O que é mesmo preciso é outra política
As Forças Armadas têm de ser valorizadas e dignificadas
O mês de Agosto foi prolixo em notícias sobre as Forças Armadas (FA). A parte fundamental das mesmas foi um repositório de assuntos anteriores (esquemas em negócios, verbas que não chegam, estado dos meios e efectivos), com mais ou menos opinião anónima a sustentar tal ou tal ideia, com mais ou menos exercício de escrita criativa.
Até o assunto do recrutamento de estrangeiros para responder à falta de efectivos já tinha aparecido há uns largos meses, desta feita exemplificado com outros países que adoptaram tal caminho. Alguns foram mais à especialidade e citam o caso dos Gurkas e da Legião Estrangeira. Será que sabem daquilo que estão a falar? Mas não satisfeitos vão ainda mais fundo e referem a vantagem da elegibilidade para o serviço militar a jovens do sexo masculino de determinadas nações (Miguel Pinto Correia, Jornal da Madeira, 24/8). Não satisfeito, considera que isso, recrutamento de estrangeiros, reforçaria o sentimento de pertença para, noutro momento, afirmar que ao fim de cinco anos obteriam a cidadania portuguesa. Sentimento de pertença?
Já o dissemos em momento anterior e agora repete-se: todos os cidadãos que tenham nacionalidade portuguesa, independentemente da sua origem, e cumpram os quesitos legais, podem concorrer às FA ou a qualquer outro concurso na Administração Pública. Coisa distinta é ir recrutar estrangeiros a troco do «negócio» da obtenção da nacionalidade. Isto é um caminho com uma outra natureza e que se rejeita.
Portugal não precisa nem de Gurkas, nem de companhias de Legião Estrangeira para se constituírem em forças expedicionárias. Nem precisa de tropas travestidas de outra coisa para cumprir desideratos obscuros algures, como é prática corrente de alguns países.
Portugal precisa de uma outra política que valorize e dignifique as Forças Armadas, desde logo o seu capital humano. Aliás, uma política que deve ser extensiva a toda a Administração Pública, dado o grau de depauperamento a que tem sido conduzida.
Uma política que, no caso das FA, articule a resposta ao presente com os olhos postos no futuro, para que se invista hoje no estritamente necessário e se prepare com maior agilidade a resposta a necessidades do futuro, tendo presente os constrangimentos do País. Uma política que valorize de baixo para cima no plano das funções/cargos, conteúdos de formação, etc. Uma política que dê na prática corpo à afirmação de que temos uma juventude qualificada e formada.
Investimento sim, mas em quê?
Que as Forças Armadas precisam de investimento é assunto pacífico. Mas importa ver bem que investimento e com que prioridades. Não basta ao Governo propagandear milhões, nem basta exigir mais milhões. A transformação desta matéria na lógica em que tantas outras estão a ser transformadas, do «branco e preto», é um caminho desgraçado.
Há quem esteja apostado nele, já que é o que finge confronto, para depois convergirem nas opções de fundo, como foi sucedendo governo após governo.
Um dos assuntos repescados no tratamento jornalístico foi o relacionado com as infraestruturas militares versus disponibilização para responder às carências de habitação. E, a este propósito, recorda-se a recente venda do Bloco Habitacional da ex-Escola Prática de Cavalaria, em hasta pública, por parte da maioria PSD/PS da Câmara Municipal de Santarém e a abstenção do Chega, num concelho onde estão identificadas 332 famílias a carecerem de resposta. Isto, já para não falar das necessidades de resposta aos estudantes que frequentam o Politécnico.
Teria utilidade que do património existente fosse definido aquele que importa as FA conservarem para necessidades suas, aquele que é importante manter, mesmo fora da esfera do Ministério da Defesa Nacional, como reserva para necessidades inopinadas (Planeamento Civil de Emergência) que possam ocorrer e requeiram uma resposta do Estado e o que pode ser alienado satisfazendo em primeira linha necessidades sociais elencadas, sendo a habitação uma delas.
Dirão alguns que isso está feito. Se assim é, seria útil que fosse conhecido. Também útil seria que o Governo cumprisse com os planeamentos estabelecidos. É preciso pôr fim ao jogo da folha de Excel.