Chumbo de proposta do PCP adia solução para a regularização de imigrantes
Não passou no Parlamento o programa de emergência proposto pelo PCP para resolver a situação calamitosa em que está a regularização das autorizações de residência de imigrantes no nosso País.
O volume de processos exige uma resposta célere
Face aos mais de 400 mil processos pendentes e que aguardam por resolução na Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA), a proposta da formação comunista passava, como sublinhou António Filipe, dia 27, ao lançar o debate, por uma «mobilização transitória e excepcional de recursos humanos, espaços físicos e meios logísticos». Mais exactamente, tratava-se de «num período de seis meses, entre Outubro de 2024 e Março de 2025, proceder à regularização dos processo pendentes».
O projecto de lei foi chumbado pelos votos contra de PSD, CH, CDS-PPe IL, com a abstenção do PS, votando favoravelmente as restantes bancadas.
Da parte dos grupos parlamentares, em particular do PSD e CDS, não veio ao debate nenhuma proposta alternativa consentânea com a gravidade que o problema assume. Isto apesar da insistência de António Filipe e do desafio que lançou para que o fizessem: «O PCP tem aqui uma proposta concreta. Quem tiver proposta melhor, que a apresente. Os problemas já temos, só faltam as soluções».
Ora a verdade é que nenhuma surgiu. De resto, a posição das bancadas que apoiam o Governo, PSD e CDS, com isso justificando a recusa da proposta comunista, baseou-se apenas no argumento de que a medida anunciada pelo Governo de contratar mais 300 funcionários, a juntar aos meios de que a AIMA dispõe, seria suficiente para resolver os 400 mil processos em atraso.
Visão do PSD/CDS e do Governo que não foi compartilhada de todo pela bancada comunista, que, além do mais, lembrou que a AIMA tem de continuar a funcionar, não pode parar tudo para resolver os 400 mil processos.
«Não é possível com os actuais recursos humanos, num prazo razoável, resolver tão volumoso número de processos em atraso», reiterou António Filipe, defendendo que perante uma «situação excepcional» como é esta, o que se exige é uma «contratação excepcional de pessoas» que lhe dê resposta, por um «curto período, com mais postos de atendimento».
Problemas ainda maiores
Aliás, a não ser assim, as medidas anunciadas pelo Governo não só não resolverão o problema dos processos pendentes, mantendo em situação irregular pessoas que entraram legalmente em Portugal, como, ignorando as necessidades do mercado de trabalho, acabarão por promover a imigração ilegal.
«É isso que não queremos, favorecer o tráfico de seres humanos, favorecer as máfias em torno da imigração e da exploração da vida destas pessoas», frisou a líder parlamentar do PCP, depois de se congratular com o facto de as iniciativas da sua bancada (o debate e a chamada do ministro da tutela à comissão) terem ocorrido em boa hora, já que tiveram pelo menos o efeito de obrigar o Governo a anunciar o recrutamento dos referidos 300 trabalhadores para a AIMA.
Só que, face às carências de pessoal e à necessidade de dar uma resposta efectiva aos imigrantes que têm a sua situação por regularizar, esse número é manifestamente insuficiente. «É preciso ir muito mais longe, porque é preciso dar uma resposta célere», reclamou Paula Santos, lembrando o «desespero desses imigrantes, que não conseguem obter um contrato de trabalho, um contrato de arrendamento e que estão em situações de grande fragilidades».
«Vão alargar o atendimento, para que seja mais próximo, desconcentrado; vão promover mediadores culturais, que estão em situação de precariedade e que exercem funções permanentes mas não têm vínculo público, como propõe o PCP e consta da sua proposta?», foram perguntas formuladas pela líder parlamentar comunista para as quais não foi dada resposta pelos partidos que apoiam o Governo.
Desastre anunciado
A situação calamitosa a que se chegou na regularização das autorizações de residência de imigrantes tem um histórico e tem responsáveis. Mas houve também quem em devido tempo tivesse chamado a atenção para o desastre que estava em marcha. Em Outubro de 2023, lembrou no debate o deputado Alfredo Maia, foi o que fez o PCP ao alertar para a «falta de aplicação de medidas concretas ao nível da AIMA para resolver o problema de um contingente de imigrantes que já nessa altura ultrapassava os 300 mil e que continuavam a não ter resposta sequer para o atendimento».
Na altura, recordou, foi invocado o estado de transição de procedimentos da nova agência – que já levava três anos - , mas o certo é que o governo de então nada fez, e o PS inviabilizou a ida à AR quer da ministra com a tutela da imigração quer do conselho directivo da AIMA para explicarem como iriam resolver esta situação de verdadeira emergência que já então se colocava.
Desmontada demagogia do Chega
A tentativa de André Ventura de atribuir também ao PCP responsabilidades pela extinção do SEF - foi a «esquerda», disse o líder do Chega, metendo tudo no mesmo saco –, mereceu o firme repúdio de António Filipe, que lembrou que os comunistas não só «não são parte nessa decisão», como sempre a criticaram.
A questão da «nacionalidade», introduzida no debate também pelo Chega, foi igualmente objecto de crítica acesa do deputado comunista, que esclareceu que os «nacionais portugueses não são imigrantes, têm nacionalidade portuguesa, são nacionais como todos nós». Achou mesmo estranho, aliás, que André Ventura tenha suscitado a questão da «nacionalidade», dizendo estar preocupado com o facto de Portugal ter alterado a lei da nacionalidade de forma a dar mais relevância ao jus soli, quando, salientou António Filipe, «não se preocupa que a nacionalidade portuguesa seja vendida nas agências de viagens de Telavive, ao abrigo da lei dos sefardita». Mais, ainda a este propósito, não deixou de recordar o facto de o Chega ter votado contra o projecto de lei do PCP que visava acabar com esta situação, este sim «realmente um factor de desprestígio para Portugal».
Saudação às associações de imigrantes
A assistir ao debate das galerias do hemiciclo, a convite do PCP, estiveram cerca de duas dezenas de delegações em representação de associações de imigrantes, designadamente a Casa do Brasil de Lisboa, a ACAP – A Casa Árabe Portuguesa, a Frente Anti-Racista, a ACITMMM – Associação Comunidade Islâmica da Tapada das Mercês e Mem-Martins, a ACAA – Associação da Comunidade Angolana em Almada.
No final do debate, uma delegação integrada também pelos deputados Paula Santos e António Filipe, dirigiu-se ao local onde estavam as associações e saudou-as em nome do PCP.