Bebés na redoma

Margarida Botelho

Já tem dois meses a notícia de que a PSP de Faro fez queixa à CPCJ de uma mãe que levou o bebé a uma manifestação do Dia da Mulher. O PCP fez na altura uma pergunta escrita ao Ministério da Administração Interna. O governo – o anterior – confirma a versão que a PSP já tinha dado aos jornais: que estava «temperatura baixa, vento e chuva», que a PSP abordou a senhora para «proteger o menor» e que «a cidadã desvalorizou a análise de risco efectuada e transmitida pelos polícias, tendo participado, com o bebé, na manifestação, uma vez que o mesmo estava protegido por um plástico». Afiança o Ministério que «o direito de manifestação nunca esteve em causa, tendo a PSP permitido a participação da cidadã na manifestação».

O que mais se estranha na resposta é a reafirmação de uma situação que não tem ponta por onde se lhe pegue. A PSP não tem por hábito fazer queixa de pessoas que circulam na via pública com bebés. Não é proibido levá-los à creche, ao centro de saúde ou passear quando chove, ou quando está calor. Esta mãe fez o que é normal: proteger o carrinho com uma capa da chuva – aquilo a que o MAI chama «um plástico». O problema é a meteorologia ou o sítio onde a mãe levou o bebé?

Participar em manifestações é um direito, que as mães de bebés também têm. Não perdem o discernimento sobre o que é melhor para os filhos nem precisam de autorizações. Não é admissível por isso a expressão «tendo a PSP permitido a participação da cidadã na manifestação».

Este é um daqueles casos insólitos de que nos vamos rir daqui a uns anos. Mas revela um quadro de valores antidemocráticos, de preconceito sobre as mulheres e sobre as crianças, que é preocupante. Sobretudo porque não é apenas o erro de um agente, é reafirmado pela PSP e pelo MAI. Tiveram felizmente a resposta necessária nas comemorações do 25 de Abril e do 1.º de Maio, cheias de mães e pais, felizes com as suas crianças, em gigantescas manifestações.



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