Rivalidade e concertação

Pedro Guerreiro

O Governo quer continuar a amarrar Portugal à perigosa deriva belicista da NATO

Anunciada como uma ‘celebração’, a Cimeira da NATO, que ontem terminou, ficou assinalada por arrufos, recados, juras de intenções e por graves decisões, que não devem ser menosprezadas.

Os mais significativos episódios que rodearam esta Cimeira talvez tenham sido aqueles que se desenrolaram em torno das declarações do Presidente francês, Emmanuel Macron, que havia antecipadamente ‘diagnosticado’ que a NATO está em ‘morte cerebral’.

Os grandes interesses económicos e financeiros que Macron representa reagem mal à imposição da ‘América primeiro’, protagonizada pela Administração Trump, que pressupõe e exige o total alinhamento e acatamento dos ditames dos EUA por parte dos seus aliados.

O imperialismo norte-americano reafirma não só a exigência da subordinação política dos seus aliados, como da sua subalternização, senão mesmo dependência, no plano económico, tecnológico e militar.

Na salvaguarda do domínio hegemónico do imperialismo norte-americano, não há veleidades para os aliados – assim o determina a tendência de declínio relativo dos EUA, no quadro do aprofundamento da crise estrutural do capitalismo e do processo de rearrumação de forças no plano mundial.

Para os EUA, a NATO foi criada para servir os seus interesses e objectivos; se assim deixar de ser, não haverá razão para a NATO continuar a existir. Em última instância, é esta a base da dita ‘relação de confiança’ dos EUA com os seus aliados.

São estas as ‘dores’ que fazem Macron ansiar por uma ‘aliança entre pares’, que seja sustentada numa iniciativa militar ‘europeia’ liderada por si; prevenir que os seus interesses não sejam sacrificados pela estratégia ‘unilateral’ dos EUA; ou apontar que não basta a ‘partilha de encargos’ – incluindo pela ‘obrigação’ da compra de meios militares norte-americanos –, exigida pelos EUA, mas que é, igualmente, necessária na NATO uma partilha (pelo menos, mais equilibrada) dos propósitos, das possibilidades e dos despojos das operações de desestabilização e guerras de agressão do imperialismo – veja-se as divergências entre as grandes potências da NATO quanto à sua guerra de agressão contra a Síria.

No entanto, apesar das rivalidades, da conflitualidade de interesses, das contradições, as grandes potências imperialistas continuam a convergir no militarismo, na militarização da UE como pilar europeu da NATO, na corrida armamentista – incluindo as armas nucleares –, na militarização do espaço, no desrespeito do direito internacional, na ingerência e na agressão contra os Estados e povos que consideram constituir um obstáculo à imposição da sua hegemonia mundial – apontando como seus alvos estratégicos a Rússia e a China – e reforçando a NATO como seu instrumento de guerra.

A NATO anunciou nesta Cimeira que, entre 2016 e 2020, os seus membros – não incluindo os EUA – aumentarão as suas despesas militares em cerca de 130 mil milhões de dólares, esperando atingir a soma de 400 mil milhões de dólares em 2024. Recorde-se que, em 2018, os 29 países integrantes da NATO gastaram tanto em despesas militares como os restantes 164 países do mundo.

É a esta perigosa deriva belicista que, em confronto com a Constituição da República Portuguesa e os interesses e anseios do povo português, o Governo português pretende continuar a amarrar Portugal.




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