Projectos-piloto de vida independente - da esperança à incerteza

Margarida Lopes

É preciso efectivar o direito das pessoas com deficiência à vida independente

A luta pelos direitos das pessoas com deficiência e suas famílias implica a construção de uma sociedade mais justa, que garanta a inclusão social, o que exige medidas que permitam às pessoas com deficiência viver com dignidade nas suas próprias casas participando na vida das suas comunidades, junto da família e amigos, promovendo a sua autonomia e independência e, desta forma, permitindo que muitas pessoas com deficiência possam aceder ao emprego, questão central para a dignidade do ser humano.

No nosso País, o direito a uma vida digna e independente é negado a milhares de pessoas com deficiência. Faltam apoios, faltam acessibilidades, falta vontade política dos sucessivos governos em aplicar as medidas de fundo necessárias à criação de um meio ambiente consentâneo com a vida independente das pessoas com deficiência.

Em 2017, na sequência da apresentação de uma iniciativa legislativa do PCP, o Governo criou projectos-piloto de um modelo de vida independente, com a duração de três anos, financiados através do Portugal 2020. Esta iniciativa criou, nas pessoas com deficiência, esperanças de que haveria avanços e se daria resposta às necessidades das pessoas com deficiência com possibilidades de ter vida independente. As associações foram ouvidas, e várias apresentaram desde logo ressalvas, mas anuiu-se que era apenas um primeiro passo e a expectativa criada era enorme. No final haveria uma avaliação dos resultados e havia o compromisso de criar uma medida de política nacional de Apoio à Vida Independente. Todos esperavam que estes projectos assumissem um papel permanente e passassem a ser uma realidade na vida de todos os dias das pessoas com deficiência.

Os projectos demoraram três anos a entrar em vigor terminando agora, e podemos dizer que a montanha pariu um rato.

O número de pessoas abarcadas foi mínimo. O número de horas de assistência pessoal também foi limitado.

Ainda assim, para as pessoas que conseguiram ser abrangidas, foi um enorme passo em frente nas suas vidas. E agora, no fim dos projectos, assistentes pessoais e pessoas com deficiência assistidas não sabem qual é o seu futuro.

Apesar das chamadas de atenção das associações para a necessidade de dar garantia a estas pessoas, da nossa própria intervenção na Assembleia da República sublinhando essa necessidade, até agora temos uma imensa indefinição sobre o que vai acontecer.

O que se pretende de um projecto-piloto é que, partindo de uma experiência, se alargue e se torne uma realidade efectiva na vida destas pessoas.

Neste momento não se sabe se a prometida medida de política nacional de Apoio à Vida Independente vai ser uma realidade, não se sabe se quem teve três anos de Vida Independente vai manter esse apoio ou se, com o fim dos projectos-piloto, ficam sem garantias de assistência pessoal. Isto é de uma crueldade sem tamanho para pessoas que já têm de enfrentar tantas dificuldades e agora se vêem em risco de retroceder no que tinham conquistado.

Sem a concretização generalizada do direito à vida independente mantém-se em alto grau a institucionalização das pessoas com deficiência.

É preciso efectivar este direito, traduzindo-o não só na existência de assistentes pessoais mas também em medidas que garantam as acessibilidades físicas e de comunicação, o acesso ao trabalho e à protecção social, à saúde, à educação, à habitação, ao desporto e à participação activa na vida política e social, garantindo que todos tenham acesso a uma vida autónoma, independente e digna, que é um direito inalienável de todos.




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