TAP: um ano depois, continuar a resistir às privatizações

Manuel Gouveia

A TAP esteve para acabar sempre que foi privatizada, em 1998 e em 2020

Lusa

Sem surpresa, o Governo do PSD/CDS anunciou um novo processo de privatização da TAP. Um processo que, no fundo, foi lançado pelo anterior governo do PS, na boa tradição da farsa política onde PS e PSD executam – no essencial – a mesma política, sempre em feroz oposição um ao outro.

Como esta semana faz um ano que foram aprovadas as conclusões da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à TAP, parece-nos uma boa ocasião para recordar essas conclusões.

Comecemos pelo mote para a criação da CPI: a indemnização de meio milhão de euros paga a Alexandra Reis, claramente ilegal no quadro de uma empresa pública, mas perfeitamente legal no quadro de uma empresa privada. Um ano depois, face a uma situação formalmente diferente mas eticamente igual – a saída da actual Secretária de Estado Cristina Dias da CP para a AMT com uma indemnização de 80 mil euros –, o PSD e o PS trocaram os seus papéis, respectivamente de oposição e governo, passando um de acusador inclemente a compreensivo defensor, e o outro vice-versa, expondo a profunda hipocrisia de ambos. Que continuam de acordo, como há um ano, no fundamental: a solução é privatizar, que assim passa a prevaricação a ser legal, e se a privatização for a sério nem nunca se saberá dos pagamentos (como não se soube até à CPI dos milhões em indemnizações pagos pela gestão privada da TAP e ainda hoje não se sabe quanto foram ganhar na ANA privada os gestores públicos da ANA em privatização).

Mas claro que a CPI nunca foi nem nunca poderia ser sobre uma indemnização. O objectivo dos que a viabilizaram era criar um instrumento para a promoção da privatização da TAP, só que o tiro saiu-lhes pela culatra. E teses tantas vezes afirmadas pelo PCP – e sempre ignoradas ou desmentidas pelos sucessivos governos – ficaram comprovadas perante os factos publicamente expostos. Tanto assim é que o PCP até decidiu publicar um livro na sequência da CPI. Esta deixou claro que:

  • A privatização de 2015 tinha sido uma fraude, com a TAP a ser comprada com o dinheiro da própria TAP, num negócio intermediado pela Airbus (que basicamente adiantou a David Neeleman o dinheiro que a TAP lhe devolveria em dobro depois de efectuada a privatização);

  • A TAP, SA não dava prejuízo, e que os seus maiores prejuízos foram na gestão privada (e no tempo passado desde então a TAP, SA reforçou os seus lucros);

  • Os prejuízos do grupo TAP resultavam, no essencial, de uma única operação – a compra da Manutenção da Varig, a VEM – que lhe custou mais de mil milhões de euros e foi apoiada e mantida por todos os governos desde 2005 (mas hoje a TAP está finalmente livre desse parasita);

  • A TAP dá um extraordinário contributo para a economia nacional (com a tralha ideológica neoliberal a ser arrumada, por exemplo, pelo facto de, em 10 anos, os contributos para a Segurança Social portuguesa da TAP e da Ryanair serem, respectivamente, de 1400 milhões e 40 milhões de euros);

  • A TAP esteve para acabar sempre que foi privatizada: em 1998, aquando da venda à Swissair; e em 2020, quando os privados se recusaram a investir e o modelo de negócios de alto risco imposto à TAP pela gestão privada explodiu com a pandemia.

E como contra factos não há argumentos, é sem argumentos, e apoiando-se apenas na fé no Deus Mercado, que PS e PSD insistem na «inevitável» privatização da TAP, com o apoio mais ou menos envergonhado de CDS, IL e CH. Apoiados na fé e na força material que a impõe, o interesse e o poder das classes dominantes. Que terá que ser derrotado pela inevitável luta dos trabalhadores, dos democratas e dos patriotas.

 



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