Espaço Amador e Cinema Outro
Era propósito do cinema produzido em espaço amador competir com o realizado no contexto profissional
Como lembrámos em artigo anterior, Roger Odin, estudioso do cinema amador, identificou distintas três tipologias cinemáticas associadas àquela categoria que designou por «espaço familiar», «espaço amador» e «espaço do cinema independente» (ou do «cinema outro»). Antes demorámo-nos na caracterização da primeira dessas tipologias, desta vez colocamos o foco nas restantes, não sem antes deixar a promessa de voltar a pensar cada uma delas futuramente tendo em conta as transformações e possibilidades contemporâneas verificadas no território de criação e difusão de imagens em movimento.
Odin usou a expressão «espaço amador» para referir-se aos filmes, que diferentemente dos anteriores, eram realizados no e para o contexto dos clubes de cineastas amadores. Os filmes produzidos neste espaço distinguiam-se dos elaborados no espaço familiar por uma procura de sofisticação técnica e estética que implicava os seguintes aspectos: a inclusão de elementos inexistentes nos filmes domésticos, tais como uma ficha técnica e edição de imagem; a pesquisa sobre a linguagem e a técnica cinematográficas; a escolha de temas além da esfera familiar; a utilização de formatos superiores. Era um propósito deste cinema competir com o produzido no contexto profissional, embora os meios de produção à sua disposição não permitissem emular os resultados profissionais e os filmes aí produzidos tivessem dificuldade em romper com o espaço de circulação amador.
O mesmo autor integrou ainda no cinema amador o espaço do «cinema independente» ou do «cinema outro». Esta categorização pode ser compreendida em função de vários factores: a reivindicação, feita por alguns dos cineastas associados a estas esferas, de pertença ao espaço amador (observado por estes como potenciador da criação, face à diminuição de normas e constrangimentos); a mobilização frequente de materiais amadores, valorizados devido ao baixo custo, à facilidade de manuseamento e às possibilidades expressivas alternativas; o desrespeito de algum cinema independente pelo cânone técnico e estético do cinema institucional; o tratamento de temáticas relacionadas com o quotidiano, a vida familiar ou a autobiografia.
No âmbito da «corrente formal», a primeira subdivisão que propôs para esta tipologia, Odin integrou o designado cinema experimental e algumas produções de videoarte ou destinadas a ser apresentadas em museus ou galerias. Por seu turno, na «corrente engajada ou militante», o autor incluiu o cinema dedicado a reflectir sobre as grandes temáticas políticas, sociais e culturais. Neste contexto, observou duas tendências principais: aquela que entendia o cinema como um meio de comunicação para transmitir mensagens e palavras de ordem e aquela que pretendia introduzir inovações na gramática cinemática. Finalmente, na «corrente pessoal», integrou o cinema que manifestava como objectivo o registo autobiográfico ou o autorretrato.