminuição de responsabilidades sociais do Estado em áreas como a saúde, a educação ou a segurança social.


As tibiezas do PS


O PS ainda esboçou expressões de alguma discordância pela forma como o executivo pretende fazer reformas em sectores como a educação. Disse mesmo ser contra os cortes no investimento, argumentando que o «equilíbrio das finanças públicas tem de ser conseguido numa perspectiva de desenvolvimento económico e de solidariedade social». Palavras ocas, afinal, já que a prevalecer esteve mesmo o apoio ao texto por si acordado na véspera com o Governo.

Sem deixar margem para quaisquer dúvidas foi a posição da bancada comunista. Pela voz de Lino de Carvalho, os comunistas reiteraram a posição de que o PEC não só não «resolve nenhum problema de fundo nas finanças públicas» como «vai criar ainda mais dificuldades ao relançamento da economia do País», para além de «obrigar os portugueses a apertar ainda mais o cinto».


Impor restrições


A demonstração fê-la o deputado do PCP ao salientar, desde logo, o carácter «excepcionalmente restritivo» do Programa apresentado pelo Governo, que, acusou, nem sequer se deu ao trabalho de questionar a própria metedologia de cálculo do déficit. Lino de Carvalho aludia ao facto de um número crescente de pessoas defenderem hoje a tese de que para aquele cálculo não devem ser incluídas as despesas de investimento.

Levantada pela bancada comunista foi igualmente a questão relativa à forma como o Governo pretende atingir os objectivos impostos de redução do déficit. É que o único meio visível na sua estratégia para atingir aquele fim parece ser o da redução da despesa. Sobretudo da despesa de investimento, mas também da corrente, sendo esta à custa de cortes nas despesas com pessoal e nas despesas sociais, designadamente em áreas como a educação, a saúde e a segurança social.

O que foi tido como «intolerável» para Lino de Carvalho, que foi mesmo mais longe ao qualificar de «criminosa» a intenção governamental de realizar «poupanças» nas políticas de educação, como se este sector não fosse «um investimento para melhorar a qualificação dos recursos humanos do País».


Benefícios aos mesmos


Outro plano onde ficaram vincadas as divergências da bancada comunista relativamente ao PEC do Governo diz respeito à componente da receita, designadamente quanto ao alargamento da base tributária. «A norma que o Governo prossegue não é a de que todo o rendimento deva ser tributado», acusou o parlamentar comunista, esclarecendo: a «norma é que aqueles que já pagam muito, como são os trabalhadores por conta de outrém, sejam mais penalizados e vejam a sua carga fiscal agravada». E a prova disso, acrescentou, é que se mantêm ilegítimos benefícios fiscais a sectores como a banca, em simultâneo com a não tributação de rendimentos de capital (as mais-valias obtidas em bolsa ou os capitais que circulam pelo off-shore da Madeira), para não falar da gigantesca onda de fraude e evasão fiscais, relativamente à qual, acusou Lino de Carvalho, ao Governo falta vontade política para lhe dar firme combate.


Tempos difíceis


Deixada pela formação comunista foi ainda a ideia de que o ano em curso e os que se avizinham trazem tempos difíceis para os portugueses. É que, esgotados expedientes como o das portagens da CREL para obter receitas extradordinárias – e face à ausência de medidas verdadeiramente estruturantes – o Governo, na sua obstinação em cumprir o déficit, vai impor «políticas de sacrifício» que se traduzirão em mais desemprego, aumentos de impostos, menores salários e piores condições de vida.

 

PCP desafia Sampaio a juntar a sua voz
Por mais justiça social

 

Um desafio ao Presidente da República foi lançado pela bancada comunista na passada semana. A referência ao chefe de Estado foi feita pelo deputado comunista Lino de Carvalho já no final do debate parlamentar sobre o Programa de Estabilidade e Convergência apresentado pelo Governo. Por si recordadas foram posições de Jorge Sampaio, em Florença e mais recentemente na mensagem de Ano Novo, nas quais revelou a sua preocupação quanto às «consequências económicas e sociais do Pacto de Estabilidade da União Europeia», apelando simultaneamente «a uma política de combate à fraude e à evasão fiscal».

Ora, no entender do PCP, o Presidente da República tem uma ocasião soberana para se pronunciar contra o Programa de Estabilidade e Crescimento do Governo. Porquê ? Porque este Programa para 2003-2006, condicionador da política orçamental, como foi sublinhado, é «a expressão exactamente oposta do que defende» Sampaio.

Por isso, na perspectiva dos comunistas, «tem uma nova razão para juntar a sua voz à daqueles que entendem que é chegada a hora de uma outra racionalidade na definição e articulação dos programas de finanças públicas da zona euro, dando mais espaço às necessidades diferenciadas de cada Estado, conjugando-os com desenvolvimento e justiça social».



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