O direito ao desporto das pessoas com deficiência

Leonor Moniz Pereira

O des­porto pro­move a au­to­nomia e a mo­bi­li­dade da pessoa com de­fi­ci­ência

A Cons­ti­tuição da Re­pú­blica Por­tu­guesa (ar­tigo 79.º n.º 1) con­si­dera o des­porto como um di­reito fun­da­mental de todos os ci­da­dãos, não sendo ex­cepção as pes­soas com de­fi­ci­ência.

Estas, como todas as ou­tras pes­soas, de­sejam ter ao longo da vida o má­ximo de au­to­nomia, no que res­peita à ca­pa­ci­dade de de­cisão e de exe­cução (in­de­pen­dência fí­sica).

Se­gundo o CDC (2023)i, as pes­soas com de­fi­ci­ência são mais se­den­tá­rias que as pes­soas sem de­fi­ci­ência e têm mais pre­dis­po­sição para a de­pressão, a obe­si­dade, as do­enças car­di­o­vas­cu­lares e a di­a­betes tipo 2, mas quando fazem exer­cício di­mi­nuem sig­ni­fi­ca­ti­va­mente essa pro­ba­bi­li­dade.

Em Por­tugal, se­gundo o IPDJ, exis­tiram apenas 3091 pes­soas com de­fi­ci­ência ins­critas como pra­ti­cantes de des­porto fe­de­rado em 2023, o que re­pre­senta um nú­mero muito re­du­zido de pra­ti­cantes, se con­si­de­rarmos que 10% da po­pu­lação por­tu­guesa tem de­fi­ci­ência, em­bora se saiba que nem todas estão abran­gidas pela clas­si­fi­cação des­por­tiva.

Con­tri­buem para o se­den­ta­rismo das pes­soas com de­fi­ci­ência di­versos tipos de con­di­ci­o­nantes que não se en­con­tram re­la­ci­o­nadas com a sua de­fi­ci­ência e que li­mitam a sua par­ti­ci­pação nas ac­ti­vi­dades des­por­tivas, no­me­a­da­mente de âm­bito:

- Es­tru­tural, re­la­tivas à or­ga­ni­zação da acti­vi­dade des­por­tiva;

- Ati­tu­dinal, re­la­tivas à exis­tência de com­por­ta­mentos de su­per­pro­tecção da pessoa com de­fi­ci­ência ou da falta de in­for­mação sobre como o des­porto pode con­tri­buir para a au­to­con­fi­ança per­mi­tindo acre­ditar que ser di­fe­rente não quer dizer ser menos capaz, mas fazer de ma­neira di­fe­rente e de­sen­vol­vendo com­pe­tên­cias para lidar com as emo­ções e o stress;

- Am­bi­ental, re­la­tivas à exis­tência de bar­reiras ar­qui­tec­tó­nicas não só no local de prá­tica, como na des­lo­cação para o local.

Todos estes fac­tores con­tri­buem para que a co­mu­ni­dade não es­teja pre­pa­rada para, de forma in­te­grada e con­ti­nuada, aco­lher nos seus pro­gramas des­por­tivos as pes­soas com de­fi­ci­ência. Assim, torna-se im­pres­cin­dível criar con­di­ções para que estas possam com equi­dade par­ti­cipar nas ac­ti­vi­dades des­por­tivas e per­tencer a uma co­mu­ni­dade fi­si­ca­mente ac­tiva.

Se­gundo a ONU (2008)ii, a al­te­ração é pos­sível pela co­la­bo­ração con­ti­nuada entre sec­tores e or­ga­ni­za­ções no­me­a­da­mente da saúde, edu­cação, des­porto e lazer, se­gu­rança so­cial, or­de­na­mento e pla­ne­a­mento do ter­ri­tório, trans­portes, meios de co­mu­ni­cação so­cial e as or­ga­ni­za­ções das pes­soas com de­fi­ci­ência. Con­si­dera fun­da­mental atri­buir fun­ções a cada um dos sec­tores para que ac­tuem em co­o­pe­ração de forma ar­ti­cu­lada e com­ple­mentar e que, em co­la­bo­ração com as or­ga­ni­za­ções das pes­soas com de­fi­ci­ência, pro­movam a mu­dança em re­lação à par­ti­ci­pação nas ac­ti­vi­dades des­por­tivas das pes­soas com de­fi­ci­ência.

É atri­buída grande im­por­tância a esta ar­ti­cu­lação, não só para a cri­ação de en­vol­vi­mentos sau­dá­veis e aces­sí­veis que con­videm à prá­tica des­por­tiva, como no de­sen­vol­vi­mento de mo­vi­mentos so­ciais que con­tri­buam para a mu­dança de ati­tudes e de men­ta­li­dades de­mons­trando que a ac­ti­vi­dade é di­ver­tida, de es­colha fácil, pas­sível de ser efec­tuada por todos e com be­ne­fí­cios para a in­clusão so­cial e para a saúde de todos, sem ex­cepção.

Pa­rece, por­tanto, ser fun­da­mental o es­ta­be­le­ci­mento de uma po­lí­tica que fo­mente de forma con­ti­nuada esta ar­ti­cu­lação, que per­mita a exis­tência de um sis­tema des­por­tivo que cor­res­ponda ao con­ceito de des­porto que in­clua a ac­ti­vi­dade fí­sica, o exer­cício fí­sico, e a ac­ti­vi­dade des­por­tiva, tal como é pro­posto pelo Con­selho da Eu­ropa (2022)iii.

O des­porto de­verá passar a pro­mover a au­to­nomia e a mo­bi­li­dade da pessoa com de­fi­ci­ência, assim como a exis­tência de pro­gramas des­por­tivos na co­mu­ni­dade que con­tri­buam para um es­tilo de vida mais sau­dável e ac­tivo dessas pes­soas, re­du­zindo o seu com­por­ta­mento se­den­tário e con­tri­buindo para o seu bem-estar e qua­li­dade de vida.

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iCDC – Cen­tres for Di­sease Con­trol and Pre­ven­tion (2023). Di­sa­bi­lity & He­alth Re­sources for Fa­ci­li­ta­ting In­clu­sion and Over­co­ming Bar­riers: Re­cre­a­tion and Fit­ness CDC 19 de Ou­tubro de 2023 https://​www.cdc.gov/​ncbddd/​di­sa­bi­lityandhe­alth

iiONU (2008). Sport and per­sons with di­sa­bi­li­ties: fos­te­ring in­clu­sion and well-being. Em: Har­nes­sing the power of sport for de­ve­lop­ment and peace: re­com­men­da­tions to go­vern­ments. To­ronto: Right to Play: p. 167–200

iii Council of Eu­rope (2022) Re­vised Eu­ro­pean Sports Charter 2022 Re­com­men­da­tion CM/​Rec (2021). Adopted by the Com­mittee of Mi­nis­ters on 13 Oc­tober 2021 Re­vised Eu­ro­pean Sports Charter (coe.int).




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