Grécia 1967

Filipe Diniz

Há 50 anos um dos jornais do salazarismo dava a seguinte notícia: «Os turistas que desejem visitar a Grécia devem apresentar-se barbeados e não terem cabelos compridos – decidiu o governo grego» (DN, 11.05.1967). O governo grego em causa saíra poucos dias antes do golpe fascista dos coronéis. Acerca do qual um jornal clandestino escrevia: «De novo, como nos anos trágicos do domínio de Karamanlis, milhares de democratas […] foram lançados nas prisões, submetidos a violências inauditas, ameaçados de morte» (Avante! Nº 378, Maio 1967).

Os golpes do passado ajudam a entender os do presente (os realizados ou as tentativas em curso). Na Grécia dos anos 60, como em qualquer outro lugar do mundo nos dias de hoje, a primeira coisa a averiguar será o que fazem os EUA. O que na altura pensavam (D.A. Schmitz, «The United States and Right-Wing Dictatorships, 1965-1989») era que para a Grécia existia um «consenso» que nunca deveria ser rompido: a exclusão dos comunistas; o papel da monarquia; a integração na NATO. Caso tal consenso fosse posto em causa uma das hipóteses a considerar seria a «imposição de um regime autoritário como meio para restaurar a ordem política.» Tal ameaça não vinha só dos comunistas, vinha de Giorgios Papandreou, «um cripto-comunista». Logo nos primeiros meses após o golpe, 6188 comunistas e outros democratas foram detidos ou exilados, 3500 foram presos em centros de tortura. Muitas dezenas de milhares permaneceram longos anos em campos de concentração.

Passado um mês sobre o golpe o presidente Johnson dirigiu-se ao novo governo: «A Grécia é hoje livre e próspera», «os EUA felicitam-se pelo papel assumido em salvar a Grécia da agressão e do totalitarismo.»

50 anos depois, que há de diferente? O Avante! é legal e o DN não falaria só de cabelos compridos: uma parte dos seus colunistas não deixaria de insultar o PCP por condenar essa «salvação da Grécia da agressão e do totalitarismo




Mais artigos de: Opinião

«Baratas tontas»

No quadro de excepcional gravidade dos incêndios florestais, que o PSD devia considerar «diabólico», abundam os comentaristas da «pós verdade», apologetas ou subcontratados da operação de ocultação, mistificação e branqueamento da...

A crise estrutural do capitalismo

O modo de produção capitalista representou um avanço progressista na história da Humanidade apesar da violência inaudita da acumulação primitiva de capital, de novas e desumanas formas de exploração de classe, das agudas contradições e crises...

A árvore

A queda do carvalho de 200 anos no Funchal, que matou 13 pessoas e feriu dezenas de outras no início da mais importante procissão da Madeira, deu origem, no apuramento de responsabilidades – que ainda se está a fazer – a um repentino vácuo na averiguação da...

Viver e lutar com confiança e alegria

Neste tempo de grande conturbação em que o sistema capitalista vive uma crise profunda, aprofundando a sua natureza exploradora, opressora, agressiva e predadora, deixando um rasto de destruição económica e social, fazendo pairar sobre a humanidade o espectro da generalização da guerra ao mesmo tempo que desenvolve e incentiva provocações, conflitos, actos terroristas, boicotes económicos e sociais, subsistem enormes potencialidades.

Por falar de estratégias

Quase dois anos depois de ter perdido a maioria que detinha com o CDS na Assembleia da República o PSD continua tão ressabiado e em estado de negação que aparentemente nem se dá conta das suas contradições e tiros no pé sempre que um seu dirigente abre a boca. Desde...