Problemas objectivos e teias que se tecem

Rui Fernandes

O tempo é de res­posta ur­gente aos pro­blemas dos pro­fis­si­o­nais das forças de se­gu­rança

Quem faz uma vez, não faz duas ne­ces­sa­ri­a­mente, mas quem faz dez, com cer­teza faz onze
Charles Cha­plin


Não va­lerá a pena ocupar es­paço de texto a ex­plicar tudo o que nos úl­timos três meses se tem pas­sado com as forças e ser­viços de se­gu­rança, tendo como te­má­tica cen­tral o de­no­mi­nado su­ple­mento. É ma­téria am­pla­mente tra­tada. Todas as forças po­lí­ticas re­co­nhe­ceram a in­jus­tiça, sendo que o PCP tinha apre­sen­tado em mo­mentos di­fe­rentes ini­ci­a­tivas na As­sem­bleia da Re­pú­blica vi­sando a va­lo­ri­zação do sub­sídio de risco, ini­ci­a­tivas essas re­pro­vadas.

O PCP, aliás, além dessa ma­téria, tinha apre­sen­tado também todo um outro con­junto de pro­jectos de que se des­tacam: saúde e se­gu­rança nos lo­cais de tra­balho, res­pon­dendo também aos pro­blemas do sui­cídio; alar­ga­mento de di­reitos sócio-pro­fis­si­o­nais na GNR; ne­ces­si­dade de re­visão da ta­bela re­mu­ne­ra­tória, entre ou­tros. Ou seja, ma­té­rias que, no seu efeito geral, con­du­zi­riam à va­lo­ri­zação ma­te­rial e pro­fis­si­onal: todas chum­badas por efeito da con­ju­gação de votos em ge­o­me­tria va­riável do PS, PSD, IL e Chega. Mas também parte delas, en­tre­tanto, re­a­pre­sen­tadas.

Somos che­gados ao pós-elei­ções e a uma pri­meira reu­nião com a mi­nistra da Ad­mi­nis­tração In­terna (MAI) su­cede-se uma se­gunda, esta sim, já com o ob­jec­tivo de ir tratar do as­sunto. O re­sul­tado foi que as es­tru­turas saem da reu­nião de cara à banda, como diz o povo. Em re­sul­tado disto, foram postas em marcha umas ma­no­bras de di­versão com in­for­mação di­versa e con­tra­di­tória, aden­sando nas es­tru­turas um sen­ti­mento de des­con­fi­ança.

Foi só um pro­blema de co­mu­ni­cação? A sua origem si­tuou-se na MAI ou no Se­cre­tário de Es­tado Telmo Cor­reia? Não sa­bemos e não pre­ten­demos tecer juízos de in­tenção. Os efeitos ob­jec­tivos, esses, já não são re­mis­sí­veis e só au­men­taram as di­fi­cul­dades. Acresce que tudo isto se de­sen­volve no con­texto de uma ba­teria de aná­lises e co­men­tá­rios sobre o es­tado das fi­nanças pú­blicas, in­cluindo por via de re­cados da União Eu­ro­peia e de­ci­sões, com o PS, o PSD e o CDS a vo­tarem a favor das novas re­gras or­ça­men­tais que im­põem cortes na des­pesa pú­blica do País em 2,8 mil mi­lhões de euros. Num ápice, o que era re­so­lúvel, até mesmo com o an­te­rior go­verno em gestão, passou a ser um pro­blema. Há até quem use como tí­tulo de ar­tigo Quando co­meçam as reu­niões para o corte na des­pesa?

É neste am­bi­ente que o Go­verno de­cide exo­nerar o di­rector na­ci­onal Barros Cor­reia, há menos de um ano no cargo. Fique claro que não está em causa a le­gi­ti­mi­dade para pro­ceder à al­te­ração, nem a opção es­co­lhida do su­pe­rin­ten­dente Luís Car­rilho. Mas a ar­gu­men­tação usada não per­mitiu des­ligar a de­cisão do am­bi­ente exis­tente dentro da PSP, sa­bido qual era a sua li­gação aos pro­fis­si­o­nais.

Aliás, isso ficou claro com os di­versos pro­nun­ci­a­mentos efec­tu­ados sobre o ocor­rido. O tempo, como sempre, trará à tona mais ele­mentos que aju­darão a um en­ten­di­mento mais claro das op­ções go­ver­na­men­tais. Também aqui, a emis­sária foi a MAI, como não po­deria deixar de ser, pessoa que pelo seu per­curso, por certo co­nhecia o exo­ne­rado. Mas, no con­texto vi­vido no seio da PSP, era esse o mo­mento? Não es­tava Barros Cor­reia em con­di­ções de im­ple­mentar a re­or­ga­ni­zação e re­es­tru­tu­ração da PSP, termos usados como jus­ti­fi­cação da me­dida, ou dela era dis­cor­dante? Foi re­al­mente essa a von­tade da MAI ou houve ra­zões de so­li­da­ri­e­dade go­ver­na­mental? So­li­da­ri­e­dade essa que a MAI ex­pressou re­la­ti­va­mente a afir­ma­ções atri­buídas ao seu co­lega Nuno Melo, mi­nistro da De­fesa. Mais uma vez o tempo dará mais luz ao caso.

A PSP tem um novo di­rector na­ci­onal, mas os pro­blemas que afectam a PSP não se al­te­raram. Tal como existe uma nova MAI, de­pois de muitos ou­tros mi­nis­tros de vá­rios go­vernos, mas os pro­blemas que afectam os pro­fis­si­o­nais não só não têm tido res­posta, como se têm vindo pau­la­ti­na­mente a agravar. É que não há re­es­tru­tu­ração e re­or­ga­ni­zação que não te­nham de co­meçar pelas res­posta aos muitos pro­blemas que afectam os que dão corpo à Ins­ti­tuição.

O tempo é, pois, de res­posta ur­gente aos pro­blemas, que vão para além do su­ple­mento. Desde logo, que o Go­verno cumpra o que pro­meteu e não pro­cure em­bru­lhar as res­postas a pro­blemas ob­jec­tivos numa teia com­plexa. É isso que pre­cisam os pro­fis­si­o­nais, o povo e o País.



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